23 de novembro de 2017

Sobre a oração do Pai Nosso

 

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De fontes várias, inclusive de mim mesma.

por Ruth Salles

Desde muito jovem, imaginei o que chamamos Deus como um ponto central no espaço que, em dado momento, se expandiu doando-se a si mesmo e gerando o universo na periferia de uma imensa esfera, como se esse universo fosse o reflexo, o espelho desse Ser criador. Anos depois li, num livrinho para leigos sobre Einstein, que o universo está na periferia de uma espécie de esfera, e que ele está em expansão e depois deverá haver uma retração. Ora, isso é o mesmo que dizem os hindus a respeito de Brahma: que o universo é a sua respiração; que ele expira e depois inspira o universo. Daí, fiquei muito contente, achando que Einstein, os hindus e eu estávamos de acordo! Que jovenzinha metida eu era!

Bem mais tarde aprendi, de Rudolf Steiner, que, quando o Princípio Criador (que, por ser criador, chamamos de PAI) alcança o momento em que, por sua Vontade, é capaz de se doar a si mesmo, expande-se criando o universo. Assim, até os mais ínfimos seres e coisas surgidos dessa maneira são emanações da própria Divindade, como a chamamos. E que o aspecto da criação que chamamos de FILHO é o responsável pela organização do universo, e que, espiritualmente, essa ação do Filho é chamada também de REINO. Por fim, o terceiro aspecto dessa criação é a identificação, ou individualização de cada ser ou coisa pelo ESPÍRITO SANTIFICADOR ou SANTO, pois cada ser ou coisa criada deve atingir sempre a harmonia, deve ser sempre tornado são (que tanto quer dizer santo, quando sadio, curado de qualquer desarmonia). E então cada ser ou coisa recebe um NOME, que deve estar sempre dentro da harmonia universal. Por isso, os três aspectos do Espírito Criador são: do Pai, a Vontade; do Filho, o Reino; do Espírito Santo, o Nome.

Jesus Cristo ensinou a oração essencial aos apóstolos, com palavras simples, porque eles eram homens simples, a maioria pescadores, que também ouviam as palavras de seu mestre por meio de parábolas, para que pudessem entender o significado profundo dos ensinamentos.

O PAI NOSSO consta, na verdade, de sete orações:
“Pai Nosso, que estais nos céus,
Santificado seja o vosso Nome.
Venha a nós o vosso Reino.
Seja feita a vossa Vontade, assim na terra como no céu.
O Pão nosso de cada dia nos dai hoje.
Perdoai as nossas Dívidas assim como nós perdoamos nossos devedores.
Não nos deixeis cair em Tentação,
mas livrai-nos do Mal.
Amém.

Mas, vejam vocês, para os hindus, o homem é formado justamente de sete corpos: o corpo físico de nossa estrutura mineral, o corpo de nosso organismo vegetal, que eles chamam de corpo ilusório onde circula o prana (a energia da vida), o corpo que temos em comum com os animais, que eles chamam de corpo ilusório de desejos, e o corpo de nossa mente pensante e autoconsciente, nosso eu. Os hindus chamam de corpo ilusório porque sabem que são realmente campos de força de várias naturezas ou graus de evolução. Esses quatro corpos compõem o que alcançamos até hoje, e se chama o Quaternário inferior.

Resta a Tríade superior, que eles chamam de Manas, Budhi e Atma, que serão transformações dos corpos mineral, (também chamado corpo físico), vegetal (também chamado corpo vital) e animal (também chamado corpo anímico).

Se todo o universo é uma emanação da Causa Primeira, nós também somos e trazemos em nós uma perfeição primordial, em termos de Bondade e Amor. Houve um monge cristão que disse que cada um de nós é como que uma nota, um som, emanado da Divindade, e que nossa tentativa maior deve constar de sermos esse som. Mas o caso é que desafinamos um bocado… Lembro-me logo do cachorrinho de minha tia Olga: ele ficava de bruços no chão do quintal, tomando conta da galinha com seus pintinhos; se um pintinho se afastava muito da galinha, o cachorrinho ia lá e lhe dava umas patadinhas para ele voltar para junto dela. Ai, ai, é isso que nos faz o destino: quando desafinamos de nossa nota individual, ele nos dá umas patadinhas, às vezes bem doloridas, para retornarmos à harmonia de nosso som.

Mas, voltemos a nossos corpos que, segundo os hindus, formam nossa tríade superior, Manas, Budhi e Atma. Atma é o mais elevado deles, e acho interessante saber que, em alemão, atmen quer dizer respirar. E descemos à terra para vivermos uma evolução até o Atma, assim como se fôssemos jogados numa piscina funda sem saber nadar. Espertinhos que somos, batemos com os pés lá no fundo dando um impulso para voltarmos à superfície e… respiramos (atmen) enfim o AR que é nossa vida, nossa verdade maior.

