27 de março de 2018

De Olinda a Olanda

 

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peça de Ruth Salles

peça baseada em fontes históricas, documentos, e no romance “O Príncipe de Nassau”, de Paulo Setúbal

DE OLINDA A OLANDA

Esta peça foi feita especialmente a pedido do professor Tarcísio Viola, que queria, para seus alunos de 14 anos, uma peça sobre tema brasileiro. Escolhemos então alguns momentos de um episódio da História do Brasil em que o Nordeste se libertou do domínio holandês, episódio chamado em geral “Restauração de Pernambuco”.

Nessa escolha do tema, não houve um espírito de partidarismo a favor de Portugal ou contra Holanda, dois países pequenos que realizaram grandes missões ultra-marinas diversas, logo após se destacarem de blocos maiores – Portugal, do todo que era então a península ibérica apenas espanhola; Holanda, do Sacro Império Romano-Germânico – fato aliás assinalado por Rudolf Steiner no livro “Almas Nacionais e sua Missão”. Não há como negar que a pátria-mãe ou madrinha do Brasil seria mesmo Portugal, com os erros e acertos de todo povo colonizador. E o Brasil, ligado a esse país por uma espécie de cordão umbelical de dependência, respeito e afeto, por mais de uma vez, no século XVII, manteve-se fiel ao rei de Portugal nesses tempos de início do sentimento da terra.
Quanto ao linguajar, baseei-me no livro “O Príncipe de Nassau”, de Paulo Setúbal, adaptando mesmo certos trechos desse romance para compor algumas cenas. No mais, procurei valer-me de fontes históricas, de que constam os termos da capitulação dos holandeses e frases dos jornais holandeses da época.
Tentei aqui ressaltar o valor do incipiente espírito brasileiro, representado por tantos homens de Pernambuco e de todo o Nordeste, como, por exemplo, a figura especial do paraibano André Vidal de Negreiros.
A idéia de um Prólogo surgiu por vários motivos, inclusive como um meio de assinalar o valor das mulheres do Tejucupapo e de apresentar, de certa forma, algumas personagens do episódio. Este prólogo consta de duas cenas. Na segunda delas, faço aparecer a figura de frei Manuel do Salvador (apelidado frei Calado), dizendo alguns versos de seu poema “O Valeroso Lucideno”, feito em homenagem ao português João Fernandes Vieira, que lutou pela Restauração de Pernambuco.
A peça é em prosa, com exceção dessa segunda cena do Prólogo e dos trechos em que aparece o Príncipe Maurício de Nassau.
Quanto ao título – DE OLINDA A OLANDA – trata-se do início de conhecida frase de frei Antônio Rosado, que pregava, do púlpito, queixando-se da falta de ajuda das autoridades diante da ocupação holandesa. A palavra “Holanda” aparecia então sem a letra agá. Pesquisando, soube que ela tem origem no vocábulo dinamarquês “Ollant”, que quer dizer “país pantanoso” ou “país dos bosques”.
Há cinqüenta personagens na peça, mas alguns alunos podem representar mais de um papel, como vem entre parêntesis na relação de personagens.
Quanto à música, selecionei, juntamente com a professora de música Mechthild Vargas (Meca), algumas músicas setecentistas holandesas, a serem apenas tocadas, dando tempo para a mudança de cenário entre cenas, ficando isso à escolha do professor de música que se ocupar da peça. Numa dessas músicas, tomei a liberdade de encaixar a letra de uma canção holandesa bem menos antiga; foi esta, porém, entre as que tive em mãos, a única que serviu ao meu propósito de exaltar o espírito holandês, e é para ser cantada pelos chamados flamengos, que aqui vieram enfrentar clima tão diverso, natureza hostil e um povo, para eles, de espírito ainda primitivo e desconcertante. Uma brasileira canta junto com eles, pois se passara para seu lado, tendo-se casado com um flamengo; ao passo que uma órfã de pais holandeses, nascida no Brasil e criada por uma pernambucana, torna-se noiva de um brasileiro e, em dado trecho da peça, canta uma romântica xácara portuguesa, que é “A Bela Infanta”. Outra xácara que consta da peça é a “Nau Catarineta”, e ambas foram escolhidas por constarem do folclore pernambucano e serem conhecidas já no século dezessete. Para melhor dar um toque da terra, incluí na peça, apenas para ser tocado em troca de cenários, um coco seguido de embolada, embora de época posterior. É o “Benedito Pretinho”. O motivo da inclusão dessa música é que, em sua embolada aparece o clássico exemplo de uma escala de sentido modal que, no Brasil, ocorre apenas no Nordeste. Era comum na música gregoriana e na dos antigos gregos e dos antigos incas. Por escolha do professor de música que se encarregou da peça, os holandeses ainda cantaram uma música de Alceu Valença, “Moinhos de Holanda”, que substituiu a repetição da canção holandesa na cena final.

As cenas se passam em Pernambuco, no século XVII, entre Olinda, Recife (chamado na época de Arrecife), Cidade Maurícia e regiões próximas.

 

PERSONAGENS

Quatro habitantes (três holandeses da taberna, três passantes e dois holandeses
da cena final)
General von Schkoppe
Conselheiro van Dirth
Arcisiewsky (Domingos Fagundes)
Carlos Tourlon
Gaspar Dias
Príncipe Maurício de Nassau
Jan Blaer
Sigmund Starke (um dos emissários)
Dois soldados da Guarda (dois dos emissários)
O oficial holandês (um dos emissários)
A sentinela (um dos emissários)

Frei Manuel do Salvador, vulgo frei Calado
Frei João, vulgo frei Poeira (Antônio Filipe Camarão)
Frei Rafael de Jesus (Henrique Dias)
Frei Inácio

 

Bastião
Rodrigo Mendanha
André Vidal de Negreiros
João Fernandes Vieira
Capitão Dias Cardoso (um dos habitantes)
Antônio Cavalcanti (um dos habitantes)
General Francisco Barreto
Matias de Albuquerque (Amaro Lopes)

Nove mulheres do Tejucupapo
Três habitantes (duas holandesas da parte final)
Ana Paes
Joana de Albuquerque
Carlota Haringue
Luiza de Oliveira, mulher de Amaro Lopes
Dama holandesa (uma habitante?)

 

A peça consta de um Prólogo, três Atos e uma Cena Final.

 

PRÓLOGO

CENA 1

À frente ou abaixo do palco: quatro homens e três mulheres, habitantes do lugar. No centro, na Campina do Taborda: general von Schkoppe, conselheiro van Dirth, cinco emissários (Sigmund Starke, a sentinela, o oficial, os dois soldados da Guarda); general Francisco Barreto, Rodrigo Mendanha, André Vidal de Negreiros e, querendo, outros chefes brasileiros da última cena antes da cena final.

(À frente ou abaixo do palco acorrem pessoas vindas dos dois lados, umas ao encontro das outras, na excitação de quem transmite ou ouve novidades recentes, talvez boatos.)

1º HABITANTE (excitado): – Os fortes! Parece que foram tomados pelos nossos!
2º HABITANTE (com espanto e alegria): – Os fortes?!
3º HABITANTE (com certeza): – Foram tomados por terra pelos nossos e por mar pela frota portuguesa!
4º HABITANTE: – Então os holandeses se rendem!
5º HABITANTE (moça): – É a restauração de Pernambuco, depois de tantos anos!
6º HABITANTE (moça): – Até que enfim! Deus seja louvado para sempre!
7º HABITANTE (moça, apontando para o centro da cena): – Olhem! A capitulação! Lá! Na Campina do Taborda!

(Os habitantes se aquietam num canto, enquanto vêem e ouvem. No centro entraram, por um lado, o general von Schkoppe, o conselheiro van Dirth e os cinco emissários. Pelo outro lado, o general Francisco Barreto, Rodrigo Mendanha André Vidal de Negreiros e talvez outros chefes brasileiros. Cada um dos emissários recebe uma carta do general von Schkoppe ou de van Dirth. O general lê uma em voz alta, antes de fazer a entrega.)

VON SCHKOPPE (solene): – Dos chefes holandeses no Recife, aos chefes holandeses no Ceará, na Paraíba e nas ilhas de Itamaracá e Fernando de Noronha: “Nobre, honrado, bravo! Pela convenção que assinamos e que vai adjunta, podereis saber o quanto nos custa informar-vos que deveis entregar ao Mestre de Campo General todas as fortalezas aí existentes. Terminamos rogando a Deus que vos proteja (1). O general Sigmund von Schkoppe e os membros do Conselho.”

(Os cinco emissários, após receberem as circulares, retiram-se apressados. O general von Schkoppe se volta solenemente para o Mestre de Campo General Francisco Barreto. Os dois se cumprimentam com um aceno de cabeça.)

VON SCHKOPPE: – General Francisco Barreto!

FRANCISCO BARRETO: – General Sigmund von Schkoppe!

RODRIGO MENDANHA (após receber das mãos de Francisco Barreto um documento, lendo-o em voz alta):
“Hoje, 26 de janeiro de 1654, o senhor Mestre de Campo General Francisco Barreto dá por esquecida toda a guerra que se tem cometido por parte dos vassalos dos senhores Estados Gerais das Províncias Unidas e da Companhia Ocidental, concedendo aos sobreditos vassalos tudo o que for de bens móveis que atualmente estiverem possuindo, e concedendo-lhes a demora de três meses para ultimarem seus negócios” (2).

(von Schkoppe recebe o documento, e ele e Francisco Barreto dão um aperto de mãos e saem amigavelmente, um ao lado do outro, seguidos pelos demais. As exclamações dos habitantes se fazem ouvir. As moças se abraçam, os homens atiram para o ar seus chapéus ou gorros.)

1º HABITANTE: – Os holandeses capitularam!
2º HABITANTE: – Viva a restauração de Pernambuco!
3º, 4º e 5º HABITANTES: – Viva! Viva! Viva!
6º e 7º HABITANTES: – Deus seja louvado! Deus seja louvado!

(Ao começarem as exclamações dos habitantes, começa também a se ouvir a introdução à xácara “Nau Catarineta”. Os habitantes invadem o centro da cena, dançando felizes e cantando as primeiras estrofes da xácara.)

HABITANTES (cantam):
“Ouvi agora, senhores, coisas de muito pasmar (bis):
É a Nau Catarineta, ó tolina, dela vos venho contar (bis).
Há sete anos e um dia, iam na volta do mar (bis),
botando solas de molho, ó tolina, para de noite jantar (bis).”

(Os habitantes vão-se dispersando e saem. O palco escurece.)

 

CENA 2
Mesmo cenário. Frei Manuel do Salvador, as nove mulheres do Tejucupapo; frei João, frei Rafael de Jesus; Matias de Albuquerque.

(O palco está escuro. Na frente, num canto iluminado, aparece frei Manuel do Salvador, que começa a dizer seus versos. À medida que fala, o palco se ilumina, enquanto entram aos poucos, de três em três, revezando-se, as nove mulheres do Tejucupapo. Três representam as três raças; outras três, as mulheres lutadoras, armadas de chuços, foices, varapaus, enxadas; as três últimas, com suas rendas, agem como se fossem as três nornas, antigas tecelãs do destino. Movimentam-se sempre e vêm vestidas muito pobremente.)

FREI MANUEL (olha solene para o público; as 3 primeiras mulheres entram):
– Cessem sereias das cerúleas ondas,
as ninfas do dourado Tejo ameno,
a fama do tebano Epaminondas –
enquanto, do animoso Lucideno,
galhardia, valor e empresas canto,
reparo do Brasil, do inferno espanto. (3)

(As três primeiras mulheres observam-no e comentam umas com as outras.)

1ª JACY: – Isabel, Bastiana… Ouçam! Quem fala com tanto fervor?
1ª ISABEL: – É frei Manuel do Salvador, Jacy.
1ª JACY: – E quem é esse Lucideno, a quem faz seu louvor?
1ª ISABEL: – É o filho da Ilha da Madeira…
1ª BASTIANA: – O português João Fernandes Vieira.

FREI MANUEL (continua, sem reparar nas mulheres):
– A Pernambuco chega humilde e pobre…
mas lutou, ficou rico, além de nobre…

1ª JACY: – Uns dizem que era filho de fidalgos.
1ª ISABEL: – Outros afirmam que era mulato e filho de deportados.
1ª BASTIANA: – Ora, o que importa foi o muito valor desse João Fernandes Vieira.

FREI MANUEL (continua, ainda sem reparar nas mulheres):
– Vendo em Olinda o povo atribulado
pelo belga, tirano capital,
tratou de o livrar de morte horrenda
com sua vida e ser, sangue e fazenda. (as três mulheres o cercam)

1ª JACY:
– Vosmecê é frei Manuel do Salvador
que a si mesmo frei Calado se nomeou?

