27 de marzo de 2018

cuento de navidad

 

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conto de Charles Dickens

Adaptação para teatro de Ruth Salles

LOS GRADOS

Esta peça baseia-se no conto homônimo do célebre escritor inglês Charles Dickens (1812-1870), que influenciou profundamente sua época lutando pelo humanitarismo e contra a indiferença e a crueldade do comercialismo e do sistema industrial, chamando a atenção para o indivíduo em si. Charles Dickens escreveu este Conto de Natal aos 28 anos de idade, entre um e outro capítulo de uma novela maior. Foi assim que ele criou vários contos natalinos pequenos, afirmando que sua finalidade principal era despertar pensamentos de amor e de perdão, de acordo com a época de Natal num país cristão. Quanto à peça, adaptei as cenas dividindo-as segundo os capítulos da história e, como se tratava de um trabalho para alunos de 14 a 15 anos de idade, aumentei o conto incluindo uma Introdução, que consta do canto de Natal dos cantores de rua. Esse canto justifica o título do conto, que é “A Christmas Carol”, sendo “carol”, na verdade, o canto feito de porta em porta nas noites de Natal daquele tempo na Europa. Procurei transmitir o melhor possível o estilo de Dickens nos trechos falados pelos narradores.

Como a história se passa na Inglaterra do século XIX, sugeri para a peça três canções inglesas antigas, a fim de que os alunos vivenciem o ambiente da Inglaterra na época: “Greensleeves” (do século XVI, mas usada desde o século XVII como canção de Natal), para ser tocada em mudanças de cena, e (ou) para ser tocada no início e cantada no fim da peça; “Deck the Halls” (alegre e antiquíssima canção de Natal do País de Gales), para ser cantada pelos cantores de rua; “God rest you merry” (canção de Natal do século XVI) para ser talvez cantada no fim da peça. Para as três adaptei letras em português. No entanto, deixo a questão da escolha das canções aos professores de música. Há também uma dança, no capítulo do Espírito do Natal Passado. Talvez fosse interessante uma dança da época.

 

CARACTERES

REAIS:
Narrador Principal (representa o autor; traz bengala e chapéu ou cartola)
Narradores
Scrooge (usa óculos na ponta do nariz quando está no escritório)
Sobrinho de Scrooge
Mulher do sobrinho
Cunhada
Namorado da cunhada
Empregadinha do sobrinho
Secretário de Scrooge
Mulher do Secretário
Marta, filha do Secretário
Pedro, filho do Secretário
Timmy, filho do Secretário (usa muletas)
Menino que canta na porta sozinho (faz parte dos Cantores de Rua)
Dois Senhores Caridosos
Menino que compra o peru (pode fazer parte dos cantores de rua)

SOMBRAS:
Fantasma de Marley
Espírito do Natal Passado
Espírito do Natal Futuro
Espírito do Natal Presente
Scrooge quando menino
Irmãzinha de Scrooge-menino
Dick
Amiga de Dick
Velho patrão de Scrooge-menino
Mulher do velho patrão
Cozinheiro do patrão
Copeira do patrão
Dois Comerciantes
Velho João
Duas Ladras
Moça
Rapaz
Ignorância
Miséria

 

INTRODUCCIÓN

Scrooge e seu Secretário; Cantores de rua, Narrador principal e Narradores (dependendo do número de alunos, os cantores podem ser a mulher do secretário, seus filhos Marta, Pedro, Timmy, e o menino que depois canta à porta de Scrooge; e os narradores podem ser a empregadinha do sobrinho, os dois comerciantes, o velho João, as duas ladras, a moça e o rapaz).

No centro da cena, um pouco para a esquerda, fica o escritório de Scrooge, com mesa e cadeira (sobre a mesa, o livrão de contas e a régua), e mais uma mesinha com banqueta para o secretário (sobre a mesinha, papel, tinteiro e pena). À direita, no fundo e no alto, é a casa de Scrooge, sua cama com dossel e cortinado, um cabide com o roupão e o gorro, os chinelos no chão e uma mesinha; sofá e lareira podem fazer parte do cenário pintado, ou ser imaginários. À esquerda, no fundo, também há um lugar alto, onde Scrooge irá subir com os Espíritos. Só está iluminado o proscênio. Scrooge e seu secretário estão sentados no escritório, porém imóveis.

