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Cláudio Monteverdi
Versão para peça de teatro – adaptação de Ruth Salles
Claudio Monteverdi, considerado o maior compositor italiano de sua época e grande operista, nasceu em Cremona, em 1567, e faleceu em Veneza, em 1643. “Orfeu”, uma das primeiras óperas criadas no mundo, foi representada pela primeira vez em Mântua, em 1607. Ignora-se o autor do libreto, mas ele é atribuído a Rinuccini.
Graças à tradução literal do italiano, feita por Mechthild Vargas (Meca), professora de música, recriei o libreto da ópera em português para o 8º ano de 1993 da professora Ana Flora Nascimento Amado. Por escolha das duas professoras, alguns trechos foram apenas falados.
Agora, em 2020, a professora Almut Lenk pediu para transformar a ópera em peça, completando a história do mito, pois na ópera não consta o mito todo. Com isso, foram criados mais alguns personagens. Só no Prólogo os versos são em hexâmetros, como eram usados pelos gregos. Mesmo com a mudança da ópera em peça, incluí uma ou outra parte cantada. Aí vai essa tentativa de transformação.
PERSONAGENS
Apolo Calíope
Orfeu Eurídice
Hades Perséfone
Caronte Música
Pastor Aristeu Ninfa Silvia
Pastor Alceu Ninfa Cibele
Pastor Pérsio Ninfa Ana
Eco Três Mênades
Cérbero (cão) Três Musas
Esperança
Himeneu Conversa Fútil
Fiel Dúvida
Sábio-segundo-o-Mundo Espírito-das-Sombras
Deméter
PRÓLOGO
(Deméter, Perséfone; Caronte, cão Cérbero com cabeças de serpentes.)
CARONTE:
– Salve, Deméter, mãe-terra, trago-te a filha Perséfone.
Zeus permitiu que ela passe algum tempo no reino da Luz.
Sou o barqueiro Caronte. Levo as almas dos mortos
lá para o reino das Sombras, onde governa o deus Hades.
PERSÉFONE (correndo para a mãe): – Mãe!!
DEMÉTER:
– Filha, por que tu não podes ficar junto a mim para sempre?
PERSÉFONE:
– Eu tinha fome, e o rei Hades me deu a romã, e eu comi.
Só seis sementes, mas isso me fez prisioneira das Sombras.
Mãe, por seis meses sou tua, seis meses rainha de Hades!
DEMÉTER: – Foge, Perséfone!
CARONTE:
– Ela não pode. O cão Cérbero, com suas várias cabeças
de venenosas serpentes, destroça quem tenta fugir.
(O cão Cérbero aparece e ameaça rugindo.)
CARONTE (para Cérbero):
– Aquieta-te! A filha e a mãe obedecem à lei!
DEMÉTER:
– Então…
só por seis meses eu cuido da terra, e tudo floresce.
Sem minha filha, a terra abandono e tudo fenece.
CENA I
(Música e coro; Orfeu; Apolo, Calíope.
Ao alto, no centro, estão os tronos com Apolo e Calíope. Na frente, a Música e seu coro entram e cantam.)
MÚSICA (canta com coro):
“Sou a Música, o Som, com suave ardor
farei tranquilo o coração fremente.
E, ou de nobre ira ou de amor,
posso inflamar a mais gelada mente.
Conto a história de Orfeu, pois bem merece.
As feras vêm se seu cantar ressona.
As sombras sempre atendem suas preces,
glória imortal de Pindo e Elicona.”
(A Música e seu coro saem durante o ritornello. Entra Orfeu e se dirige aos deuses em seus tronos.)
ORFEU:
– Ó, pai Apolo, ó minha mãe Calíope,
ninfa de doce voz, vós me chamastes?
CALÍOPE:
– Sim, Orfeu!
APOLO:
– Orfeu, vem receber a minha herança. (dá-lhe a lira)
É esta lira de ouro. O som de suas cordas
faz a alma subir às regiões celestes.
Os arbustos se curvam e balançam,
e as feras mais selvagens
sofrem sua magia e ficam mansas.
ORFEU:
– Como é linda! E como estou contente!
Agradeço a meus pais este presente!
(Orfeu vai saindo enquanto toca.)
