La Pedagogía Waldorf
en la escuela publica
historia – desafíos – perspectivas
de Rubens Salles y Rosineia Fonseca
Camanducaia MG
Estivemos em Camanducaia visitando a Escola Araucária duas vezes nas exposições pedagógicas anuais, em 2017 e 2018. Nestas ocasiões conversamos com vários professores sobre a escola e gravamos apresentações das exposições pedagógicas, que são muito lindas e estão disponíveis no nosso site, neste Enlace.
Não foram gravadas entrevistas especificamente para esta pesquisa, pois não houve disponibilidade da equipe da escola na época de sua realização. As informações publicadas abaixo são fruto de nossas observações, vídeos institucionais, pesquisas, conversas com Rebecca Wagner Ciscato, que é membro da Associação Pedagógica Bom Jardim, e um relato histórico escrito por Evelyne Ruth Loewens. Estamos disponibilizando também dois vídeos produzidos pela escola, onde há um depoimento de seu fundador, Sr. Humbertus Adolf Loewens (in memoriam), de alguns professores, ex-alunos, pais e com algumas imagens das atividades com os alunos.
Destacar
A Escola Municipal Araucária tem algumas características bem especiais, que a diferem das outras escolas Waldorf conveniadas com prefeituras que visitamos.
1 – A Associação Pedagógica Bom Jardim, mantenedora da escola, tem conseguido arrecadar recursos para construir e conservar uma linda escola, que nada fica a dever para as escolas Waldorf mais bem estruturadas de que dispomos, consegue prover a escola com os materiais que a prefeitura não fornece e tem conseguido complementar os salários dos seus professores, que são todos formados na Pedagogia Waldorf.
2 – Por ser uma escola municipal rural e a única num raio de 23 quilômetros, com ensino do jardim de infância até o 9° ano do fundamental, é muito importante para a prefeitura manter o convênio, pois caso contrário, não haveria outra escola pública para atender àquela população.
3 – Como 9 de seus 14 professores são da própria comunidade, e todos já tem formação em Pedagogia Waldorf, há muito pouca rotação de professores.
4 – Atuando na região há mais de 40 anos influenciou diretamente a cultura na região, pois praticamente todos dali com menos de 50 anos foram seus alunos. Assim, hoje quase não sofre com o estranhamento sobre a pedagogia, que ocorre em outras escolas conveniadas, quando os pais matriculam seus filhos por morarem perto da escola, mas sem conhecer nada sobre a pedagogia Waldorf. Pelo contrário, há várias famílias que se mudaram para a região por causa da escola.
5 – A Escola Araucária, por ser a única na região, é um ótimo exemplo de como uma escola bem estruturada e com uma pedagogia humanizada, emancipadora e focada no desenvolvimento integral do ser humano, tem o poder de transformar uma comunidade nos aspectos culturais, sociais e econômicos.
Alguns dados sobre o município
Endereço – Bairro Bom Jardim – Camanducaia MG
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A Escola Municipal Araucária atende atualmente 160 alunos do jardim de infância ao 9º ano do ensino fundamental. A equipe atual do corpo docente é formada por 14 professores, todos com formação em pedagogia Waldorf. Destes, nove são da comunidade, três migraram de outras cidades e um é membro da família fundadora da Escola.
Sua história começou com o casal Humbertus Adolf Loewens e Evelyne Ruth Loewens, que adquiriu uma propriedade rural em 1970, na região conhecida como bairro Bom Jardim, que fica a cerca de 23 quilômetros da sede do município de Camanducaia, por estrada de terra, no sul de Minas Gerais. Iniciou lá a construção de uma casa, e, quando foi fazer o primeiro pagamento aos empregados da obra, o Sr. Humbertus descobriu que ninguém sabia assinar o nome. Todos eram analfabetos, pois não havia nenhuma escola na região. Houve uma, a meio caminho da cidade, que era instalada em um barraco de pau-a-pique e havia fechado por falta de professor. Decidiu então propor ao município que poderia construir uma pequena escola, se o governo arcasse com o pagamento de uma professora.
O Sr. Humbertus empreendeu então uma peregrinação pelos meandros da administração pública mineira, para conseguir realizar o seu intento. Começou em 1971, conversando com a diretora do colégio de Camanducaia, que passou a questão para a Inspetoria de ensino em Cambuí, que passou a questão para a Delegacia de ensino em Itajubá, que passou a questão para a Secretaria Estadual de Educação em Belo Horizonte. Após inúmeras idas e vindas, em 07/08/1975, após já terem construído a escola, conseguiu uma autorização para a escola funcionar mas não conseguiu a contratação da professora pelo estado. Essa incrível história de perseverança é contada por ele com detalhes no vídeo abaixo.