Entram os Cantores, que podem vir pela plateia, se possível, cantando a primeira parte da canção. Um traz uma lanterna antiga fechada, outros trazem partituras onde leem a canção. Atraídos pelo canto, o Narrador principal e os Narradores chegam ao proscênio iluminado (o centro da cena está escuro) e cantam também a segunda parte da canção, todos voltados para a plateia, como se nessa direção estivessem as portas das casas. Narradores e cantores, se forem personagens de outras cenas, devem estar vestidos com as roupas com que vão aparecer depois.

 

CANTORES (cantam):
“O Natal já vem chegando: Fa-la-la-la-la-la-la-la-lá!
Para todos vou cantando: Fa-la-la-la-la-la-la-la-lá!
Abra a porta ou a janela: Fa-la-lá, fa-la-la-la-la-lá!
Vim cantar debaixo dela: Fa-la-la-la-la-la-la-la-lá!”

CANTORES e NARRADORES:
“Dê um pouco do seu pão: Fa-la-la-la-la-la-la-la-lá!
e com ele o coração: Fa-la-la-la-la-la-la-la-lá!
A estrela se acendeu: Fa-la-lá, fa-la-la-la-la-lá!
É porque Jesus nasceu: Fa-la-la-la-la-la-la-la-lá!”

(Os cantores saem. Os narradores se acomodam no proscênio, como se fossem ouvir ou tomar parte na narrativa.)

 

 

Cena do Capítulo 1
“O Fantasma de Marley”

 

Narrador principal, Narradores; Scrooge e seu secretário; o sobrinho de Scrooge; os dois senhores caridosos; o menino que canta na porta; o fantasma de Marley.

 

(O Narrador principal anda de um lado para o outro movimentando sua bengala e dirigindo-se ao público; os outros narradores aparteiam, ora dirigindo-se uns aos outros, ora ao narrador principal, ora ao público.)

 

NARRADOR PRINCIPAL: – Para começar,… Marley estava morto. Sobre isto não resta a menor dúvida. O registro de óbito fora assinado pelo clérigo, pelo escrivão e pelo agente funerário.

1º COMERCIANTE: – Scrooge também assinara, com sua assinatura tão digna de crédito na praça!

NARRADOR PRINCIPAL: – Marley estava morto. Mais morto que uma porta.

MENINO QUE CANTA NA PORTA: – Se bem que uma porta, que se mexe tanto com o vento, será que está bem morta?

1ª LADRA: – Sabe-se lá! … Quem vai saber?

NARRADOR PRINCIPAL: – Mas enfim… O velho Marley estava morto…

TODOS OS NARRADORES: – … e Scrooge bem o sabia!

1º COMERCIANTE: – Scrooge fora seu único sócio,

2º COMERCIANTE: – seu único testamenteiro,

1º COMERCIANTE: – o único administrador de seus bens,

2º COMERCIANTE: – seu único herdeiro…

NARRADOR PRINCIPAL (sempre andando): – …e seu único amigo; embora tenha comemorado solenemente seu funeral realizando, no mesmo dia, ainda um bom negócio. Marley estava morto…

TODOS OS NARRADORES: – E bem morto!

NARRADOR PRINCIPAL: – E agora, na firma, Scrooge respondia pelos dois.

TODOS OS NARRADORES: – Scrooooooge! O avarento! O ganancioso pecador!

1ª LADRA: – Um mão-fechada.

2ª LADRA: – Mais duro e mais agudo que uma pedra de sílex, da qual nem uma lâmina de aço arranca faíscas generosas.

VELHO JOÃO: – Fechado e solitário como uma ostra.

TODOS OS NARRADORES (com ritmo):
– Havia um frio dentro dele
que gelava seus traços,
franzia seu rosto,
endurecia seus passos,
tornava cortante sua voz áspera.
(com um lento e soturno balanço na voz):
– Uma névoa gelada o envolvia,
e ele a levava aonde ia.

2º COMERCIANTE: – O gelo em seu escritório durava o ano inteiro e não se derretia nem mesmo no Natal!