………………………………………………………………
(*) – montanhas da Grécia antiga.
CENA II
(Campo.
Orfeu; pastores Pérsio e Alceu; ninfas Cibele e Ana; Eurídice; ninfa Silvia; Himeneu; arvores e feras.)
PASTOR PÉRSIO:
– Olha, Alceu! Olha, pastor!
Vê o que acontece quando Orfeu
canta e toca a lira tão feliz!
(Surgem feras que se arrastam e árvores que se agitam e se aproximam para ouvir Orfeu.)
PASTOR ALCEU:
– É mesmo, Pérsio, e o som daquela lira!
Tocar a lira é o que ele sempre quis.
PASTOR PÉRSIO:
– Mudou-se em alegria a sua grande dor.
Pois finalmente Eurídice ele conquistou.
Dois corações unidos por amor.
NINFA CIBELE:
– Chamemos Himeneu, o seu irmão,
o deus do casamento,
a fim de consagrar sua união!
NINFA ANA:
– Tens razão, ninfa Cibele, é bom chamá-lo,
antes que chegue aquele mau pastor,
Aristeu, que se apaixonou também
pela beleza de Eurídice. Chama-o, Cibele!
NINFA CIBELE:
– Espera, Ana.
Estou ouvindo os dois se declararem.
ORFEU:
– Foi bem feliz o dia,
meu bem, em que nos vimos,
e mais feliz a hora em que por ti suspirei,
porque também por mim tu suspiraste.
Se eu tivesse tantos corações
quantas estrelas há no céu,
todos veriam o brilho deste amor!
EURÍDICE:
– És minha alegria, Orfeu!
Meu coração foi dado a ti.
Ah, ninguém consegue
ver a grandeza deste meu amor!
ANA:
– Vem, Himeneu, vem num momento,
abençoar tão rico sentimento!
CIBELE:
– Vem Silvia, vem se unir a nós no casamento!
(Entra a ninfa Silvia, e o velho Himeneu vem e abençoa os dois ajoelhados.)
HIMENEU:
– Que as bênçãos dos deuses vos protejam! Levantai-vos, irmãos!
(Neste momento, as ninfas, junto com Eurídice, podem dançar enquanto os dois pastores, e mais três, que podem ser Himeneu, Apolo e o próprio Orfeu, cantam com coro. Depois haverá um ritornello.)
“Deixai os montes, deixai as fontes,
ninfas alegres, graciosas.
E neste prado, no costumeiro baile,
os vossos belos pés fazei dançar.
O sol alcança as vossas danças,
que são mais belas que aquelas
que, na noite ao luar,
estrelas no céu estão a dançar.”
CENA III
(Ninfas Cibele, Silvia e Ana; Eurídice, Aristeu; Orfeu; Pastores Pérsio e Alceu.
Numa parte do campo, as ninfas conversam.)
CIBELE:
– Eu bem que gostaria de conquistar Orfeu…
SILVIA:
– Mas não adianta nem pensares nisso.
Pois Orfeu ama Eurídice.
CIBELE:
– Então ela que fuja
do pastor Aristeu que vive atrás dela.
ANA:
– Lá vem ela correndo!
e vem fugindo dele, com certeza!
CIBELE:
– Vamos embora, Silvia.
Não sejamos indiscretas!
SILVIA:
– Não, eu fico. (as outras saem.)
EURÍDICE:
– Afasta-te, Aristeu!
ARISTEU:
– Hás de ser minha!
EURÍDICE:
– Jamais, Aristeu.
Eu amo Orfeu.
ARISTEU:
– Aquele semi-deus que vive só cantando,
e sempre toca as cordas de uma lira?
Ah, ele não tem a mesma força que eu,
o pastor Aristeu!
Pois vou vencê-lo pela força, Eurídice!
E hei de conquistar tua beleza!
EURÍDICE:
– Para mim, tua força é sem valor.
Mais forte, para mim, é o dom do amor!
ARISTEU:
– Jamais contes com isso.
Ninguém me vai vencer. Tenho certeza!
Só eu vou merecer tua beleza!
EURÍDICE:
– Beleza nada vale. O tempo leva.
É outono quando acaba o verão.
O que vale é o amor do coração.