FREI MANUEL (aborrecido por ser interrompido):
– Façamos pausa aqui, musa querida…

1ª ISABEL:
– Fale, frei Calado! Olhe para nós
e diga: Quantos foram os heróis?

1ª BASTIANA:
– Quem mais, além do jovem português,
vendo em Olinda o povo atribulado
pelo holandês, tirano capital,
tratou de o livrar de morte horrenda
com sua vida e ser, sangue e fazenda?

FREI MANUEL (reparando nelas):
– Quem são vossas mercês vestidas só de trapo?

AS TRÊS (e mais outras três que acabam de entrar):
– Nós somos as mulheres do Tejucupapo!

(As três primeiras vão saindo. As outras três trazem as ferramentas.)

2ª JACY:
– Apenas um pequeno povoado
de casinhas humildes, frei Calado.
Os nossos homens tinham ido longe
vender nossas mandiocas e batatas.
Soubemos que o holandês desembarcara
em Olinda, porém jamais pensamos
que ele viesse até Tejucupapo.

2ª ISABEL:
– Mas ele veio, e eram muitos deles;
e, vendo só crianças e mulheres,
os soldados fizeram ameaças
e pilharam, queimaram nossas casas!

2ª BASTIANA:
– Fugimos para o mato. Foi verdade…
Porém voltamos logo, indignadas,
prontas para morrer por nosso chão!

AS TRÊS (erguendo as ferramentas):
– E armadas só mesmo como estávamos,
com chuços, foices, varapaus, enxadas
– crianças ajudando com pedradas – (como que avançam)
aos gritos, como aludes desabamos
sobre esses altos louros tão estranhos!

2ª ISABEL:
– E nisto seu espanto foi tamanho,
que nem desembainharam as espadas.

AS TRÊS (com voz forte):
– Estas mulheres do Tejucupapo
fizeram-nos bater em retirada!

FREI MANUEL:
– Sua coragem foi imensa…
Que Deus lhes dê a recompensa! (entram frei João e frei Rafael de Jesus)

2ª BASTIANA:
– E agora, frei Calado, olhe para nós
e diga: quantos foram os heróis?

FREI MANUEL:
– Ah, na restauração de Pernambuco,
houve muitos e mais homens ilustres.

FREI JOÃO (com entusiasmo):
– E gente humilde também houve muita!

2ª JACY:
– Mas quem é vosmecê que a nós se ajunta?

FREI JOÃO:
– Sou frei João. Cuidava dos feridos
e prestava assistência espiritual
aos guerreiros. No meio do combate,
eu sempre os animava com este lema:
“Meus filhos, tenham Deus no coração,
e tudo o mais irá numa poeira!”

2ª BASTIANA:
– Ah… Então vosmecê é o tão querido
frei Poeira?

FREI JOÃO: – Ganhei esse apelido
de tanto repetir o mesmo lema.

2ª JACY (a frei Rafael de Jesus):
– E quem é vosmecê, de rosto sério,
que a nós vem-se achegando?

FREI RAFAEL: – Eu sou o frei
Rafael de Jesus. Também louvei
os que lutaram para libertar
a terra que os flamengos nos tomaram…
João Fernandes Vieira, o português,
foi um grande! Porém terrível susto
foi o índio Filipe Camarão!

(O segundo grupo de mulheres é substituído pelo terceiro, tão sutilmente, que os homens nem percebem; são mulheres com rendas na mão, onde tecem e olham.)

FREI JOÃO:
– Esse Antônio Filipe Camarão
era capitão-mor e comandante
dos índios todos. Que sangrentas lutas!
E Clara Camarão, sua mulher,
acompanhava-o corajosamente!

FREI RAFAEL:
– Terrível foi o negro Henrique Dias,
governador dos pretos e crioulos
e mulatos do Estado do Brasil.
Perdeu a mão numa batalha e disse: (o frade ergue uma das mãos)
“A mim me basta apenas esta outra
para servir a Deus e ao meu Rei!”

3ª ISABEL:
– O bravo português Fernandes Vieira…
3ª JACY:
– O cacique dos índios, Camarão…
3ª BASTIANA:
– O corajoso negro Henrique Dias…
AS TRÊS:
– Quem os uniu assim tão diferentes,
o escravo e o senhor, o branco e o bugre?

3ª ISABEL:
– Quem, modesto e apagado foi aquele,
que os conclamou, uniu, apaziguou,
formando a grande força vencedora?

FREI MANUEL (distraído, sem reparar que as mulheres são outras):
– Teria sido aquele André Vidal
de Negreiros?

FREI RAFAEL: – Seria o paraibano
André Vidal, nascido num engenho,
que foi sargento-mor, mestre-de-campo?

AS TRÊS (com ênfase):
– A alma da luta, o coração da trama!

FREI JOÃO:
– Ia de vila em vila, encorajando,
de engenho a engenho agremiando a todos.

3ª JACY:
– André Vidal esteve, pois, no início.

FREI JOÃO:
– Era amigo de todos. Era a mola
dos planos combinados em segredo.

3ª ISABEL:
– André Vidal lutou, então, no meio.

FREI JOÃO:
– Qual traço de união, criou em todos
os corações um sentimento novo:
o sentimento de uma terra una!

3ª BASTIANA:
– André Vidal nos trouxe o fim de tudo.

FREI RAFAEL:
– O fim de tudo? Mas que fim foi esse
a não ser a expulsão dos holandeses?

3ª BASTIANA:
– O fim de tudo? Nesse grande esforço
de fazer ir-se embora o estrangeiro, (com ênfase)
firma seus pés na terra o brasileiro!

FREI MANUEL (confuso de ver que as mulheres são outras e trazem trabalhos de
renda em vez de ferramentas):
– Vossas mercês chegaram com elas?

3ª JACY:
– Sim, mas tecemos rendas, agora.

FREI MANUEL:
– Com rudes mãos, rendas tão belas…

3ª ISABEL:
– Elas consolam nosso pranto.

3ª BASTIANA:
– Não sei que mulheres houve outrora
que nos fizeram tecer tanto.

3ª JACY:
– Eu sou Jacy.

3ª ISABEL: – Eu, Isabel.

3ª BASTIANA:
– Eu, Bastiana. E me parece
que cada uma, quando tece,
vê o destino em sua trama.

3ª JACY (olha na renda, como as outras duas):
– E agora vamos ver, na renda,
que outros heróis em vida e lenda.

(Matias de Albuquerque entra cabisbaixo e como que cansado. Traz uma carta na mão. Frei Rafael vai buscá-lo e recebe dele a carta.)

3ª ISABEL:
– Quem é esse vulto triste que aparece?

3ª BASTIANA (olhando na renda):
– Quanto mais passa o tempo, mais esse vulto cresce.

FREI MANUEL:
– Matias de Albuquerque!
Foi, no início da luta, o herói notável!

3ª JACY (lendo na renda):
– O injustiçado, o esquecido.
Do tempo em que Portugal, sem rei,
submeteu-se à Espanha e à sua lei.

FREI RAFAEL (lendo a carta):
– “Majestade! Enquanto a vida me durar cuidarei de tudo; embora com quase a metade dos soldados doente, e todos descalços e em farrapos, e eu sem poder pagar-lhes socorro nem dar-lhes de comer”. (4)

MATIAS DE ALBUQUERQUE (com tristeza):
– Em Porto Calvo fomos derrotados.
Um dos nossos passou para o outro lado
e revelou cada um dos nossos passos…
Eu então fui chamado a Portugal,
fui processado e preso.

3ª BASTIANA (indignada): – Mas, por que?

MATIAS DE ALBUQUERQUE:
– Responsabilizaram-me por tudo.
Só quando Portugal se libertou
da Espanha é que eu também fui libertado…

(Os três frades saem, conduzindo Matias de Albuquerque para fora.)

3ª JACY:
– Bravo Matias de Albuquerque, logo
virão os desagravos e a vitória.

3ª ISABEL (movimento com a renda):
– Mais este novo fio bem tecido,
e tudo o mais terá acontecido.

3ª BASTIANA (virando a renda):
– De um lado mostra a lenda, do outro, a história.

3ª JACY:
– Afastemo-nos agora.
É a hora. Aproxima-se o Passado.

3ª ISABEL:
– Ele se fará Presente.

3ª BASTIANA:
E apontará o Futuro em sua semente.

(As três saem. Ouvem-se as notas do coco “Benedito Pretinho”, que vão ligar o Prólogo ao Primeiro Ato.)

 