MOÇA: – Ninguém o parava na rua…

RAPAZ: – Nenhum mendigo lhe pedia esmola…

EMPREGADINHA: – Nenhuma mulher lhe indicava o caminho…

MENINO QUE COMPRA O PERU: – Nenhuma criança lhe perguntava as horas…

TODOS OS NARRADORES: – Ninguém dizia: “Como vai, Scrooge?”

NARRADOR PRINCIPAL: – E ele lá se importava? Se o que mais queria era distância…

TODOS OS NARRADORES (com leve balanço na voz):
– Porém uma vez,
na véspera do Natal…
Scrooge e seu secretário
trabalhavam na sala gelada…

(Os narradores se imobilizam no proscênio. Ouve-se a música “Greensleeves”, apenas tocada, enquanto o centro da cena se ilumina. O secretário de Scrooge, sentado em sua banqueta e com o chapéu em cima da mesinha, esfrega as mãos geladas. Scrooge observa o secretário com os óculos na ponta do nariz. O secretário, intimidado, pára de aquecer as mãos, pega a pena, mergulha-a no tinteiro e começa a escrever vagarosamente num bloco. Scrooge, com o sobretudo desabotoado e o chapéu sobre a mesa, passa em revista o livro de contas. Terminada a música, os dois se imobilizam, enquanto os narradores dizem o trecho que se segue.)

TODOS OS NARRADORES (talvez com movimentos de euritmia):
– Lá fora, a névoa obscurecia tudo,
derramando-se nas frestas, nas fechaduras das portas,
confundindo até as casas, meras sombras fantasmagóricas,
como se a Natureza mexesse, sem parar,
um caldeirão de sopa fumegante.
Os candeeiros luziam nas janelas como leves manchas vermelhas.
Rua acima e rua abaixo passavam as pessoas,
ofegantes, batendo as mãos no peito,
sapateando nas pedras da calçada para se aquecerem.

(Terminado este trecho da narrativa de Dickens, os narradores se imobilizam e entra no escritório o alegre sobrinho de Scrooge.)

SOBRINHO (entrando): – Salve, tio! Feliz Natal!

SCROOGE (mal humorado): – Ora, que bobagem!

SOBRINHO: – Tio! O senhor não vai querer dizer que o Natal é uma bobagem!

SCROOGE: – Pois eu digo. Ora essa, feliz Natal… Que razão tem você para estar feliz, você que é tão pobre?

SOBRINHO: – E que razão tem o senhor para não estar feliz? O senhor é tão rico!

SCROOGE: – Ah! Bobagem!

SOBRINHO: – Não se zangue, tio.

SCROOGE: – Que posso fazer? Estou cercado de doidos! “Feliz Natal”… E para você o que é o Natal senão o tempo de saldar contas sem ter dinheiro; o tempo de estar um ano mais velho e nem uma hora mais rico; o tempo de dar balanço nos livros e verificar prejuízo. (diz isso batendo com a mão no livrão de contas aberto à sua frente) Para mim, quem anda por aí dizendo “Boas Festas!” devia ser assado junto com seu próprio bolo de Natal.

SOBRINHO (desanimado): – Tio!…

SCROOGE: – Sobrinho, festeje o Natal a seu modo, que eu o festejo do meu.

SOBRINHO: – Festejar? Mas o tio não festeja coisa alguma!…

SCROOGE: – Deixe-me em paz e faça bom proveito do seu Natal. Que ele lhe dê o lucro de sempre.

SOBRINHO: – Há muitas coisas boas, tio, que não são para dar lucro, e o Natal é uma delas. O Natal é tempo sagrado, de bondade, de perdão, de alegria. E embora ele nunca me tenha posto uma moeda de prata no bolso, acho que sempre saí lucrando. Deus abençoe o Natal!

SECRETÁRIO (entusiasmado): – Sim, Deus abençoe o Natal! (tapa a boca assustado, arregalando os olhos)

SCROOGE (zangado, esmurra a mesa, dirigindo-se ao secretário): – Mais uma palavra, e você festeja seu Natal perdendo o emprego! (dirige-se ao sobrinho): – E você, que belo orador me saiu. Não sei como ainda não entrou para o Parlamento!