ARISTEU:
– Para mim, tanto faz tal sentimento!
Eu aproveitarei o bom momento.
EURÍDICE:
– Deuses, valei-me!
Ninfas, socorrei-me!
– Silvia, minha força se acabou! (cai no chão)
Ai! Uma serpente me picou!
(Aristeu foge. As outras ninfas voltam, e todas cercam Eurídice.)
EURÍDICE (morrendo): – Orfeu… Orfeu…
(Orfeu entra pelo outro lado cantando e tocando a lira, distraído. Os pastores entram com ele. As ninfas, menos Silvia, carregam Eurídice para fora da cena.)
ORFEU (canta):
“Eu a vós estou voltando,
cara selva, campo amado.
Eis o sol aqui brilhando,
fui por ele iluminado.
Eu a vós estou voltando,
eu a vós estou voltando.”
“Só por ti, ó minha amada,
só por ti, ó minha amada,
eu bendigo meu tormento
e alegre me contento
com a sorte afortunada.
Só por ti, ó minha amada,
só por ti, ó minha amada.”
SILVIA:
– Ai, justo quando Orfeu canta,
devo fazer cessar seu belo canto,
pois o que vou dizer só traz o pranto.
PASTOR PÉRSIO:
– Orfeu, vem vindo Silvia,
companheira fiel de tua amada.
Mas vejo sofrimento no seu rosto!
Ó deuses, ajudai-nos!
ORFEU:
– De onde vens, Silvia?
Que tens para dizer-me?
SILVIA:
– Orfeu, cessa teu canto.
Hoje nossa alegria em dor se torna.
Eu venho a ti com tal tristeza…
Trago a mensagem de algo tão funesto…
Pois tua amada Eurídice está morta!
ORFEU: – Ó céus!
Mas, Silvia, o que foi que aconteceu?
SILVIA:
– Uma serpente veio de repente,
picou seu pé com venenoso dente.
Eurídice caiu e, enquanto ia morrendo
nos meus braços, chamou: “Orfeu, Orfeu!”
ORFEU (exclama e depois se ajoelha no chão e esconde a cabeça com as mãos):
– Eurídice!
PASTOR PÉRSIO:
– Com a amarga notícia, o pobre Orfeu,
sofrendo tanto já não tem mais pranto!
Triste filho de Apolo e de Calíope…
Que fará ele agora sem Eurídice?
PASTOR ALCEU:
– Vamos todos sair!
Respeitemos seu grande sofrimento!
(Pastores e ninfas saem.)
ORFEU:
– Tu estás morta, Eurídice, e eu respiro?
Não mais me voltarás e aqui eu fico?
Não! Não!
Eu descerei ao mais profundo abismo
e hei de comover o rei das Sombras
e te trarei de volta, ó minha amada!
Se o destino cruel não permitir,
ficarei junto a ti no lar da Morte.
Adeus, terra! Adeus céu e sol! Adeus!
(Orfeu sai tocando a lira.)
CENA IV
(Orfeu; Esperança; Caronte.
Próximo ao rio Estige, onde vai aos poucos aparecendo Caronte com a barca, levando as almas para o Hades.
Orfeu segue tocando, caminhando ao lado da deusa Esperança.)
ORFEU:
– Vais me levando, ó deusa Esperança,
único bem dos aflitos mortais.
Já chegamos perto
desse soturno e tenebroso reino
onde raios de sol jamais rebrilham.
ESPERANÇA:
– Eis a margem sombria, eis o barqueiro
que leva as almas para o outro lado.
É lá que impera Hades sobre as Sombras.
Sê corajoso e canta belo canto,
pois eu aqui te deixo;
não posso ir mais além. Amarga lei proíbe.
Lei escrita com ferro em dura pedra.
É esta a sua frase:
“Deixai toda esperança, ó vós que entrais.”
ORFEU:
– Onde te vais,
tu que me deste teu doce conforto?
Ai, como ter confiança,
se foges tu, dulcíssima Esperança?
(Esperança sai, e Caronte se aproxima com o barco.)
CARONTE:
– Oh, tu não vês a morte neste espaço?
Temerário! Não venhas! Cessa o passo!
Nestas ondas nenhum mortal eu tive,
nem junto à morte pode estar quem vive.