PRIMEIRO  ATO
CENA  1
Casa de dona Joana de Albuquerque: dona Joana, Carlota Haringue, Jan Blaer, Bastião.
(Dona Joana está sentada numa cadeira de balanço, bordando. Carlota entra correndo e se põe a dançar à sua volta.)
CARLOTA: – Mãe Joana! La-la-ri-lá!
JOANA: – Vosmecê está muito alegre, minha filha!
CARLOTA: – Alegre? Estou feliz! Feliz! Rodrigo me pediu em casamento!
JOANA (com espanto): – Pediu vosmecê em casamento a André Vidal?
CARLOTA: – Pediu, sim!
JOANA: – E que disse André Vidal ao seu afilhado?
CARLOTA: – Que consentia.
JOANA: – Que bom, minha filha! Rodrigo é rapaz animoso, leal como ninguém.
CARLOTA: – Ah, isso ele é, mesmo! Acho que as bodas podem ser lá para São João.
JOANA (pega-a pelas mãos e contempla-a): – Minha holandesinha brasileira… Gosto tanto de ver vosmecê feliz!
(Alvoroço na porta. Bastião entra agitado.)
BASTIÃO (a dona Joana): – Sinhá dona! Sinhá dona!
JOANA (levanta-se da cadeira): – Que foi, Bastião?
BASTIÃO: – Lá no pátio está desmontando um homem que chegou aqui a cavalo com um mundão de soldadesca. Tudo “framengo”!
JAN BLAER (entra falando rudemente): – Dona Joana de Albuquerque?
JOANA (espantada): – Capitão Jan Blaer? Que o traz aqui?
JAN BLAER (passa-lhe um documento): – Leia!
JOANA (depois de ler): – Mas… não compreendo. É uma ordem dos escabinos da cidade Maurícia, determinando a entrega imediata de Carlota Haringue! A que vem, senhor, esta barbaridade?
JAN BLAER: – Esta moça é filha de holandeses.
JOANA: – Órfã, vosmecê quer dizer. Órfã de pai antes de nascer e de mãe ao nascer. Foi André Vidal quem a tomou a seus cuidados; mas devido à sua vida sem pouso certo, trouxe-me a criança para que eu a criasse e educasse.
JAN BLAER: – Mas é filha de holandeses, senhora dona. E, como tal, não é natural nem justo que viva entre brasileiros, dando despesa a gente estranha.
JOANA: – Estranha? Senhor, que absurdo está dizendo! Carlota nasceu no Brasil e, ademais, é moça comprometida. Está de casamento apalavrado com Rodrigo Mendanha, afilhado de André Vidal.
JAN BLAER: – Engano dela. Seu noivo já lhe foi destinado pelos escabinos. É nosso alferes Sigmund Starke. Venha, Carlota! (pega-a por uma das mãos)
CARLOTA (estende a outra mão a dona Joana): – Ai, mãe Joana, que farei sem vosmecê? E Rodrigo?…
JOANA (acalma-a): – Vá, minha filha. Tenha fé. André Vidal, quando chegar, dará jeito, vosmecê verá.
(Jan Blaer leva Carlota embora. Bastião sai atrás, atento.)
JOANA (cai sentada na cadeira de balanço): – Tem de dar jeito, ó céus!
(O palco escurece para a mudança de cenário. O coco “Benedito Pretinho” pode ser tocado nesse momento, ligando as cenas.)
CENA  2
Rua à frente da cena. Carlos Tourlon e Bastião. No centro, o pórtico do palácio de Friburgo. De um lado, a porta da taberna de onde sairão os beberrões na cena 4, do outro lado, a casa do capitão Jan Blaer.
(Carlos Tourlon vem passando apressado em direção ao pórtico do palácio. Bastião, que estava escondido, pula à sua frente e tira o gorro respeitosamente.)
BASTIÃO: – O sinhô me cunhece?
TOURLON (assusta-se, depois ri): – Conheço. É o Bastião. Foi escravo de dona Joana de Albuquerque e, nas horas vagas, volta sempre lá.
BASTIÃO: – É uma sinhá dona muito boa. Nego respeita.
TOURLON: – E agora é o carcereiro da Fortaleza Ernesto.
BASTIÃO: – Sim, sinhô. Mas nos entremeios fui nego de dona Ana Paes. Saí de lá quando vancê casô cum ela. Saí pru causa de vancê, sinhô Carlos Tulon.
TOURLON: – Por minha causa? Que coisa está aí a disparatar, Bastião?
BASTIÃO: – Eu conto, sinhô. Escuite. Dona Ana Paes me vendeu, de medo que eu contasse pra vancê tudo o que sei.
TOURLON (intrigado): – Tudo o que sabe? E que diabo é isso?
BASTIÃO: – Dona Ana casô cum vancê pru mode fazê réiva ao sinhô André Vidal.
TOURLON (sem entender): – Fazer raiva a André Vidal?!
BASTIÃO (importante): – Pois se ele acabô o noivado cum ela porque eu discubri que ela tava de namoro cum o Príncipe de Nassau…
TOURLON (zangado): – Que está me dizendo, seu intrigante?
BASTIÃO (defendendo-se): – Num sô, não sinhô. Eu só assunto daqui dali. E agora (aflito) o capitão Blar levou dona Carlota, à força, pra se casá cum o féres Sigimundo. E eu já assuntei que foram órdes de dona Ana pra botá o sinhô André Vidal doidinho di um tudo.
TOURLON (acabrunhado, dá uma moeda a Bastião): – Pegue lá e vá andando.
BASTIÃO (suplica): – Mas vancê veja se pode ajudá a pobre de dona Carlotinha!
TOURLON: – Vou ver, Bastião, vou ver. Mas, tome tento: se alguém no Arrecife souber destas coisas, o Bastião vai parar na forca.
BASTIÃO: – Fique assussegado, sinhô! Fique assussegado!  (sai)
TOURLON (profundamente chocado, depois vai saindo): – Ana Paes, minha mulher… Quanta torpeza, meu Deus, quanta torpeza! Pobre Carlota!
CENA  3
Mesmo cenário. O general von Schkoppe e o militar polonês Arcisiewsky.
(von Schkoppe e Arcisiewsky passeiam pela rua, conversando.)
VON SCHKOPPE: – Então, Arcisiewsky! Desde que o Príncipe Maurício de Nassau chegou, quantos melhoramentos! Eckout e Franz Post são ótimos pintores. E Marcgraf é astrônomo, naturalista e botânico.
ARCISIEWSKY (sem entusiasmo): – Sim, von Schkoppe. Ele está rodeado de artistas, de cientistas.
VON SCHKOPPE: – E além de erguer o belíssimo Palácio de Friburgo, sem falar na cidade Maurícia, pretende que seu arquiteto Pieter Post termine a ponte que liga a cidade Maurícia ao continente para não ter de ir de barcaça para o Arrecife.
ARCISIEWSKY: – Pois tenho para mim que ele administra mal. Manda pouco dinheiro para Holanda.
VON SCHKOPPE: – Ele tem de agradar os naturais. Não vê como é tolerante em se tratando de religião?
ARCISIEWSKY: – Hum… Garanto que a Companhia das Índias não gosta nada disso.
VON SCHKOPPE: – E a Câmara dos escabinos? Já viu algo assim por estas bandas? O povo tendo delegados para resolver suas questões?
ARCISIEWSKY: – Ora, von Schkoppe, são 4 escabinos holandeses para 4 da terra, e mais um, o presidente, ou escolteto, que pela lei deve ser holandês. Os da terra nem comparecem, porque não adianta.
VON SCHKOPPE: – Mas é sempre um começo.
ARCISIEWSKY: – Um começo… Só tem ganho de causa com os escabinos quem paga, e bastante, ao Gaspar Dias, esse refinado patife, esse raposão.
VON SCHKOPPE: – Maurício é um grande homem, Arcisiewsky, um verdadeiro Alexandre! Amigo das artes e das ciências… E além disso sabe ser justo.
ARCISIEWSKY: – Mas esse Gaspar Dias o põe a perder com sua desmedida ambição.
VON SCHKOPPE: – Se o amigo fala de Gaspar Dias, por que não fala de Carlos Tourlon, o capitão da Guarda?
ARCISIEWSKY (preocupado): – Que tem ele?
VON SCHKOPPE: – É bem chegado à causa brasileira. No entanto, sua mulher, a terrível e bela pernambucana dona Ana Paes, passou-se para a nossa causa com entusiasmo.
ARCISIEWSKY (mais calmo, desvia o assunto): – Conta-se que dona Ana Paes casou com nosso Tourlon só porque André Vidal rompeu seu noivado com ela.
VON SCHKOPPE: – Ora, isso são intrigas da corte, Arcisiewsky.
ARCISIEWSKY (exagera na intriga e fala demais): – E dizem que Vidal rompeu o noivado porque descobriu que dona Ana estava de amores com o Príncipe.
VON SCHKOPPE: – Então Carlos Tourlon deve ter sabido disso, e é por vingança que anda agora traindo Nassau. Ele e outros.
ARCISIEWSKY (assustado): – Como disse?
VON SCHKOPPE: – Sabe-se que há alguém escrevendo secretamente para Holanda, mandando acusações venenosas contra a administração do Príncipe.
ARCISIEWSKY (disfarçando): – Notícia tremenda, General!          (eles saem)
CENA  4
Pórtico do palácio e rua em frente à cena. A sentinela, os dois soldados da Guarda; o Príncipe de Nassau, o Capitão da Guarda Carlos Tourlon; um casal de habitantes (portugueses); três holandeses.
(Na casa de Jan Blaer estão: Jan Blaer, Carlota Haringue; dama holandesa; Gaspar Dias, o Conselheiro van Dirth, dona Ana Paes, Sigmund Starke. A cena tem início apenas no pórtico do palácio e na rua.)
SENTINELA: – Às armas! O Príncipe Maurício de Nassau vai sair a passeio acompanhado do Capitão da Guarda!
(Os soldados da Guarda batem com as alabardas no chão. Ouve-se toques de clarim e tambor. O Príncipe surge do pórtico acompanhado de Tourlon.)
NASSAU (caminha com Tourlon e olha a paisagem):
– Que maravilha o sol poente ao longe!
Os largos vermelhões de luz flamante
se espalhando no ardente céu dos trópicos!
De um lado, o oceano espumarento,
do outro, a imensa terra brasileira
onde ondeiam os morros verdejantes…
Senhor Carlos Tourlon, como isto é belo!
É a mais formosa terra que há no mundo!
TOURLON (malicioso):
– Vossa Alteza transborda de alegria
só pela terra ou por aquela nau,
que já entrou na barra embandeirada
com notícia importante da Bahia?
NASSAU:
– A grande novidade, a estas horas,
já correu de Olinda ao Arrecife:
Portugal se livrou enfim da Espanha.
Dom João de Bragança conseguiu
ser aclamado rei.
TOURLON:      – Alta notícia,
e uma reviravolta na política.
NASSAU:
– Sim, é a paz entre Holanda e Portugal,
com trégua de dez anos assinada.
TOURLON (malicioso):
– Um tratado de paz… E a Companhia
das Índias já não vê alguma brecha
nessa trégua, para poder rompê-la?
NASSAU (acalmando-o):
– Por ora, nada disso se cogita.
CASAL DE HABITANTES (passa exclamando):
– Temos rei! Temos rei! Real! Real!
Por Dom João IV, rei de Portugal!
TRÊS HOLANDESES (brindam alto à porta da taberna do Snider):
– Viva! Viva Maurício de Nassau!
NASSAU:
– Esses parecem bem embriagados.
TOURLON:
– Tontos de vinho. Estão comemorando.
NASSAU:
– Comemorando o quê?
TOURLON:                – Os escabinos
deram ganho de causa ao velho Snider
contra Manuel Filipe, o lavrador,
por causa de um cavalo gateado
de Snider, que fugiu e entrou nas terras
do Manuel Filipe.
NASSAU:       – Estou sabendo.
TOURLON:
– O pobre lavrador foi condenado
a pagar pelo preço do cavalo
e mais as custas, com pesadas multas.
NASSAU:
– Feia coisa. Que decisão injusta!
Fizeram muito mal os escabinos.
(Entram os convidados em casa de Jan Blaer. Este, com um caneco na mão, começa a entoar uma canção holandesa que os outros acompanham, menos Carlota, sentada triste a um canto.)
JAN BLAER (e os outros):
“Alle man van Neêrlands stam              Eigen meester niemands knecht,
Voelen zich der Vad’ren zonen.            Recht en slecht, (bis)
Willen veij op t’plekje wonen                 Stalen vuist en rappe hand, (bis)
Dat hun tot een erfdeel kwan.               Zoo is t’volk van Nederland (bis).”
NASSAU (parando):
– Que é aquilo, Tourlon? Também há festa
em casa de Jan Blaer?
TOURLON:             – Festa grande,
pois brindam o ajuste de noivado
de Sigmund Starke com Carlota Haringue.
NASSAU:
– Mas Carlota não ia se casar
com o afilhado de André Vidal?
TOURLON:
– Rodrigo? Que procure uma outra noiva!
Esta escapou-lhe…
NASSAU:        – Vosmecê deseja
comparecer à festa de Jan Blaer?
TOURLON:
– Se Vossa Alteza permitir…
NASSAU:                    – Pois vá.
Não careço de vosmecê agora.
(Tourlon se dirige à casa de Jan Blaer.)
NASSAU (consigo mesmo):
– Portugal já tem rei. Mas a notícia
que mais me orgulha é a que foi mandada,
secretamente, pelo vice-rei