Mas é a tríade superior, que está dentro de nós, mas que ainda não chegamos a alcançar, é ela que se dirige primeiro aos três aspectos da Divindade na Oração do Pai Nosso. É importante não desafinar e dar um bom impulso com os pés no fundo da piscina, pois é só vivendo bem vivido o quaternário inferior que chegamos à tríade superior!

Dizemos, primeiro, “Pai Nosso”, porque a Causa Inicial forma um Todo com o universo, e tanto o universo é nosso como somos do universo, tudo está interligado. E dizemos “que estais no céu”, porque essa Causa Inicial está em situação de harmonia perfeita, que é o que significa essa expressão “céu”. Em seguida começamos. Nosso Manas, se dirige ao terceiro aspecto da Divindade dizendo “Santificado seja o vosso Nome”, porque no fundo desse Manas, primeira transformação que teremos de alcançar, desejamos que tudo o que existe, e que foi identificado individualmente por um Nome, seja santificado, sanado, curado de qualquer desvio da harmonia pelo Espírito santificador ou Santo. Depois, nosso Budhi se dirige ao segundo aspecto da Divindade, o Filho, também chamado Verbo por representar a ação que resultou no universo. Dizemos “Venha a nós o vosso Reino”, porque a ação super-harmônica que resultou no universo, no Reino, precisamos descobri-la dentro de nós também, porque toda essa harmonia, toda essa paz está no fundo de nosso Budhi, nossa segunda transformação a ser alcançada. Não foi à toa que Jesus Cristo disse “O reino de Deus está dentro de vós.” Em seguida, nosso Atma se dirige ao primeiro aspecto da Trindade Divina dizendo “Seja feita a vossa Vontade assim na terra como no céu”, porque nosso Atma sabe que o mais alto grau a ser alcançado é a Reta Vontade, aliás um dos passos da senda óctupla do Buda. Fala-se muito do livre arbítrio, mas até hoje só conseguimos ter, não uma vontade livre de apegos, mas um desejo apegado a opiniões e ambições relativas ao nosso dia a dia. E pedimos que essa harmoniosa vontade do Altíssimo seja feita na terra assim como é realizada no céu.

Enquanto procuro explicar isso, desejo “que todos os Nomes sejam sanados”, “que venhamos a descobrir em nós o Reino” e que possamos subir o degrau mais alto de nós mesmos “agindo com a Reta Vontade”.

Aguardando a noite das bênçãos que nos vêm do nascimento de Jesus Menino, pensemos nisso principalmente, para que a agitação natural da vida moderna nãos nos afete.

Nossa tríade superior se dirige à Trindade divina sempre “de baixo para cima”: O Manas, primeiro degrau a subir, se dirige ao terceiro aspecto do Ser criador; Budhi, segundo degrau, se dirige ao segundo aspecto desse Ser; Atma, o mais alto degrau, se dirige ao primeiro aspecto.

Nosso quaternário inferior também se dirige sempre de baixo para cima, porém ao Todo do Ser criador. Assim o corpo físico, mineral (tão mineral que, ao morrermos, endurece, volta ao estado de pedra) pede: “O pão nosso de cada dia nos dai hoje.” Pois sempre há uma troca em nosso físico, as substâncias se trocam de dez em dez anos, pelo menos, há necessidade dos impulsos do movimento atômico universal para isso, e esse é o alimento que pedimos simbolizado pelo pão. Já o corpo vegetal, energia vital que perpassa o corpo físico, pede: “Perdoai as nossas dívidas”, pois quando falhamos em nosso amor para com o próximo, ficamos devendo nossa harmonia a ele, e pedimos que o Ser maior nos perdoe. Ora, per-doar significa para-doar-se. Ah, que o Altíssimo se doe um pouco a nós e nos ajude no restabelecimento de nossa harmonia para com o próximo! Quando falhamos nisso, também ferimos nosso próprio corpo vital. É como se o amassássemos um pouco com um dedo, e esses amassados escoam para o corpo físico e geram doenças. Mas pedimos “assim como nós perdoamos aos nossos devedores”, quer dizer “desde que perdoemos nossos devedores”. Pois se nos doamos ao próximo trocando ofensa por compreensão, desarmamos nosso devedor e contribuímos para que o próximo não entre mais em dívidas conosco. Quanto ao nosso corpo anímico (ou astral, como é chamado), ele é sujeito a impulsos e arrebatamentos, e é ele que influi em nosso corpo mental, para que a mente decida a realização de algo que se possa chamar de mal. Por isso, nosso corpo anímico pede “Não nos deixeis cair em tentação”, as tentações dos arrebatamentos às vezes bem nocivos; e o corpo mental completa: “mas livrai-nos do mal.”

Queridos, a todos desejo um Feliz Natal interior, e que possamos nascer de novo a cada dia, ilesos das influências nocivas que possamos causar a nós mesmos e aos outros.

 

 

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