Refreia teu amor, pois neste barco
eu não recebo mais corpóreo peso!
ORFEU:
– Ó divindade austera,
não vivo mais. Morreu a esposa amada.
Meu coração não mais está comigo.
Sem coração, a vida é negada.
Eu sou Orfeu.
Das trevas sei que Eurídice me chama.
Ó deus, só tu me podes dar auxílio.
Se aqui a minha lira de ouro ouviste,
nela acordes suaves só dedilho.
Ao seu som a alma dura em vão resiste.
CARONTE:
– Bem que me agrada um tanto,
consternado cantor,
o teu pranto, o teu canto.
(Orfeu continua tocando até Caronte dormir. Então ele entra no barco, e o barco segue.)
ORFEU:
– Dormiu. Não foi em vão o meu esforço.
Valeu tentar. É como a flor do Tempo.
Esperamos a hora de colhê-la.
Já vejo ao longe Hades e seu triste aviso!
“Deixai toda esperança, ó vós que entrais!”
CENA V
(Perséfone, Hades; Espírito das Sombras.
Reino das Sombras. Vê-se o deus Hades e sua esposa Perséfone em seus tronos.)
PERSÉFONE:
– Senhor, este infeliz,
pelos campos da morte vem andando,
sempre chamando Eurídice.
Ele desperta em mim tanta piedade…
Eu volto a te implorar mais uma vez
que tenhas pena e atendas suas preces.
Faz com que Eurídice volte aos belos dias,
que eram festejados com encanto,
e do mísero Orfeu consola o pranto.
HADES:
– Perséfone, és tão boa e bela
que não te vou negar o que me imploras.
Voltará para Orfeu a bela Eurídice.
Ela irá atrás dele. E ele, à frente.
Mas, antes que ele saia deste abismo,
não poderá
voltar atrás os olhos para vê-la!
É bastante um olhar,
e esta causa se perde para sempre!
ESPÍRITO DAS SOMBRAS (bem diáfana, apesar da veste escura):
– Orfeu trará Eurídice das Sombras,
se souber dominar seu sentimento.
se a ele não vier o esquecimento.
PERSÉFONE:
– Ah, és tão generoso, meu senhor!
Seja bem-vindo o dia em que me viste
e aqui cheguei presa por teu encanto;
fui tão feliz contigo… Eu te amei,
mesmo perdendo a luz do sol brilhante.
HADES:
– Tua boa palavra e teu respeito,
Perséfone, refrescam o meu peito.
CENA VI
(Eurídice, Orfeu; Sábio-segundo-o-mundo, Fiel, Conversa Fútil, Dúvida; Espírito das Sombras.
A volta de Orfeu e Eurídice. Ela vem andando bem atrás dele. Ele, aflito por não poder vê-la, é aos poucos cercado por tentações, representadas pelas personagens Sábio-segundo-o-Mundo, Fiel, Conversa-Fútil e Dúvida. O Espírito das Sombras os segue.)
ESPÍRITO DAS SOMBRAS:
– Piedade e amor triunfam!
Lá vai nosso cantor
que leva sua esposa para fora
desse Mundo das Sombras!
ORFEU:
– Eu, repleto de ventura,
verei de novo o vulto amado,
e no colo do meu amor descansarei deitado.
Enquanto isso,
em minha lira o toque mágico prossegue.
Eu toco, mas quem é que me assegura
que ela me segue?
SÁBIO-SEGUNDO-O-MUNDO:
– Sim, quem diz que ela te segue?
A exigência dos deuses é absurda.
Os olhos foram feitos para ver.
E nada tem de mais olhar e ver.
ORFEU:
– Quem és? Não te conheço.
SÁBIO-SEGUNDO-O-MUNDO:
– Sábio-segundo-o-mundo é o meu nome.
Sou dono da verdade.
Não tem valor
isso de obedecer absurdamente
à exigência dos deuses.
FIEL:
– Orfeu,
não ouças o conselho do Inimigo.
Eu sou Fiel. Sempre estarei contigo.
Sábio-segundo-o-mundo não conhece
a verdade de tudo que acontece
na exigência dos deuses.
Tem paciência e espera.
Logo terás Eurídice tão bela.