do Brasil, o Marquês de Montalvão…  (ele sai de cena, entrando pelo pórtico)
CENA  5
Casa de Jan Blaer. Jan Blaer, uma dama holandesa e Carlota Haringue; dona Ana Paes, o Conselheiro van Dirth, Gaspar Dias, Sigmund Starke; Carlos Tourlon; mais tarde, o oficial holandês.
(Carlota e Sigmund estão sentados num banco a um canto. Os outros, ou de pé  ou sentados à volta de uma mesa. Carlos Tourlon vai entrando.)
JAN BLAER (vendo Tourlon entrar): – Viva, senhor Capitão da Guarda! Vá entrando para o regabofe! E não se assuste com o vozerio. O vinho soltou a língua dos comensais.
GASPAR DIAS: – Ora, pois, senhor Conselheiro van Dirth, então o Duque de Bragança foi aclamado rei de Portugal?
VAN DIRTH (obsequioso): – Sim, sim! Sob o nome de Dom João IV.
GASPAR DIAS: – Grande nova essa!
JAN BLAER: – Pena é, Gaspar Dias, que se façam tréguas. Eu queria ter o gosto de enforcar entre os coqueiros de Maurícia o último soldado português.
GASPAR DIAS: – Chega de bravatas, Jan Blaer. Pare com isso. Lembre-se de que muitos flamengos já acabaram às mãos de portugueses. Ademais, meu bravo Capitão, escute o que eu digo: a guerra ainda não acabou, e está longe de acabar.
ANA PAES: – Vosmecê está gracejando, Gaspar Dias? De hoje em diante, a guerra é só entre Holanda e Espanha. Nada mais de confusões cá pelo Brasil.
GASPAR DIAS: – Vosmecê há de ver, dona Ana Paes. A aclamação de dom João IV vai tornar a atiçar a luta. Por acaso, a senhora não sabe que há muita gente a tramar secretamente, com mão de gato, contra nosso Príncipe? (revira o caneco) Eu sei de alguém muito principal neste Arrecife que é homem perigoso. Alisa pela frente e apunhala pelas costas.
JAN BLAER: – Ah, esse eu conheço como a palma de minha mão. É João Fernandes Vieira.
DAMA HOLANDESA: – Tem razão, Jan Blaer, é João Fernandes.
TOURLON: – Vosmecês são peçonhentos, meus senhores. Por que hão de jogar lama num homem de tanto quilate como João Fernandes Vieira?
ANA PAES: – Meu marido está sempre defendendo João Fernandes, como se ele não fosse o maior patife de Pernambuco.
VAN DIRTH: (obsequioso) – Acalme-se, dona Ana. Não vale a pena esse palavrório.
TOURLON: – João Fernandes é homem de valor. E vosmecês aí a enxovalhá-lo. É coragem!
GASPAR DIAS: – Vosmecê é que é homem de boa fé, Carlos Tourlon. Esse João Fernandes era garoto de açougue, um João Toucinho!
DAMA HOLANDESA: – E agora é senhor de engenho. Como subiu…
TOURLON: – É porque lutou e soube trabalhar!
(Carlos Tourlon se dirige para o canto onde estão sentados os noivos; ela, triste, ele, empertigado.)
TOURLON: – Alegria, moços, alegria! Vim beber um trago à sua saúde! Sigmund, vá buscar-me um caneco de vinho da Holanda! (Sigmund obedece. Tourlon fala em segredo a Carlota.) – Conte comigo, Carlota. Eu sei de tudo. Sei quem foi a tecedeira de tanta brutalidade.
CARLOTA (ansiosa): – Sabe quem foi? Vosmecê sabe quem foi?
TOURLON: – Foi dona Ana Paes, minha mulher. (Sigmund volta com o caneco de vinho.) – Viva! À felicidade de ambos! (Volta para o centro da sala.)
ANA PAES: – Nunca vi nosso Príncipe tão feliz como hoje!
GASPAR DIAS: – Principalmente depois de conversar em segredo com o enviado de Montalvão.
ANA PAES: – Em segredo? Eu não soube…
GASPAR DIAS: – Pois para mim é nesse segredo que está a alegria do príncipe.
(Passa pela rua às pressas, vindo do palácio, um oficial holandês, que bate à porta de Jan Blaer, ou bate com a alabarda no chão. Jan Blaer atende.) (5)
OFICIAL: – O Príncipe Maurício de Nassau convoca à sua presença o Capitão da Guarda Carlos Tourlon.
(Tourlon se apressa até a porta, e todos se reúnem ali, curiosos.)
TOURLON: – O Príncipe me chama? Algo de grave?
OFICIAL: – Gravíssimo. Arcisiewsky foi demitido e parte amanhã para Holanda como traidor.
JAN BLAER: – Traidor, Arcisiewsky, o oficial valentíssimo?
VAN DIRTH: – Arcisiewsky, o polonês vencedor da batalha de Mata Redonda?
OFICIAL: – Ele mesmo. Foi descoberta uma carta dele para Holanda, contendo venenosas acusações contra o Príncipe.
TOURLON (alarmado): – Então sua correspondência foi violada?
OFICIAL: – Razões de Estado. E Hoogstraten, amigo íntimo de Arcisiewsky, também está sob suspeita.
(Tourlon, alarmadíssimo, sem se despedir de ninguém, apressa-se em direção ao palácio, seguido do oficial. Ouve-se um toque de clarim.)
GASPAR DIAS: – É a Fortaleza Ernesto dando o toque de recolher. Vamos, senhores.
VAN DIRTH (obsequioso): – Dona Ana, eu a acompanho.
TODOS: – Adeus! Adeus!
(Blaer e Carlota vão para os fundos. Os outros saem.)
SEGUNDO  ATO
CENA  1
Cabana escondida no mato. Frei Manuel do Salvador e João Fernandes Vieira; depois, André Vidal de Negreiros e frei Inácio; por fim, Rodrigo Mendanha.
(Frei Manuel e João Fernandes conversam à luz de um candeeiro.)
FREI MANUEL (exaltado): – É demais, João Fernandes! Uma trégua de dez anos, assinada por holandeses e portugueses, rompida logo de começo!
JOÃO FERNANDES: – Vosmecê tem razão, frei Manuel. É demais! Só porque o tratado de paz não estava ainda oficialmente publicado, Nassau invadiu Sergipe de novo e se apossou de São Luiz do Maranhão. Mas isso foi pressão da Companhia das Índias. Que pena para Nassau, que é homem de tanta grandeza…
FREI MANUEL: – De tanta grandeza, mas também de alguma fraqueza. Pois anda ouvindo demais o Gaspar Dias, esse português abandalhado, e não sabe dizer um “não” à perigosa Ana Paes, que armou aquela trama contra Carlota Haringue.
JOÃO FERNANDES: – Ah, isso foi o que mais sangrou meu coração, frei Manuel. Mandei Rodrigo à Bahia com cartas para André Vidal. Quando voltar, o rapaz vai endoidecer com a notícia.
FREI MANUEL: – Mas vosmecê, com tudo isso, quando se decide? Por que não executa o que combinou com André Vidal? Vosmecê já não é suspeito em Maurícia? Já não anda escondido no mato, como um bicho?
(João Fernandes anda de cá para lá, sem se decidir a dizer o que sabe.)
FREI MANUEL (insistindo): – Que é que espera para atear fogo ao estopim? Agora Portugal é português. Temos rei, João Fernandes!
JOÃO FERNANDES: – Agora temos rei, é certo, mas por isso mesmo morreu a esperança de salvar Pernambuco.
FREI MANUEL (sem entender): – Morreu a esperança?
JOÃO FERNANDES: – Vosmecê não desconfiou das conferências secretas do Príncipe com emissários mandados da Bahia por Montalvão? Pois eu esclareço. Escute e pasme. (segura frei Manuel pelos ombros) Dom João IV ofereceu a Nassau a coroa do Brasil Holandês!
FREI MANUEL (ainda sem entender): – Que está dizendo, João Fernandes?
JOÃO FERNANDES: – Que o Príncipe será o Imperador destas províncias!
FREI MANUEL (estarrecido): – Isso é coisa de aterrorizar um homem! E como é que vosmecê pôde saber de novidades tão brutais?
JOÃO FERNANDES: – Quanta vez não confessei que troco cartas em segredo com a Bahia? Ademais, vosmecê bem sabe que temos um amigo no palácio.
FREI MANUEL: – Carlos Tourlon?
JOÃO FERNANDES: – Carlos Tourlon. (pausa) Depois destas revelações tremendas, não serei eu, frei Manuel, quem vá pegar em armas contra os holandeses… e contra meu próprio rei.
FREI MANUEL: – Vosmecê só vê um lado da questão. E a religião? Antes o Príncipe era tolerante. Agora, pressionado pela Companhia, fecha nossas igrejas! (insistente) Temos de ser livres, João Fernandes! Na terra e na religião! É o que também pensa seu amigo André Vidal, esse valente filho da Paraíba.
JOÃO FERNANDES: – Ele é a alma da rebelião, meu padre, mas é ainda muito moço, muito sonhador. Nós precisamos ser práticos. Nada de temeridades inúteis.
FREI MANUEL (desanimado, anda de cá para lá): – Que se há de fazer então?
JOÃO FERNANDES: – Se tivéssemos certeza de que el-rei protege nossa rebelião… Fora disso, não contem comigo.
FREI MANUEL (em desespero): – Oh… Razão tinha frei Antônio Rosado, quando gritava do púlpito aquelas palavras proféticas: “De Olinda a Olanda não há mais que a mudança de um “i” em “a”, e esta vila de Olinda há de se mudar um dia em Olanda!” Tinha razão o velho frade. Está tudo perdido!
(Ouve-se um pio de pássaro. Mais um. Outro mais perto.)
JOÃO FERNANDES (atento): – É gente nossa! (admirado, vendo entrar André Vidal): – Vosmecê, André Vidal?
FREI MANUEL (muito admirado, vendo entrar frei Inácio): – Vosmecê, frei Inácio?
ANDRÉ VIDAL: – Viemos da Bahia por mar, a todo o pano.
FREI INÁCIO: – E aportamos às ocultas, João Fernandes, só para lhe trazer uma palavra.
ANDRÉ VIDAL: – Vosmecês já devem saber das graves notícias que eu também sei. De modo que soou enfim a hora, João Fernandes. Está tudo preparado. É darmos um grito, e Pernambuco inteiro se levantará como um só homem. Falta apenas que vosmecê, meu amigo, encabece a revolta.
JOÃO FERNANDES: – Não nos precipitemos, André Vidal. E, já que sabe de tudo, que dirá dom João IV destes vassalos que querem ser mais realistas que o rei?
ANDRÉ VIDAL (sorrindo): – Vosmecê é homem prudente, João Fernandes. Mas não lhe respondo eu, que venho apenas da Bahia, mas sim nosso frei Inácio, que acaba de chegar do reino.
JOÃO FERNANDES: – Do reino, frei Inácio? De Portugal? Vosmecê?
FREI INÁCIO: – Eu mesmo. E vim especialmente para lhe entregar esta carta que lhe envia el-rei dom João IV. (Frei Inácio tira da sotaina um pergaminho timbrado e o entrega a João Fernandes) Por razões de Estado, o rei foi obrigado a se mostrar amigo de Holanda. Tática bifronte, não há como negar. Coisas de política. Mas o verdadeiro dom João IV está neste papel. Leia!
JOÃO FERNANDES (lê devagar; frei Manuel ergue o candeeiro): – “Lisboa, dada no terreiro do Paço, aos 4 de fevereiro de 1643. Eu, el-rei…” (pausa, espanto cada vez maior) – Não é possível! Frei Manuel! El-rei me ordena que faça guerra aos holandeses! – André Vidal, aperte estas mãos. Nisto estaremos unidos para a vida e para a morte!
(Os dois dão-se as mãos, emocionados.)
FREI MANUEL: – Graças a Deus!
(Ouvem-se de novo três pios de pássaro.)
ANDRÉ VIDAL: – Não se inquietem. Deve ser Rodrigo Mendanha.
FREI MANUEL (assustado): – Rodrigo?
ANDRÉ VIDAL: – Sim. Por que o susto? O rapaz saltou conosco no costão do Baeta e foi direto ao engenho de João Fernandes. (espanta-se com o aspecto alucinado de Rodrigo, que acaba de entrar.) – Que aconteceu, Rodrigo?
RODRIGO (dirigindo-se a João Fernandes e a frei Manuel): – É verdade, João Fernandes? – É mesmo verdade o que me contaram, frei Manuel?
FREI MANUEL: – Desgraçadamente, é verdade, meu filho. Eles a roubaram, os ladrões.
ANDRÉ VIDAL: – Mas roubaram quem, frei Manuel? E quem roubou?
FREI MANUEL: – Os flamengos. Roubaram Carlota.
ANDRÉ VIDAL: – A minha Carlota? Vosmecê está louco, frei Manuel? Isso lá é possível?
JOÃO FERNANDES: – É verdade. Alegando o motivo de que ela é filha de holandeses, Jan Blaer arrancou-a da casa de dona Joana para casá-la com Sigmund Starke.
RODRIGO: – Pois eu juro, juro que Carlota nunca há de ser mulher desse alferes!
ANDRÉ VIDAL (desesperado, anda de cá pra lá): – É preciso salvá-la, meu Deus!
JOÃO FERNANDES: – Salvá-la, como?!
ANDRÉ VIDAL: – Corro à casa de Jan Blaer, e se ele não me entrega Carlota, traspasso-o com uma cutilada. Varo-o de lado a lado!