Sr. Humbertus então propôs aos amigos, todos de São Paulo, criar uma associação e levantar recursos para poderem pagar uma professora, e foi criada a Associação Educacional Bom Jardim. Na época foi conseguida uma doação do terreno onde a escola está até hoje, com um hectare, e que depois com outras doações e aquisições aumentou para onze hectares. A escola começou com cerca de 40 alunos, porque muitos adultos na região quiseram estudar também. Ser uma escola Waldorf era um sonho distante, mas estava nos planos desde o início, tanto que nos estatutos da associação já constava que, caso a associação fosse extinta, seu patrimônio passaria para a Escola Waldorf Rudolf Steiner, de São Paulo.
Após alguns anos a escola passou a ser conveniada com a prefeitura de Camanducaia, e desde então os professores passaram a ser remunerados pela prefeitura, com contratos temporários que são renovados anualmente. Esse formato também vimos em outras escolas conveniadas. Segue abaixo o edital publicado neste ano, onde está especificada a contratação de professores formados na Pedagogia Waldorf.
No entanto, durante os primeiros anos foi difícil manter uma professora para lecionar num local tão distante. No início dos anos 80, um grupo de pessoas ligadas à Pedagogia Waldorf começou a se reunir para apoiar a escola, a professora e as crianças, inclusive aos fins de semana, mas a grande mudança começou em 1988, conforme relata Evelyne Loewens:
Evelyne – Era difícil cativar uma professora que assumisse efetivamente o trabalho na escola por um período letivo integral. Finalmente, em, 1988, Ursula Ropke, professora formada com curso superior em Física e pós-graduação em Astronomia resolveu assumir a Escola e mudou-se com sua família para a região. Desde então, a escola tem funcionado ininterruptamente, aumentando gradativamente seu número de alunos e professores. Com a chegada, em 1990, de Christiano Loewens, ex-professor de classe da Escola Waldorf Rudolf Steiner de São Paulo, a escola recebeu um impulso direcionado à pedagogia Waldorf, que tem sido implantada desde então. Em 1992, se juntou à escola Christa Ropke recém-formada pelo Seminário de Pedagogia Waldorf de Stuttgart. Agora, todos os professores participam regularmente de cursos de reciclagem e de seminários Waldorf. Sem grande alarde, portanto, foi acontecendo uma coisa naquela época inédita no Brasil: a Escola Araucária tornou-se a primeira escola pública com currículo Waldorf oficialmente aprovado pela Secretaria de Ensino.
A Associação Educacional Bom Jardim tem utilidade pública municipal e estadual, e faz um aporte mensal de cerca de R$ 40.000,00 ao orçamento da Escola, para a complementação de salários, a formação continuada dos professores e também a compra de material didático. Este investimento é fundamental para a continuidade do trabalho pedagógico Waldorf, pois os salários que a prefeitura paga aos professores são muito baixos, e, como em outros municípios, a prefeitura fornece apenas os mesmos materiais que fornece às demais escolas e que não atendem a todas as demandas desta pedagogia. A associação realiza campanhas para arrecadação de fundos e para a adoção de alunos. Você pode conhecer duas dessas campanhas nos links abaixo:
Adote um aluno da Escola Araucária – pdf
Na Escola Araucária os professores têm todas as condições para realizar a Pedagogia Waldorf de forma plena. Além da excelente estrutura das salas de aula, há um espaçoso refeitório com cozinha, sala para trabalhos manuais, marcenaria, padaria, biblioteca, secretaria e uma horta, além de três moradias para professores. Tudo foi construído com recursos angariados pela associação. Comparando com as grandes escolas comunitárias privadas, falta apenas um professor de Euritmia. Todos os demais aspectos e atividades inerentes à pedagogia são realizados, e suas festas, bazares e apresentações culturais são muito concorridas, transformando a escola no polo cultural do bairro.
De uma região onde a grande maioria era de analfabetos, e que quando as crianças iam à escola só cursavam até a quarta série, hoje, além do analfabetismo ser zero, saem jovens que já seguiram carreiras como Medicina, Direito, Enfermagem, Pedagogia, Artes Cênicas, Música, Arquitetura, Zootecnia, Agronomia, Administração, Turismo e Hotelaria entre outras profissões.
A vida comunitária no bairro gira em torno da escola. Evelyne considera que “um dos aspectos mais importantes, contudo, é que graças a tudo isto os jovens cessaram de migrar para as cidades, onde o triste destino de tantos era acabar nas favelas”. Já estão surgindo novas iniciativas por parte dos moradores, muitos deles ex-alunos da escola, que já não se contentam mais em continuar com a minguada agropecuária de subsistência praticada pelos pais.
Segundo Rebecca Ciscato, o surgimento da escola foi fundamental para o desenvolvimento socioeconômico na região. Com ela surgiram em seu entorno pousadas, comércios, atividades culturais e esportivas que até hoje não existem em outros bairros rurais do município. Pode se reconhecer seu o impacto de diversas formas: na escolaridade da comunidade, na sua empregabilidade, nas condições de moradia e na sua atuação comunitária e política.