CONVERSA-FÚTIL (caminha animada meio que dançando e cheia de gestos encantadores):
– Olha-me, Orfeu, eu sou Conversa-fútil.
Tanto me faz ouvir ou não ouvir os deuses.
Não ligues para tanto.
mesmo fazendo o que não deves,
tu vencerás impondo o que pretendes.
É bom que te revoltes contra ordens,
ordens que nada valem.
ORFEU:
– Mas eu só quero ver se Eurídice me segue.
DÚVIDA:
– E quem sabe não tens esse direito?
Eu sou a Dúvida, Orfeu. Penso contigo.
Será que deves crer na ordem do deus Hades?
Será que ele te quer fazer feliz?
Ou ficar com Eurídice é o que ele sempre quis?
ORFEU:
– Ai de mim! Que maligno furor
quer roubar o meu bem? E eu consinto?
(aqui ele se volta e vê Eurídice)
Oh, dulcíssima luz, eu posso vê-la agora!
Mas que eclipse a esconde nesta hora?
(Orfeu diz isso porque um véu tinha sido jogado sobre Eurídice pelo Espírito das Sombras. Ela se volta e começa a caminhar de volta ao reino das Sombras.)
ESPÍRITO DAS SOMBRAS:
– Rompeste a lei, Orfeu, e te tornaste indigno.
EURÍDICE:
– Ai, olhar tão doce e tão amargo.
Assim, por tanto amor, tu me perdeste?
E eu, mísera, perdi todo o poder
de retornar à clara luz da vida,
também perdendo o mais precioso prêmio:
meu adorado esposo!
ORFEU:
– Aonde vais, querida? Ah, eu te sigo. (não consegue andar)
Algo me impede.
E eu não posso ir com ela!
Um poder me conduz contra a vontade
à triste claridade.
ESPÍRITO DAS SOMBRAS:
– Orfeu se rebelou e foi vencido
pelo seu próprio amor.
Digno de eterna glória
só pode ser quem sabe se vencer.
Essa é a vitória!
CENA VII
(Orfeu; Eco; Apolo, Calíope; três Mênades.
Bosque da Trácia. Orfeu segue tocando, e o Eco do bosque repete sempre o fim de suas frases. Depois surgem Apolo e Calíope. Em seguida, as Mênades, cada uma com um dardo e um tambor.)
ORFEU:
– Já não espero recuperar rogando,
chorando e suspirando,
o amor que eu venero.
Mas peço a ti, bosque suave,
conforto a meu terrível sofrimento,
pois acho que percebes minha dor,
meu pranto…
ECO:
– Tanto…
ORFEU:
– Cortês Eco amoroso,
tens tanto sentimento
e queres consolar meu sofrimento…
ECO:
– Tento…
ORFEU:
– Embora estes dois olhos
de tanto pranto formem duas fontes,
jorrando um mar de lágrimas,
nem mesmo assim a minha dor se esvai…
ECO:
– Ai!…
ORFEU:
– Ah, é terrível minha desventura!
Nem sei se o som da lira ainda ressoa.
ECO:
– Soa!…
ORFEU:
– Só o som do meu pranto não se afasta!
ECO:
– Basta!…
ORFEU:
– E à minha dor o coração se aferra!
ECO:
– Erra!…
ORFEU:
– E à bondade dos deuses
o meu ser não se achega…
ECO:
– Chega!
ORFEU:
– Mas, se chorando meu lamento,
só me respondes repetindo
sempre o fim do que eu digo,
tu me devolves todo o meu tormento.
Já nem sei o que faça doravante!
ECO:
– Avante!… (ele sai)
APOLO (entrando):
– Avante, filho! Avante!
Por que ao sofrimento tu te entregas?
Se pensas só nessa desgraça,
um maligno perigo te ameaça.
Cuidado!
As furiosas Mênades,
adoradoras de Dionísio, o deus,
virão matar-te. Toca tua lira!
(Orfeu toca. As Mênades chegam e tentam matá-lo com os dardos.)
MÊNADE 1:
– Oh, nossos dardos não o atingem!
MÊNADE 2:
– Caem ao chão por causa dessa lira!
MÊNADE 3:
– Abafemos seu som!
