9 de novembro de 2017

A Pipa

 

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peça de Ruth Salles

Esta peça é baseada no conto homônimo do dr. Udo de Raes, traduzido pela professora Edith Asbeck. A pipa, soltando-se e subindo nos ares, vai passando por várias experiências que simbolizam o desenvolvimento da vontade. O corvo, que é um pássaro que voa muito alto e, na mitologia nórdica, dá notícias de tudo o que acontece, representa o aprendizado no mundo; a semente já é o começo do desabrochar do ser; a nuvem representa a altura atingida; as estrelas, a luz que clareia a alma; e o arcanjo São Miguel representa mesmo a vontade mais alta, que o ser humano enfim alcança.

PERSONAGENS:
Coro, Pipa, Menino,Vento, Corvo, Semente, Nuvem, Estrelas, o Arcanjo São Miguel, o Pai do menino.

CORO (canta, enquanto o menino e o pai trabalham fazendo a pipa):
“Um menino um dia vai,
ajudado pelo pai,
vai fazer a sua pipa,
cruza bem as duas ripas,
põe papel bem colorido
e um rabo bem comprido.
E o menino diz ao pai:
– Olhe a pipa Vai-não-vai!”

PIPA (correndo e saltando):
– Lá vou indo pelo ar,
vou subindo em cabriolas.
Lá no céu já vou chegar,
rabeando a rabiola!

MENINO (para o pai):
– Já dei toda a linha.
A pipa está longe,
tão pequenininha…

VENTO (passa correndo):
– Zzz, vvv, vupt!

PIPA:
– Ai, a linha se partiu!
Foi esse vento zunindo…
E agora, onde vou parar?
Estou indo sem destino,
bem soltinha pelo ar.

CORVO (fazendo uma curvatura):
– Bom-dia, pássaro colorido,
de asas brilhantes e rabo comprido!

PIPA:
– Bom-dia, corvo, não sou pássaro, não.

CORVO:
– Quem é você? E de onde veio então?

PIPA:
– Vim lá de baixo, de um garotinho.
Ele me fez com todo o carinho.

CORVO:
– E para onde você vai agora?

PIPA:
– Não sei.Vou voar pelo céu afora.

CORVO:
– Já vi que você não pertence a este lugar.
Aqui todos sabem onde vão chegar.
Conforme é inverno ou verão, minha sorte
é voar para o sul ou então para o norte.
Você deve voltar para aquele menino.
Pode-se perder quem não sabe o destino.

PIPA:
– Que nada! Adeus, vou voar novamente!
(encontra a semente)
– Bom-dia, semente!

SEMENTE:
– Bom-dia!
Você é uma semente diferente,
com raiz e tudo a voar na amplidão?

PIPA:
– Não! Eu vim do menino
que está lá no chão.

SEMENTE:
– E para onde vai?

PIPA:
– Não sei.Vou ao léu.
Só sei que quero voar pelo céu.

SEMENTE:
– Já vi que você não pertence a este lugar.
Aqui todos sabem onde vão chegar.
Vou com o vento que voa de leste… a oeste.
Com ele, o calor do sol em mim se encerra.
Quando estou bem quente,
desço para a terra.
E a terra, recebendo tanto calor,
logo faz brotar em mim a linda flor.
Se aqui você não sabe o que fazer,
deve voltar à terra. Deve descer.

PIPA:
– Que nada! Eu vou é voar mais ainda!
(encontra a nuvem)
– Boa-tarde, nuvem!

NUVEM:
– Boa-tarde! Que nuvem linda,
com o brilho avermelhado do sol poente!

PIPA:
– Não sou nuvem, não. Fui feita por gente,
pelo menino que está lá no chão.

NUVEM:
– E para onde vai?

PIPA:
– Por aí, na amplidão…

NUVEM:
– Já vi que você não pertence a este lugar.
Aqui todos sabem onde vão chegar.
Eu recolho o vermelho do sol poente
e faço brilhar sua luz novamente
na rubra chama da madrugada.
Faço chover e abençoo a terra,
e o sol vem depois e me carrega
para o alto do céu. É assim que eu vivo.
Mas você, se não tem nenhum objetivo,
deve voltar ao menino. Descer.
Senão você pode se perder.

PIPA:
– Que nada! Que nada! Eu já vou indo…
Vejo lá no alto um brilho mais lindo!
(encontra as estrelas)
– Boa-noite, estrelas!

ESTRELAS:
– Boa-noite, viajante!
Que notícias nos traz lá da terra distante?

PIPA:
– Eu venho do menino, que dorme, a sonhar.
E sonha comigo até eu voltar.

ESTRELAS:
– Então leve a ele nossas bênçãos de luz.

CORO:
– Que luz! Que luz brilha no céu!
Ah, é o arcanjo São Miguel!
(O arcanjo lança a estrela na direção da pipa.)

PIPA:
– Oh, com este fogo, foi para o chão que eu
escorreguei!

MENINO (acordando, esfrega os olhos):
– Que sonho estranho… Até acordei! (vê a pipa)
A minha pipa! Ela voltou…
Mas… seu papel se desmanchou…
E a vareta de madeira mudou para esta,
que parece uma cruz de ferro celeste!

O PAI:
– Não fique triste. Agradeça à sorte,
pois o ferro celeste é leve e forte.
E assim, com ferro em vez de ripa,
nós faremos uma nova pipa.

CORO (canta, enquanto a pipa é feita e sai voando):
“E a pipa subiu e no céu visitou
todos aqueles que um dia encontrou.
E, junto com as estrelas, o arcanjo São Miguel
fez com que ela tornasse a descer lá do céu.
Sua cruz foi ficando mais e mais reluzente.
Por anos subiu, forte e resistente.
E, quando o menino tornou-se um rapaz,
sua cruz transformou-se ainda mais.
Agora, o antigo brinquedo
é uma espada de luz que veio do céu.
E então, com ela na mão,
o jovem saiu pelo mundo sem medo,
como cavaleiro de São Miguel.”
(Todos saem cantando a canção do início.)

 

Fim

 

 

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