FREI INÁCIO: – Acalmem-se, filhos. De nada valem esses bufos e arreganhos. Matar, destripar, varar de lado a lado, tudo são bravatas que não resolvem coisa alguma. Se querem salvar Carlota, o meio mais seguro é comprar seu livramento através de Gaspar Dias. Mais cruzado, menos cruzado, e tudo se arranja.
ANDRÉ VIDAL (a quem as últimas palavras deixaram pensativo): – Engano seu, frei Inácio. Isso é vingança de dona Ana Paes contra mim. Nem Gaspar Dias, nem Jan Blaer irão desobedecer suas ordens. É a mulher mais poderosa da capitania. Havemos de achar melhor jeito. – Rodrigo! Vamos à cidade Maurícia! – João Fernandes, fique vosmecê avisado que deve aparecer aqui um homem que chegará da Bahia. Agasalhe-o com cuidado. Irei, na data aprazada, ao engenho de vosmecê encontrar os amigos. Adeus! (vai saindo)
RODRIGO e FREI INÁCIO (saindo atrás): – Adeus!
JOÃO FERNANDES e FREI MANUEL: – Adeus e boa sorte! (apagam o candeeiro)
CENA  2
Sala do palácio de Friburgo: O Príncipe de Nassau; Gaspar Dias; Jan Blaer.
Rua: Um soldado da guarda; três passantes; o Bastião.
NASSAU (ao ver entrar Gaspar Dias afogueado):
– Que houve, Gaspar Dias? Que é que trouxe
a vosmecê assim tão descomposto?
GASPAR DIAS:
– Rebelião! Rebelião, Alteza!
Por toda parte! Escravos e senhores!
NASSAU (chocado):
– Gaspar Dias, que disse vosmecê?
GASPAR DIAS:
– Pará e Maranhão se rebelaram,
e São Luiz não nos pertence mais.
Dizem que Camarão e Henrique Dias
já partiram, por terra, da Bahia.
Vidal anda soprando nos ouvidos
dos senhores de engenho das províncias.
NASSAU:
– Ah… é Vidal o iniciador de tudo.
Sua força é maior, quase invencível,
porque peleja pela sua gente
e pelos bens de sua própria terra,
sem ambição de glória. E é valente!
Um guerreiro admirável, Gaspar Dias!
JAN BLAER (entrando apressado, meio sem fôlego):
– Senhores!… – A rebelião, Alteza,
está por estourar… a qualquer hora.
Procuramos deter André Vidal…
e João Fernandes…
NASSAU (ansioso): – Sim… e conseguiram?
JAN BLAER (fazendo que não com a cabeça, desanimado):
– Não foram encontrados. Andam todos,
todos os principais de Pernambuco,
metidos já no mato.
NASSAU:          – Pois, Jan Blaer,
prepare seus soldados para a luta!
E antes de mais nada, infelizmente,
ponho a prêmio a cabeça de Vidal.
Providencie isto, Gaspar Dias!
(Eles saem. Os dois por um lado, Nassau pelo outro. Há passantes na rua, inclusive o Bastião. Um soldado da Guarda aparece e afixa um edital.)
1º PASSANTE: – Olhem! Um edital do Príncipe! (lê em voz alta) “Eu, o Príncipe Maurício de Nassau, governador Geral do Brasil Holandês, ofereço dois mil florins, e mais o perdão de qualquer crime cometido, a quem me trouxer a cabeça de André Vidal de Negreiros.”
BASTIÃO (assustado e alerta): – Crendospadre! Vassuncristo! (6)  (vai saindo às
                                                 pressas)
2º PASSANTE: – Aonde vai com tanta pressa, Bastião?
BASTIÃO: – A nenhum lugá, não sinhô, mas careço de í. (sai)
3º PASSANTE (olhando o edital): – Alguma coisa está para acontecer… E André Vidal deve estar por trás de tudo.
2º PASSANTE: – Homem valente, esse Vidal… (escurece e ouve-se um toque de clarim) É o toque de recolher da Fortaleza Ernesto! Vamos!
(Os três passantes saem. Bastião aparece, espiando em volta, com medo.)
BASTIÃO (consigo mesmo): – O sinhô André Vidal me encomenda cada serviço… Ele disse: “Corage, Bastião! Pensa que ocê é nego forte, de truz!” (vê o soldado da Guarda, que vem fazer a ronda) Ôpa! Num tô aqui! (esconde-se)
SOLDADO DA GUARDA (passa exclamando e sai): – Nove horas! Tudo em paz!
BASTIÃO (reaparecendo): – Lá vô eu. (afixa outro edital ao lado do primeiro e sai
                                                         correndo)
CENA  3
Rua e janela da casa de Jan Blaer. Os três passantes; Carlota Haringue; Bastião e Rodrigo; Jan Blaer; Sigmund Starke, os dois soldados da Guarda e a sentinela.
(Clareou o dia. Os três passantes entram e avistam o outro edital.)
1º PASSANTE: – Olhem! Outro edital! E este é de André Vidal. (lê em voz alta): “Eu, André Vidal de Negreiros, capitão de Infantaria do rei de Portugal, ofereço seis mil cruzados em ouro pela cabeça de João Maurício, conde de Nassau.”
2º PASSANTE (com espanto): – Seis mil cruzados?! Então ele oferece em ouro, por Nassau, mais que o dobro do que Nassau ofereceu por ele com sua prata!
3º PASSANTE: – É coragem! Que homem!
(Os três saem. Passa Bastião com um sacão de açúcar nas costas. À janela de Jan Blaer, Carlota começa a cantar. Bastião descansa o saco no chão e se senta para ouvir. Ver se convém aí o acompanhamento de outras vozes femininas.)
CARLOTA (canta “A Bela Infanta”):
“Lá estava a bela infanta no seu jardim assentada;
com um pente de ouro fino seus cabelos penteava.
Seu olhar pousou no mar, viu chegar a nobre Armada.
Capitão que nela vinha muito bem que a governava.
Hum-hum-hum-hum-hum-hum-hum-hum… (bis)
– Vem dizer-me, ó capitão dessa tua nobre Armada,
se encontraste meu marido na terra que Deus pisava.
‘Anda tanto cavaleiro naquela terra sagrada…
Dize tu, senhora dona, quais as senhas que levava.’
Hum-hum-hum-hum-hum-hum-hum-hum… (bis)
– Seu cavalo era branco, seu selim, prata dourada,
cruz de Cristo em sua lança e uma flâmula encarnada.
‘Este anel de sete pedras, que eu contigo reparti,
onde está a outra metade? Pois a minha, ei-la aqui…’
– Folgai, folgai, ó meus vassalos, que é dom Infante a meu lado!” (ela se cala e sai da janela)
RODRIGO (chegando e vendo Bastião, chama-o em voz baixa): – Bastião!
BASTIÃO: – Sinhô Rudrigo! Não fazia vancê por estas bandas!
RODRIGO: – Psiu… Caluda… Que vai levando aí?
BASTIÃO: – Um sacão de açúca do sinhô João Blar pru Príncipe.
RODRIGO: – Pois dê um jeito de distrair e afastar Jan Blaer de casa, para que eu possa falar com Carlota, Bastião.
BASTIÃO: – Pode conta cumigo! (chama alto, e Rodrigo se esconde): – Sinhô João Blar! Sinhô João Blar!
JAN BLAER (sai de casa zangado): – Por que me chama, Bastião? Estou de partida para o sertão, e a hora não comporta atraso.
BASTIÃO: – Mas, sinhô, num tô guentano esse açúca de vancê. Travessô no meu pé um gato preto horríve, que é mau agouro na certa. O açúca vai sê roubado, porque me atacô uma dô no peito…
JAN BLAER (fazendo pouco caso): – Ora, dor no peito…
BASTIÃO (insistente): – … que arresponde na cacunda. Nem posso caminhá.
JAN BLAER: – Nem vai caminhar. Vai correr. E já! Com açúcar e tudo!
(Com o sacão no ombro, Bastião sai correndo em ziguezague, aos pulos, com Jan Blaer atrás, ameaçando, de rebenque na mão.)
BASTIÃO: – Ai, sinhô!
JAN BLAER: – Corra, Bastião!
BASTIÃO: – Ai, sinhô!
JAN BLAER: – Corra, seu preguiçoso!
BASTIÃO: – Ai, sinhô!
JAN BLAER: – Corra, seu endiabrado!  (saem os dois)
RODRIGO (reaparece e chama Carlota): – Carlota! Carlota!
CARLOTA (surge à janela de J. Blaer): – Rodrigo!! Pensei que nunca mais viesse!
RODRIGO: – Estou aqui, minha Carlota, não tenha medo. O casamento com o alferes holandês só se realizará se eu morrer.
CARLOTA: – Mas, se ele chegou de viagem hoje, o casamento não tarda!
RODRIGO: – Tenha esperança. Estou aqui!
CARLOTA (olhando longe): – Vá embora depressa, Rodrigo! Sigmund Starke apontou na esquina.
RODRIGO: – Estou por tudo, Carlota. Daqui não arredo pé.
SIGMUND (aparecendo): – Rodrigo Mendanha!
RODRIGO (desafiante): – Eu mesmo, para o servir.
(os dois puxam da espada e duelam)
CARLOTA: – Meu Deus, meu Deus!
(Rodrigo fere Sigmund, que cai. Os soldados da Guarda acorrem e prendem Rodrigo. A sentinela ajuda Sigmund a se levantar e o leva consigo.)
CARLOTA: – Ah, não, não! E agora?   (sai da janela)
CENA  4
Sala do Príncipe. Nassau; o oficial holandês; Gaspar Dias, Ana Paes, Carlos Tourlon.
(O príncipe está em cena, sentado à sua mesa de trabalho. Entra o oficial.)
OFICIAL:
– Trouxe despachos para Vossa Alteza:
ofício urgente do Conselho de Haia
e esta carta secreta.
NASSAU (lê o ofício e a carta espantadíssimo e fala com o oficial): – Oficial!
Chame imediatamente Gaspar Dias!
(Nassau anda de cá para lá, enquanto o oficial sai e volta com Gaspar Dias.)
NASSAU:
– Há despachos de Holanda, Gaspar Dias.
GASPAR DIAS:
– Já soube pelo capitão da nau.
NASSAU:
– Pois ouça e pasme: já estou dispensado
do governo e fui chamado a Holanda.
GASPAR DIAS:
– É inconcebível, Príncipe! É absurdo!
NASSAU (seco):
– Leia esta carta!   (passa-lhe um documento)
GASPAR DIAS (lendo alto): – “… e se admirava muito
de João Maurício ter sido levado
a descaminhos, pelos maus conselhos
de um português… que é muito… seu amigo,
que o faz empreender coisas injustas,
pelo interesse que esse amigo tem
em ajuntar dinheiro e enriquecer,
tudo às custas dos pobres moradores…
e que também o Príncipe enriquece…”
NASSAU (mais seco ainda):
– Gaspar Dias, o amigo é vosmecê.
GASPAR DIAS:
– Intriga vil!
NASSAU: – Mas leia, leia mais!
GASPAR DIAS:
– “Certa mulher fermosa é a grande causa
da privança do Príncipe com esse
português…”
NASSAU: – Alusão a Ana Paes.
GASPAR DIAS:
– Direta. Quem tramou toda esta intriga
foi alguém que se dói por Ana Paes.
NASSAU:
– Carlos Tourlon!
GASPAR DIAS: – São dois os intrigantes:
Tourlon, cá no Brasil, e Arcisiewsky
em Holanda.
NASSAU (vê entrar Ana Paes): – Dona Ana Paes!
ANA PAES (apressada e agitada):    – Meu Príncipe!
– Sabem, senhores,o que aconteceu
com Rodrigo Mendanha? Pois fugiu.
NASSAU:
– Fugiu?! Mas, fugiu como?
ANA PAES:                     – Eu não sei.
Isso é bom indagar do meu marido,
Carlos Tourlon. É ele o responsável
por Rodrigo na Fortaleza Ernesto.
E ele estava com carcereiro à porta.
GASPAR DIAS:
– Carlos Tourlon… E agora os presos fogem
da Fortaleza Ernesto!
NASSAU (ao oficial): – Vá chamar
Carlos Tourlon, o Capitão da Guarda!  (o oficial se inclina e depois sai)
(a dona Ana):
– Mas é um traidor, esse Tourlon.
Ainda agora mesmo, dona Ana,
acabo de saber coisas terríveis,
por ofício secreto que me mandam
de Holanda. Denunciam-me, dona Ana.
E a causa da denúncia é vosmecê.
ANA PAES (assustada):
– Eu sou a causa?!
NASSAU (estende-lhe a carta): – Leia!
ANA PAES (lendo):                       – Foi… Tourlon!
GASPAR DIAS:
– Não resta a menor dúvida: Tourlon,
sempre aos abraços com esse João Fernandes,
certamente facilitou a fuga
de Rodrigo Mendanha.
NASSAU:             – Certamente.
TOURLON (entrando):
– Alteza!
NASSAU (seco): – Vosmecê me preste conta
de Rodrigo Mendanha.
TOURLON:           – Pois fugiu.
Subornou Bastião, o carcereiro,
e ambos escaparam mato adentro.
Que podia eu fazer?
NASSAU:             – Sabe o que mais?
Vosmecê é um vendido, um traidor!
E já está demitido!
TOURLON:        – Mas, Alteza…
NASSAU:
– Eu parto para Holanda amanhã mesmo,
destituído que fui, deste governo.
Vosmecê vai também. Prestará contas
ao Conselho de Haia, assim como eu.
TOURLON (abatido):
– Devo partir, então… Antes, porém,
peço que Vossa Alteza me conceda
apenas uma graça. Apenas uma.
Com ela estarei pago desta dor:
que dona Ana Paes não vá comigo!
Quero ir só.
ANA PAES (enraivecida): – Vosmecê é que se engana!
Pois sou eu que não quero acompanhá-lo!
Pode partir sozinho!
NASSAU:           – Basta! Basta!
Eu concedo o que pede. E, agora, saia!   (Tourlon se inclina e depois sai)
(a Gaspar Dias):
– Gaspar Dias, diante destes fatos,