(As Mênades gritam e tocam tambores. Depois atingem Orfeu com seus dardos, matando-o.)
ORFEU (morrendo):
– Eurídice! Eurídice!
(Apolo vem com Calíope e faz um gesto.)
APOLO:
– Funestas Mênades!
Quem vos mandou fazer tal crueldade?
Eu vos transformo agora, por castigo,
em carvalhos bem duros
e bem presos à terra!
CALÍOPE:
– Sereis açoitadas por furiosos ventos
e nunca podereis fugir
de tão merecidos sofrimentos!
(As Mênades se tornam paralisadas no solo.)
MÊNADE 1:
– Ai, os ventos! (elas balançam)
MÊNADE 2:
– Ai! Nossos pés tornaram-se raízes
e se prendem profundamente ao solo. (balançam)
MÊNADE 3:
– Ai! Não podemos mais sair daqui
e agir como queremos! (balançam)
CENA VIII
(Apolo, Calíope; Orfeu; três Musas; Eurídice; Coro.
Orfeu é ajudado pelas Musas, é levado ao Monte Olimpo e encontra Eurídice.)
APOLO (ergue Orfeu):
– Meu filho, por que é que não reages,
à dor e ao sofrimento?
O bem, o bem renegas
se, com teu sentimento,
só ouves teu tormento.
ORFEU:
– Pai generoso, na hora certa chegas;
Eu estarei atento aos bons conselhos
que tu trazes contigo,
ó pai, celeste amigo.
APOLO:
– Muito, muito fruíste
de uma alegre ventura;
hoje lamentas
a sorte amarga e dura.
Então não sabes
que o bem deste mundo não perdura?
CALÍOPE:
– Se tu queres, Orfeu, eterna vida,
tu a terás no céu, que te convida.
ORFEU:
– E nunca mais verei
de Eurídice os olhos que eu amei?
CALÍOPE:
– No céu e nas estrelas
tu poderás revê-la.
ORFEU:
– Diante de vós, amados pais,
dobrarei meu joelho;
como bom filho,
sigo vosso conselho.
APOLO (a Calíope e depois a Orfeu):
– Vamos deixá-lo agora.
– As musas cuidarão de ti, Orfeu.
(Apolo e Calíope voltam a seus tronos. Chegam as Musas e cuidam de Orfeu.)
MUSA 1:
– Orfeu,
ouves o rouxinol cantando em tua honra?
MUSA 2:
– Orfeu,
vamos agora para o Monte Olimpo.
(Elas o vão levando para o alto, onde estão Apolo e Calíope, e surge Eurídice.)
MUSA 3:
– Olha, aí está tua querida Eurídice
no submundo das almas te esperando.
(Orfeu e Eurídice se reencontram e ficam de mãos dadas.)
APOLO:
– Apolo e Eurídice
vão viver seu amor
junto aos deuses do Olimpo
por toda a eternidade.
(A peça termina com o coro de todos – se possível num quinteto.)
CORO (cantado):
“Vai, Orfeu, com alegria,
vai fruir celeste glória,
num lugar sem agonia,
onde o mal não tem vitória.
E no altar, porque mereces,
sobe aos deuses nossa prece.
Assim faz quem não demora
em seguir o deus eterno.
E nos céus a graça implora
quem aqui provou o inferno.
Quem semeia em sofrimento
colhe o bem em pouco tempo.”
F I M
Sobre a escolha e o envio da peça
Para escolher uma peça com objetivo pedagógico, estude bem que tipo de vivência seria mais importante para fortalecer o amadurecimento de seus alunos. Será um drama ou uma comédia, por exemplo. No caso de um musical, é importante que a classe seja musical, que a maioria dos alunos toquem instrumentos e/ou cantem. Analise também o número de personagens da peça para ver se é adequado ao número de alunos.
Enviamos o texto completo em PDF de uma peça gratuitamente, para escolas Waldorf e escolas públicas, assim como as respectivas partituras musicais, se houver. Acima disso, cobramos uma colaboração de R$ 50,00 por peça. Para outras instituições condições a combinar.
A escola deve solicitar pelo email [email protected], informando o nome da instituição, endereço completo, dados para contato e nome do responsável pelo trabalho.
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