que fará vosmecê?
GASPAR DIAS:   – Se me permite,
sigo com Vossa Alteza para Holanda.
NASSAU:
– Se nada o prende aqui…
GASPAR DIAS:        – Nada.
NASSAU (a Ana Paes):    – Dona Ana,
e Sigmund Starke?
ANA PAES:     – Está bem melhor.
NASSAU:
– Antes assim.
ANA PAES:  – Mas tenho um outro assunto:
vi afixado, pelas freguesias,
outro edital, escrito por Vidal,
oferecendo ouro a quem lhe traga
a cabeça do Conde de Nassau.
Seis mil cruzados!
NASSAU (espantado): – Cinco mil florins
de nossa prata!! E eu, que oferecia
dois mil florins apenas… Que ironia!
Seis mil cruzados… O paraibano
paga em ouro a cabeça de Nassau…
GASPAR DIAS:
– Que petulância!
ANA PAES:      -Que descaramento!
NASSAU:
– Que coragem a desse André Vidal!
Agora, por favor, senhores, saiam,
que careço de estar sozinho um pouco.
(Saem o oficial, Gaspar Dias e Ana Paes.)
NASSAU (com sentimento, após uma pausa):
– Do Brasil Holandês fiz minha pátria.
Com esta rebelião, que será dele?
Vou deixá-lo de coração partido…
Só espero que os que me sucederem
tenham moderação e tolerância.
Toda a ciência e arte que eu amava,
meu jardim, a cidade que criei,
para aqueles que ficam… deixarei.        (ele sai)
TERCEIRO  ATO
CENA  1
Bivaque no Monte das Tabocas. Antônio Cavalcanti, Dias Cardoso; Rodrigo Mendanha, João Fernandes Vieira; Domingos Fagundes Barbosa.
ANTÔNIO CAVALCANTI (sozinho em cena, vê chegar Dias Cardoso): – Bem-vindo seja, capitão Dias Cardoso. Bem-vindo seja.
DIAS CARDOSO: – Então, meu bravo Antônio Cavalcanti, que é que o aperreia?
ANTÔNIO CAVALCANTI (tristemente): – Um desgosto particular, capitão.
DIAS CARDOSO (animando-o): – Pois vosmecê, que é um dos mais antigos na conjuração, vosmecê, que sempre foi contra os flamengos, agora que se aproxima a hora do combate está neste desalento!
CAVALCANTI: – Eu sinto, meu capitão. Bem sei que vosmecê veio da Bahia com seus homens, a mando do Governador Geral, para lutar junto conosco. Mas, que tenha trazido o título de nomeação de João Fernandes Vieira para capitão-mor e governador da guerra, é o que me deixa aturdido.
DIAS CARDOSO: – Mas vosmecê também é chefe. É vice-governador da liberdade pernambucana!
CAVALCANTI: – Mas tendo de obedecer a quem era amigo dos flamengos…
DIAS CARDOSO: – João Fernandes era amigo de Nassau – aliás um grande homem – e seus negócios com os holandeses eram bastante compreensíveis para um senhor de engenhos.
CAVALCANTI: – Negócios… Dívidas, isso sim. Dívidas que ele espera que se anulem se nos libertarmos do domínio holandês.
DIAS CARDOSO: – Mas vosmecê bem sabe que ele agora está firmemente unido a nós todos nesta guerra e pronto a dar vida e fazenda por ela. Bem merece que se lhe anulem as dívidas, se for esse o caso. Além disso, o Governador Geral apenas seguiu as resoluções de André Vidal.
CAVALCANTI: – Por que então André Vidal não é o chefe, se tudo é planejado por ele? É uma injustiça que dói.
DIAS CARDOSO: – Porque o próprio Vidal acha que as pessoas mais poderosas da terra é que devem prestigiar o movimento, chefiando-o. Ele se considera apenas um soldado. Ah, fique vosmecê sabendo que, obedecendo ao plano de Vidal, Henrique Dias, o chefe negro, e Filipe Camarão, o chefe bugre, já se entranharam no sertão, vindos da Bahia com seus homens.
CAVALCANTI: – Ora, graças! Henrique Dias e Camarão?
DIAS CARDOSO: – Sim, meu amigo. E imagine que, lá da Bahia, o Governador Geral avisou os holandeses que Henrique Dias se sublevara e fugira com seus homens, e que ele então mandara Camarão persegui-lo com sua tropa. Mas, como não garantia a obediência nem de um nem do outro, mandou mais dois regimentos atrás deles.
CAVALCANTI: – Dois regimentos?!
DIAS CARDOSO (rindo): – Sim! Comandados por André Vidal e Soares Moreno.
CAVALCANTI: – Mentira grande, capitão.
DIAS CARDOSO: – E há outro jeito de lidar com quem rompe um tratado de paz logo depois de assinado?
CAVALCANTI: – Não há, mesmo.
DIAS CARDOSO: – Ademais, temos de nos livrar do domínio flamengo agora que caiu em mãos ineptas. A partida de Nassau foi como a queda de um esteio. É só darmos um forte empurrão que a construção desaba.
CAVALCANTI: – Lá isso é verdade. É bem verdade…
DIAS CARDOSO: – Pois tenha ânimo, Cavalcanti! Sou português, e há vinte anos sirvo no Brasil nesta luta difícil. Vim da Bahia conduzir vosmecês numa batalha, mas o comando da guerra está com os principais do país, como um Antônio Cavalcanti (bate em seu ombro). Aqui, neste Monte das Tabocas, faremos frente aos adversários.
RODRIGO (entrando apressado, junto com João Fernandes): – Capitão, os holandeses! E muito bem armados!
DIAS CARDOSO: – Com quantos homens?
RODRIGO: – Uns mil e poucos, entre flamengos e mercenários.
JOÃO FERNANDES: – Nós não temos tanta gente! E só contamos com trezentas armas de fogo, paus tostados, bordões de quatro palmos e…
CAVALCANTI (completando-o, animado): – E a proteção de Deus! Ademais, lutamos em defesa do nosso chão. Cada um vale por dois.
DIAS CARDOSO: – Pois, vamos! Disponham-se em quatro emboscadas no meio dos tabocais! João Fernandes, com o grosso da tropa, que fique no alto do monte para o assalto final!
DOMINGOS FAGUNDES (entra): – Capitão, os holandeses avançam! Há pelo mato rumores de marcha.
DIAS CARDOSO (empunha a espada e brada): – A eles! – Fagundes, vá à frente esperá-los! Defenda a passagem do Tapacurá e, em seguida, volte em retirada simulada, para atrair o adversário às emboscadas! – Atenção, João Fernandes. No assalto final, desça como um turbilhão! – A eles! A eles, meus bravos!
(Saem todos.)
CENA  2
Sala do palácio de Friburgo. O oficial, Jan Blaer, Sigmund Starke, van Dirth; Ana Paes.
(O conselheiro van Dirth e o oficial estão na sala. Entram Jan Blaer e Sigmund Starke, exaustos e ofegantes.)
JAN BLAER: – Foi um fracasso, senhores… um fracasso… sem precedentes.
OFICIAL (assustado): – Um fracasso?!
VAN DIRTH: – Não é possível, Jan Blaer! Nossas tropas de elite rechaçadas por uma legião bisonha de habitantes mal armados, de senhores de engenho de mistura com escravos e parentes?
JAN BLAER (largando-se numa cadeira): – Eu bem sei… Mas eles se bateram como tigres… Nunca vi tanto ímpeto.
VAN DIRTH: – E vosmecê não se envergonha dessa derrota? – E vosmecê, Sigmund Starke, não cora em confessar que foi batido por essa corja de mamelucos que não sabe nem sequer desfechar um mosquete de Biscaia?
SIGMUND STARKE: – Como vosmecê está enganado, van Dirth. Os homens já não são os mesmos do tempo da conquista. São agora tão aguerridos como nós. Pena é que vosmecê não tenha assistido o combate. Fomos atraídos a quatro emboscadas, e por fim a tropa de João Fernandes desceu do monte como um turbilhão, tocando buzinas de guerra, ora aos gritos, ora cantando uma reza, com um frade em meio aos disparos.
OFICIAL: – E Henrique Dias? E Camarão?
JAN BLAER: – Já estão às portas. E esse é o perigo maior.
VAN DIRTH: – Não é mais, senhores. Da Bahia, o Governador Geral, sabedor da rebeldia do chefe negro e do chefe índio, já aprestou a flor do seu exército para vir castigá-los.
JAN BLAER: – Vosmecê tem certeza disso? Tem certeza de que o Governador Geral desaprova o levante?
VAN DIRTH: – Pois se Holanda e Portugal firmaram pazes…
SIGMUND STARKE: – É a nossa única salvação, senhores.
ANA PAES (entra, indignada): – Acabo de saber da vergonha das Tabocas!
VAN DIRTH: – Foi uma fatalidade, dona Ana Paes. Uma fatalidade.
ANA PAES: – Qual fatalidade! Fomos derrotados, isso sim! Pois eu vim aqui, senhores, sugerir um plano a vosmecês.
VAN DIRTH: – Um plano, dona Ana?
ANA PAES: – Fulminante! É este: muitos conjurados deixaram as esposas no Arrecife. Pois bem. Proponho agarrá-las e trancafiá-las como reféns. E hoje, sem mais tardança, lançar uma violenta proclamação aos rebeldes: ou os maridos largam as armas, ou as matronas pernambucanas serão enforcadas!
VAN DIRTH: – Sim! É uma idéia soberba! Os homens vão fazer tudo para salvar as mulheres. É catá-las e guardá-las aqui no palácio de Friburgo.
ANA PAES: – Vosmecê está louco, van Dirth? Não temos sequer vigias. Todos os nossos soldados entrincheiraram-se no engenho da Casa Forte. Não há lugar mais seguro que lá, no meio do próprio exército.
VAN DIRTH: – Pois que seja! – Vá, Jan Blaer! – Vá, Sigmund! Prendam essas mulheres e levem-nas ao engenho da Casa Forte. Sua noiva também, Sigmund.
SIGMUND (assustado): – Minha noiva?!
VAN DIRTH: – Sim. Carlota Haringue. Mas, não se assuste. Pois não vão casar-se assim que dermos conta desta rebelião?
SIGMUND: – Mas…
VAN DIRTH: – Pois leve-a. André Vidal e Rodrigo Mendanha vão endoidecer.
(Jan Blaer e Sigmund Starke saem por um lado. Van Dirth, o oficial e Ana Paes se retiram para o fundo.)
CENA  3
Cabana de João Fernandes no mato. Rodrigo Mendanha, Amaro Lopes, João Fernandes; depois, Henrique Dias, Filipe Camarão; Bastião.
(Amaro Lopes, Rodrigo e João Fernandes repousam, recostados. Ouvem-se sons de atabaques e, depois, os gritos agudos dos índios que se aprestam para a luta.)
RODRIGO: – Amaro Lopes! Amaro! Não está ouvindo? Que ruídos são esses?
AMARO LOPES: – Som de atabaques. E aumenta! Só pode ser Henrique Dias!
RODRIGO (ergue-se): – É Henrique Dias, que chega com seus homens.
AMARO LOPES (ergue-se): – E esse alarido agora? Esses gritos confusos?
JOÃO FERNANDES (já de pé): – Camarão! É o bravo Filipe Camarão com sua tropa de índios.
(Henrique Dias e Camarão entram e cumprimentam os amigos.)
RODRIGO: – Henrique Dias!
JOÃO FERNANDES : – Camarão!
AMARO LOPES: – Bem-vindos os grandes chefes!
CAMARÃO: – Meus amigos, a marcha se retardou, porém aqui estamos.
HENRIQUE DIAS: – Tivemos de varar os sertões e os rios estavam mui crescidos.
CAMARÃO (batendo alegremente no ombro de Henrique Dias): – E eu persegui e alcancei este nego fugido, seguindo as ordens de André Vidal.  (risos gerais)
AMARO LOPES: – E onde está André Vidal, que ainda não se juntou a nós? E Soares Moreno?
CAMARÃO: – Já desembarcaram com seus regimentos. Tomaram o Forte de Serinhaém, num cerco que durou nove dias, e vêm vindo aí atrás de nós.
BASTIÃO (entrando apressado e aflito): – Sinhô Rudrigo! Sinhô Rudrigo! (fica pulando respeitosamente diante dos outros chefes): – Sinhô! – Sinhô! – Sinhô!
RODRIGO: – Que é isso, Bastião? Que bicho o mordeu, homem?
BASTIÃO (quase sem fôlego): – A muierada do Arrecife foi presa, sinhô. João Blar carregou tudinho pru Engenho da Casa Forte.
AMARO LOPES: – Vosmecê está louco, Bastião?
BASTIÃO: – Num tô louco não, sinhô Amaro! A muié de vancê já tá lá.
AMARO LOPES: – A minha mulher?!
BASTIÃO: – E dona Joana, sinhô Rudrigo… e dona Carlotinha também, ai, sinhô…
RODRIGO: – Carlota?!!!
JOÃO FERNANDES: – Mas como é que foi isso, homem? Diga! Diga!
BASTIÃO: – Assunta só, sinhô capitão-de-campo. Foram órdes de dona Ana Paes!
JOÃO FERNANDES: – Pois nada de repouso, amigos. Partamos imediatamente contra os flamengos! Vamos cair sobre eles de improviso, como um raio! (saem)
CENA  4
Engenho da Casa Forte. Jan Blaer, os dois soldados da Guarda; Carlota Haringue, Joana de Albuquerque, Luiza de Oliveira (mulher de Amaro Lopes); Sigmund Starke; depois, João Fernandes, André Vidal, Amaro Lopes, Rodrigo Mendanha.
(As três mulheres sentadas no chão a um canto, com as mãos amarradas. O 1º soldado da Guarda conversa com Jan Blaer.)
1º SOLDADO: – Deixe que venha a ajuda da Bahia, meu capitão. A qualquer momento a tropa rompe aí. E então, com gente descansada, arcabuzaria nova, havemos de fazer um estrago nos pernambucanos.
JAN BLAER: – Vosmecê está enganado, amigo. A rebelião será sufocada sem se queimar um arrátel (7) de pólvora. (Rindo) Aquelas mulheres que estão ali (aponta para elas) vão ganhar a guerra para nós. Ah, essa idéia de dona Ana Paes foi de ouro!
2º SOLDADO (entra apressado): – Às armas! Às armas! Os brasileiros surgem de todos os lados! (para Jan Blaer, apontando ao longe): – Henrique Dias! Veja!
1º SOLDADO (com terror): – Henrique Dias e Camarão!
JAN BLAER (grita): – As mulheres! As mulheres! Suspendam as mulheres às janelas, à vista de todo o exército, bem no alvo das balas inimigas!   (os dois soldados obedecem)
JOÃO FERNANDES (de fora): – Cessar fogo! As mulheres brasileiras estão presas nas janelas!
LUIZA DE OLIVEIRA: – Atirem, pernambucanos! Nossas vidas não importam!
CARLOTA HARINGUE: – Estamos prontas para morrer! Avancem!
JOANA DE ALBUQUERQUE: – Viva Pernambuco!
SIGMUND STARKE (entra alegre e aliviado): – Está chegando a ajuda dos portugueses! Os soldados da Bahia! Estão chegando!
JAN BLAER (olha ao longe): – Estão chegando, sim, mas com os brasileiros. André Vidal vem à frente, no comando. É inútil continuar. (Pega a bandeira branca e ergue-a bem alto.)
ANDRÉ VIDAL (de fora, na frente): – Que quer vosmecê, Jan Blaer?
JAN BLAER: – Capitular!
(Entram André Vidal e Rodrigo pela frente, seguidos de Amaro Lopes. Rodrigo solta as mulheres.)
CARLOTA: – Rodrigo! Eu já nem esperava mais nada deste mundo.
RODRIGO (a Carlota): – Minha Carlota! Pois se eu estou aqui!
CARLOTA (vendo André Vidal): – André Vidal!
ANDRÉ VIDAL (a Carlota): – Minha filha! (a dona Joana): – Também vosmecê nesta aflição, dona Joana?
JOANA DE ALBUQUERQUE: – Mais uma laçada de dona Ana Paes que vosmecê desatou, André Vidal.
AMARO LOPES (à sua mulher): – Dona Luiza, minha cara, era de se ver a coragem da mulher pernambucana!
LUIZA DE OLIVEIRA: – Pois estamos aqui para dar apoio a vosmecês, na vida como na morte.
JOÃO FERNANDES (entra): – Quais as condições da capitulação, André Vidal?
ANDRÉ VIDAL: – Prometi que os flamengos serão tratados como prisioneiros de guerra. É mister cumprir a palavra. Portanto, nada de fusilamentos.
JOÃO FERNANDES: – Tratarei de arregimentar um esquadrão que conduza os prisioneiros à Bahia. Que Rodrigo leve as mulheres a salvo para suas casas!
ANDRÉ VIDAL: – João Fernandes, deixo-o, com os nossos, a incomodar o inimigo, e corro com meu regimento a reforçar Soares Moreno, que está investindo na Fortaleza do Pontal.
JOÃO FERNANDES: – Pois vá! E boa sorte!
(Saem todos.)
CENA  5
Cabana no mato. João Fernandes, André Vidal; Domingos Fagundes, frei Inácio; Francisco Barreto.
(João Fernandes e André Vidal estão na cabana. Entra Domingos Fagundes.)
DOMINGOS FAGUNDES: – João Fernandes!
JOÃO FERNANDES: – Fagundes! A que vem vosmecê?
DOMINGOS FAGUNDES: – Venho acompanhando um religioso que tem assunto particular. Mas eu também trago notícias.
JOÃO FERNANDES: – Notícias? E quais são elas?
DOMINGOS FAGUNDES: – Os holandeses abandonaram Olinda e se recolheram no Arrecife e na Cidade Maurícia. Os nossos já estão iniciando por lá um rigoroso cerco.
ANDRÉ VIDAL: – Olinda! Olinda já está livre! Graças a Deus! Tinha razão frei Antônio Rosado com suas palavras proféticas: “De Olinda a Olanda não há mais que a mudança de um i em a, e esta vila de Olinda há de se mudar um dia em Olanda!” Ele, porém, acrescentou: “Mas não tardará a acudir a justiça do céu!”
DOMINGOS FAGUNDES: – E não tardou!
JOÃO FERNANDES: – Muito boa nova, meu caro Fagundes! Mas, e o reverendo?
DOMINGOS FAGUNDES: – Está entrando.  (ele sai e frei Inácio entra)
JOÃO FERNANDES (espantado): – É frei Inácio! Salve, amigo! Seja bem-vindo!
ANDRÉ VIDAL: – Salve, frei Inácio!
FREI INÁCIO (sério): – Salve, amigos! João Fernandes, trago ordens urgentes de el-rei para vosmecê.
JOÃO FERNANDES (estranhando): – De el-rei para mim?
FREI INÁCIO: – Sim, ordens secretas de dom João IV. (estende a João Fernandes um pergaminho timbrado)
JOÃO FERNANDES (lê; pausa de espanto): – É inacreditável! – André Vidal, el-rei determina que cesse a guerra. Manda energicamente que acabemos com a campanha.
ANDRÉ VIDAL: – Mas isso é de estarrecer! A que vem esta notícia de tamanha barbaridade, frei Inácio?
FREI INÁCIO: – Sabedor de muita matança no Rio Grande, na Paraíba, na ilha de Itaparica na Bahia, e em vários pontos de Pernambuco, el-rei cogitou de ouvir seus estadistas, que sugeriram ceder Pernambuco a Holanda, a troco da paz e da libertação das outras províncias.
ANDRÉ VIDAL (indignadíssimo): – Ceder Pernambuco? Não! Não pode ser! Ah, não pode ter sido em vão que tantos dos nossos morreram, nem pode ter sido em vão que queimamos nossos engenhos e canaviais para não entregá-los aos flamengos! E agora, João Fernandes, que vai vosmecê responder a el-rei?
JOÃO FERNANDES: – Frei Inácio, torne vosmecê a el-rei e diga a dom João IV, nosso amo e senhor, que João Fernandes Vieira desrespeita sua ordem.
FREI INÁCIO (com espanto): – Vosmecê desrespeita a ordem de el-rei? Vosmecê, João Fernandes?
JOÃO FERNANDES: – Eu mesmo. Desobedeço a el-rei. Diga a dom João IV que continuarei combatendo os flamengos até a última gota de sangue. E, quando terminar a reconquista, irei então oferecer minha cabeça a el-rei, para que Sua Majestade mande cortá-la. É o que tenho a dizer a vosmecê. Leve a Portugal a palavra que ouviu. Adeus, amigo.
FREI INÁCIO (admirado e desanimado): – Adeus, filhos.
ANDRÉ VIDAL (espantadíssimo): – Adeus.
(Sai frei Inácio.)
ANDRÉ VIDAL (saindo do assombro): – Vosmecê é homem de bravura, João Fernandes. Conte comigo para tudo.
JOÃO FERNANDES: – O que decidi está decidido. Agora que o general von Schkoppe voltou da Holanda e se pôs à frente dos holandeses, é preciso incendiar a guerra. Pois só o nome dele basta para aterrorizar os homens.
ANDRÉ VIDAL: – Se ao menos os galeões flamengos não tivessem atacado a frota que nos trazia de Portugal o general Francisco Barreto de Menezes… Esse general é um soldado de nota! E está, há nove meses, preso na Cidade Maurícia.
DOMINGOS FAGUNDES (entra de novo): – Vem alguém, senhores. Ouço passos. (em voz alta) – Quem vem lá?
FRANCISCO BARRETO (de fora, em voz alta): – É de paz! Preciso falar urgentemente ao chefe!
JOÃO FERNANDES: – Que entre!
(Domingos Fagundes sai.)
FRANCISCO BARRETO (entra): – Vosmecê é João Fernandes Vieira?
JOÃO FERNANDES: – Sou. Que há?
FRANCISCO BARRETO (estende-lhe um ofício): – Queira ler estes papéis. (dirige-se a André Vidal): – Vosmecê deve ser o bravo mestre-de-campo André Vidal de Negreiros.
ANDRÉ VIDAL: – Sim. Sou André Vidal.
JOÃO FERNANDES: – Vossa Excelência, senhor, é o General Francisco Barreto de Menezes?
FRANCISCO BARRETO: – Eu mesmo. Acabo de fugir da Cidade Maurícia.
ANDRÉ VIDAL (espantado): – Vossa Excelência fugiu da Cidade Maurícia?!
FRANCISCO BARRETO: – Sim. Francisco Bra, filho do carcereiro, abriu-me a porta do cárcere. João Voltrin, o francês, trouxe-me pelo Capiberibe em sua canoa. Vieram comigo, e peço proteção para ambos.
ANDRÉ VIDAL: – Será dada, certamente!
JOÃO FERNANDES (decidido): – Senhor General! Vossa Excelência é agora o nosso chefe. Deponho em suas mãos o comando das armas pernambucanas.
FRANCISCO BARRETO: – Mande então reunir os cabos de guerra. O general von Schkope avança ao nosso encontro.
DOMINGOS FAGUNDES (entra): – Senhores, chegou aviso de que as forças holandesas já se puseram em marcha e estão quase no alto dos montes Guararapes!
FRANCISCO BARRETO: – Pois vamos!
ANDRÉ VIDAL: – Nossa desvantagem é grande; mas, se os flamengos avançarem mais, estarão metidos no pântano, e nem vão poder se suster em pé.
FRANCISCO BARRETO: – Que o ataque se dê em três corpos. Confie-se um flanco a Henrique Dias. Seus homens devem emboscar-se nas gargantas do monte. Confie-se o outro flanco a Camarão. Seus homens devem tocaiar-se pelo mato.
JOÃO FERNANDES: – Peço licença para ir na vanguarda.
FRANCISCO BARRETO: – Pois vá. Nós, André Vidal, aguardaremos para agir no assalto final.
(Saem todos)
CENA  FINAL  ÚNICA
À frente da cena. Dona Ana Paes, duas holandesas, dois holandeses; o general von Schkoppe e o conselheiro van Dirth.
1ª HOLANDESA: – Que fazemos agora? O cerco aumenta cada vez mais nossa penúria.
2ª HOLANDESA: – Restam apenas quatro barris de farinha. De que serve isso para oito mil pessoas? (8)
ANA PAES: – Já duas vezes os nossos lutaram nos Guararapes, e das duas vezes foi a derrota…
1º HOLANDÊS: – Os soldados se amotinam porque não temos com quê pagá-los, e a deserção começa a ser frequente. E agora, que chegou de Lisboa a frota portuguesa, os Fortes estão sendo tomados tanto por terra como por mar.
2º HOLANDÊS: – As tropas do inimigo saem dos matos e de trás dos pântanos, atacam sem ordem e em completa dispersão, ligeiras e ágeis. Nós, ao contrário, combatemos formados da maneira que se usa na mãe-pátria, e não somos de modo algum afeitos à constituição do país (9).
ANA PAES: – É preferível sairmos todos tentando romper o cerco e morrermos pela espada. Antes isso do que a fome (10).
1ª HOLANDESA (vendo entrarem von Schkoppe e van Dirth): – O general von Schkoppe! O conselheiro van Dirth!
VAN DIRTH: – Meus amigos, o cerco foi levantado!
ANA PAES (com alívio): – O cerco foi levantado?
VON SCHKOPPE: – Acabamos de assinar a capitulação definitiva. Os que quiserem ficar nesta terra, debaixo da obediência das Armas portuguesas, serão governados e estimados como os demais portugueses (11). Os que não quiserem têm três meses para ultimar seus negócios (12). E depois… (abre os braços desalentado) é partir.
TODOS: – Partir?
VON SCHKOPPE: – Sim. Onde desembarcamos há vinte e quatro anos, de lá partiremos. De Olinda a Olanda!
HOLANDESES e ANA PAES (repetem a canção holandesa da página 20):
“Alle man van Neêrland stam
Voelen zich der Vad’ren zonen.
Willen veij op t’plekje wonen
Dat hun tot een erfdeel kwam.
Eigen meester niemands knecht,
Recht en slecht, recht en slecht.
Stalen vuist en rappe hand. (bis)
Zôo is t’volk van Nederland! (bis)”
(Os holandeses e dona Ana Paes vão saindo. O palco se ilumina e é tomado novamente pela música do Prólogo, a xácara “Nau Catarineta”. O povo, alegre, entra e canta a xácara inteira, se decidirem que a peça termina assim. Ou então a xácara é interrompida por uma pequena encenação do romancinho da “Nau”. Se escolherem essa encenação, deve passar pela cena um arremedo da nau, para dar mais cor à brincadeira. De qualquer modo, faço constar aqui o texto completo. Depois, a xácara é retomada e cantada até o fim, encerrando a peça com um finzinho da brincadeira e mais a despedida dos noivos Carlota e Rodrigo.)
POVO (canta):
“Ouvi agora, senhores,
coisas de muito pasmar.
É a nau Catarineta, ó tolina,
dela vos venho contar.”
Há sete anos e um dia
iam na volta do mar,
botando solas de molho, ó tolina,
para de noite jantar.”
(Os marujos da nau dialogam.)
CONTRAMESTRE:
– Senhor piloto, para onde está olhando?
Por sua causa estamos todos nós chorando! Eh!
PILOTO:
– Pois vejam lá, senhor mestre e contramestre,
eu bem estou vendo que isto é vento leste! Eh!
GAJEIRO:
– Senhor piloto, onde está com os sentidos?
Por sua causa estamos todos nós perdidos! Eh!
(Grande confusão e correria a bordo da nau.)
PILOTO:
– Senhor gajeiro, não me venha indignar!
Eu bem estou vendo na agulha de marear! Eh!
MESTRE:
– Calafate! Calafete o navio!
Água do mar não é como água de rio! Eh!
POVO (canta):
Há sete anos e um dia
iam na volta do mar,
botando solas de molho. ó tolina,
para de noite jantar.
A sola era tão dura.
Não a puderam tragar.
Deitaram sorte à ventura, ó tolina,
para saber quem matar.
A sorte caiu em preto
no Capitão General.
Um nada disse, os outros bradaram:
– Não, esta sorte não val’.
– Sobe acima, gajeiro,
meu gajeirinho real!
Olha se enxergas Espanha,ó tolina,
areias de Portugal.
Vou dar-te tanto dinheiro,
que não o possas contar.
“Não vou querer teu dinheiro, ó tolina,
que te custou a ganhar.”
– Dou-te meu cavalo branco,
que nunca houve um igual.
“Não vou querer teu cavalo, ó tolina,
que te custou a ensinar.”
– Dou-te a Nau Catrineta
para saíres ao mar.
“Não quero a Nau Catrineta, ó tolina,
que a não sei governar.”
– Que queres tu, meu gajeiro?
Que prenda hei de te dar?
“Quero que me dês a alma, ó tolina,
para comigo a levar.”
– Eu te renego, Inimigo
que vinhas a me tentar.
A minha alma é de Deus, ó tolina,
darei meu corpo ao mar.
Tomou-o um anjo nos braços,
não o deixou se afogar.
Deu um estouro o demônio, ó tolina,
e se acalmou todo o mar.
E a Nau Catarineta
vai a bom porto chegar.
Já vimos terras de Espanha, ó tolina,
areias de Portugal.
GAJEIRO (que é o demônio, fala): – Por onde eu saio? É pela proa?
POVO: – Não!
GAJEIRO: – Pelo bombordo?
POVO: – Não!
GAJEIRO: – Por onde eu saio, pelo resbordo?
POVO: – Sim!
(O gajeiro foge. Termina a brincadeira da Nau Catarineta. Aparece o casalzinho de noivos, Carlota e Rodrigo, saindo da igreja. O povo atira flores. O casal se despede alegremente de André Vidal, de dona Joana e de Bastião, podendo até ser pela nau, se nau houver.)
POVO: – Adeus, sinhô e sinhá!
CASAL: – Até segunda-feira, terça ou quarta o mais tardar!
F I M
 NOTAS  EXPLICATIVAS
1.  Da circular, em holandês, dirigida por von Schkoppe, Schoonenborch e Haecx
     aos chefes holandeses que ocupavam Itaramacá, Paraíba, Rio Grande do
     Norte, Ceará e Fernando de Noronha. (em Francisco Adolfo de Varnhagen,
     “História Geral do Brasil”, Tomo Terceiro, página 92)
2.  Trechos de artigos da Capitulação assinada a 26 de janeiro de 1654. (em F. A.
     de Varnhagen, mesmo livro acima, páginas 90 e 119)
3.  Trechos da obra de frei Manuel do Salvador (frei Calado) “Valeroso Lucideno e
     o Triunfo da Liberdade”.
4.  Trecho de carta escrita ao rei da Espanha sobre Matias de Albuquerque.
5.  Alabarda: arma composta de longa haste terminada em ferro pontiagudo e
     largo, atravessado por outro ferro geralmente em forma de meia-lua, como um
     cutelo.
6.  Vassuncristo: corruptela popular de “Valha-me Nosso Senhor Jesus Cristo”.
7.  Arrátel: antiga medida de peso que correspondia a 459 gramas.
8. Trecho de versos de louvor e agradecimento ao Senhor Deus, que mostram o
     estado de penúria em que se encontravam os assediados. Esses versos
     saíram no “Journael” de Arnhem. (em F. A . de Varnhagen, mesmo livro citado
     acima, página 44)
9.  Trecho do relatório do comissário Michiel van Goch sobre a expedição de 17
     de fevereiro de 1649, junto aos montes Guararapes. De “Documentos
     Holandeses, 4, folhas 190/195”, no Instituto Histórico. (em F. A.  de Varnhagen,
     mesmo livro citado acima, página 111)
10. Segundo o que escreveu Johan Nieuhoff, testemunha dos acontecimentos,
      em Gedenkweerdige Zee-en Lant-Reize, 275 ( em F. A . de Varnhagen no
      mesmo livro citado acima, página 72, sétima edição integral)
11. Trecho do artigo 4 da Capitulação. (em Varnhagen, mesmo livro acima, página
      119, sétima edição integral)
12. Os três meses de prazo constam do artigo 6 da Capitulação. (na mesma fonte
      anterior)
CENÁRIOS  E  PERSONAGENS  POR  CENA
PRÓLOGO:
Cena 1.  Centro e beira da Campina do Taborda.
               Sete habitantes (4 homens e 3 mulheres); general von Schkoppe,
               conselheiro van Dirth, cinco emissários (Sigmund Starke, a sentinela, o
               oficial, os dois soldados da Guarda); general Francisco Barreto, Rodrigo
               Mendanha, André Vidal de Negreiros e, querendo, outros chefes
               brasileiros da última cena do Terceiro Ato.
Cena 2.  Campina do Taborda.
               Frei Manuel do Salvador, as nove mulheres do Tejucupapo; frei João,
               frei Rafael de Jesus; Matias de Albuquerque.
PRIMEIRO ATO:
Cena 1. Casa de dona Joana de Albuquerque.
              Dona Joana, Carlota Haringue; Bastião, Jan Blaer.
Cena 2. Rua à frente da cena.
              O Capitão da Guarda Carlos Tourlon, Bastião.
Cena 3. Rua à frente da cena.
              O general von Schkoppe, o militar polonês Arcisiewsky.
Cena 4. Pórtico do palácio, rua à frente da cena; porta da taberna do Snider e
              casa de Jan Blaer do lado.
              Sentinela, 2 soldados da Guarda; Príncipe de Nassau, Carlos Tourlon;
              um casal de habitantes (portugueses); três holandeses da taberna; Jan
              Blaer, Carlota Haringue; dama holandesa, Gaspar Dias, conselheiro van
              Dirth, dona Ana Paes, Sigmund Starke.
Cena 5. Casa de Jan Blaer.
              Jan Blaer, Carlota Haringue; dama holandesa, Gaspar Dias, conselheiro
              van Dirth, dona Ana Paes, Sigmund Starke; Carlos Tourlon; mais tarde,
              o oficial holandês.
SEGUNDO ATO:
Cena 1. Cabana no mato.
             Frei Manuel do Salvador, João Fernandes Vieira; André Vidal de
             Negreiros, frei Inácio; Rodrigo Mendanha.
Cena 2. Sala do palácio de Friburgo; rua à frente da cena.
              O Príncipe de Nassau, Gaspar Dias; Jan Blaer. Um dos soldados da
              Guarda, 3 passantes (homens), o Bastião.
Cena 3. Rua à frente da cena e janela da casa de Jan Blaer.
              Os 3 passantes; Bastião; Carlota Haringue; Rodrigo Mendanha; Jan
              Blaer; Sigmund Starke, os 2 soldados da Guarda e a sentinela.
Cena 4. Sala do palácio de Friburgo.
              O Príncipe de Nassau, o oficial holandês; Gaspar Dias, dona Ana Paes,
              Carlos Tourlon.
TERCEIRO ATO:
Cena 1. Bivaque no monte das Tabocas.
              Antônio Cavalcanti, Capitão Dias Cardoso; Rodrigo Mendanha, João
              Fernandes Vieira; Domingos Fagundes Barbosa.
Cena 2. Sala do palácio de Friburgo.
              O conselheiro van Dirth, o oficial holandês; Jan Blaer, Sigmund Starke;
              dona Ana Paes.
Cena 3. Cabana no mato.
              Rodrigo Mendanha, Amaro Lopes, João Fernandes Vieira; Filipe
              Camarão, Henrique Dias; Bastião.
Cena 4. Engenho da Casa Forte.
              Jan Blaer, os 2 soldados da Guarda; Joana de Albuquerque, Carlota
              Haringue, Luiza de Oliveira (mulher de Amaro Lopes); Sigmund Starke;
              João Fernandes Vieira, André Vidal de Negreiros, Amaro Lopes, Rodrigo
              Mendanha; querendo, ainda Camarão e Henrique Dias.
Cena 5. Cabana no mato.
             João Fernandes Vieira; André Vidal de Negreiros, Domingos Fagundes,
             frei Inácio, general Francisco Barreto.
CENA FINAL ÚNICA:
            À frente da cena; no centro da cena.
            Dona Ana Paes, 2 holandesas, 2 holandeses; o conselheiro van Dirth, o
            general von Schkoppe. Povo da terra; Bastião, Joana de Albuquerque,
            André Vidal de Negreiros; Carlota Haringue, Rodrigo Mendanha.
AUTORES  CONSULTADOS
ANDRADE, Mário de – “Danças Dramáticas do Brasil” (Editora Itatiaia Ltda.,
                      Instituto Nacional do Livro, 2ª edição, 1982)
CALADO, Padre Mestre Frei Manuel – “O Valeroso Lucideno e o Triunfo da
                      Liberdade” (Editora Paulo Craesbeeck, Lisboa, 1648)
CALMON, Pedro – “História do Brasil”, volumes II e III (Livraria José Olympio
                      Editora, 4ª edição, Rio de Janeiro, 1981); “História do Brasil na
                      Poesia do Povo” (Edições Bloch, nova edição aumentada, Rio de
                      Janeiro, 1973)
COSTA, Francisco Augusto Pereira da – “Folk-lore Pernambucano” (Imprensa
                      Nacional, Rio de Janeiro, 1908)
PIMENTEL, José – “A Batalha dos Guararapes” (peça teatral encenada no próprio
                      local da batalha, Pernambuco, 1984)
PINTO, Luís – “História da Vida do General André Vidal de Negreiros” (Editora
                      Minerva, Rio de Janeiro 1949)
SANTOS, Theobaldo Miranda – “Contos Cívicos do Brasil” (Companhia Editora
                      Nacional, 2ª edição, São Paulo, 1955)
SETÚBAL, Paulo – “O Príncipe de Nassau” (Companhia Editora Nacional,
                      5ª edição, São Paulo, 1938)
SIQUEIRA, Baptista – “Pentamodalismo Nordestino” (Escola Nacional de Música
                      da Universidade do Brasil, Rio de Janeiro, 1956)
SOUTHEY, Robert – “História do Brasil”, volume I (Editora Obelisco, 3ª edição
                      brasileira, São Paulo, 1938)
STEINER, Rudolf – “Almas Nacionales y su Misión; su relación com la mitologia
                      germano-nórdica” (traducción del alemán de Juan Berlin, Editorial
                      Antroposófica, 1ª edición, México, 1983)
VARNHAGEN, Francisco Adolfo de – “História Geral do Brasil”, tomos II e III
                      (Edições Melhoramentos, 7ª edição integral, 1962); “História das
                      Lutas com os Holandeses no Brasil” (Tipografia de Castro Irmão,
                      Lisboa, 1872)
VIANNA, Hélio – “História do Brasil”, volume I (Edições Melhoramentos, 10ª
                      edição, Edição Comemorativa do Sesquicentenário da
                      Independência, 1972)

 

Sobre a escolha da peça

Para escolher uma peça com objetivo pedagógico, estude bem que tipo de vivência seria mais importante para fortalecer o amadurecimento de seus alunos. Será um drama ou uma comédia, por exemplo. No caso de um musical, é importante que a classe seja musical, que a maioria dos alunos toquem instrumentos e/ou cantem. Analise também o número de personagens da peça para ver se é adequado ao número de alunos.

Enviamos o texto completo em PDF de uma peça gratuitamente, para escolas Waldorf e escolas públicas, assim como as respectivas partituras musicais, se houver. Acima disso, cobramos uma colaboração de R$ 50,00 por peça. Para outras instituições condições a combinar.

A escola deve solicitar pelo email [email protected], informando o nome da instituição, endereço completo, dados para contato e nome do responsável pelo trabalho.

 

 

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