SOBRINHO: – Ora, vamos, tio! Não se zangue! Venha jantar conosco amanhã.

SCROOGE: – Eu? Ir à sua casa? Nem pense nisso.

SOBRINHO: – Mas por que? Por que?

SCROOGE: – Por que você se casou, ahn?

SOBRINHO: – Porque eu me apaixonei.

SCROOGE: – Ora, se apaixonou. Boa-noite!

SOBRINHO: – Mas, tio, eu nunca lhe peço nada nem quero nada seu; por que não podemos ser amigos?

SCROOGE: – Boa-noite.

SOBRINHO: – Pois eu sinto muito, tio, sinto de coração que o senhor seja tão teimoso. Nós nunca fomos adversários, nunca tivemos uma questão, mas hoje fiz aqui uma defesa em homenagem ao Natal e, dentro do espírito do Natal, hei de conservar meu bom humor. Por isso, tio, feliz Natal!

SCROOGE: – Boa-noite!

SOBRINHO: – E feliz ano novo!

(Sai cumprimentando o secretário, que o acompanha até a porta.)

SECRETÁRIO (efusivamente): – Feliz Natal!

SCROOGE (consigo mesmo): – Hum… Meu secretário, com 15 xelins por semana, mulher e filhos para sustentar, e falando em feliz Natal… Deve estar louco!

(O secretário, ainda na porta, faz entrar dois solenes senhores caridosos que tiram o chapéu para Scrooge.)

1º SENHOR CARIDOSO: – É aqui a firma “Scrooge e Marley”, não? Tenho a honra de estar falando com o senhor Scrooge ou com o senhor Marley?

SCROOGE: – O senhor Marley faleceu há sete anos. Precisamente há sete anos nesta mesma noite.

2º SENHOR CARIDOSO (apresentando credenciais): – Mas acredito que sua generosidade será bem representada pelo seu sócio.

SCROOGE (devolve as credenciais e resmunga): – Hum…

1º SENHOR (pegando um lápis do bolso): – Nesta época festiva, senhor Scrooge, é mais do que desejável que façamos provisões para os pobres e miseráveis. Há milhares passando necessidade.

SCROOGE: – E não há albergues?

2º SENHOR: – Muitos albergues, senhor Scrooge.

SCROOGE: – E não estão abertos?

1º SENHOR: – Estão, sim, senhor Scrooge.

SCROOGE: – E a lei contra a mendicância? Não é aplicada?

2º SENHOR: – É, sim, senhor Scrooge. Está em pleno vigor.

SCROOGE: – Ainda bem, meus senhores, ainda bem.

1º SENHOR: – Mas nós, achando que as instituições mal contribuem para a alegria do Natal dessa pobre gente, tentamos angariar donativos em seu benefício, nesta época em que a necessidade é tão sentida e a abundância alegra tanto.

2º SENHOR: – Qual a quantia que posso anotar em seu nome?

SCROOGE: – Nenhuma.

1º SENHOR: – Quer permanecer no anonimato?

SCROOGE: – Quero que me deixem em paz. Não me alegro no Natal e não posso alegrar vadios. Já contribuo para as instituições existentes, e isso não me custa pouco. Os que são pobres que vão para lá!

1º SENHOR: – Muitos não podem.

2º SENHOR: – Outros prefeririam morrer.

SCROOGE: – Pois fariam muito bem diminuindo a população; mas afinal não tenho nada com isso. Já é bastante, para um homem, cuidar de seus negócios e não se meter na vida dos outros. Boa-noite, senhores!

(Os dois senhores curvam-se ligeiramente e vão saindo. Quando o secretário de Scrooge abre a porta e eles saem, aparece um menino.)

MENINO (canta na porta):
“O Natal já vem chegando: Fa-la-la-la-la-la-la-la-lá!”

SCROOGE (levanta-se e o ameaça com a régua): – Fora! Fora!

(O secretário fecha a porta, volta à sua mesinha e se prepara para sair, enrolando o cachecol no pescoço, pegando o chapéu e indo despedir-se de Scrooge.)

SCROOGE: – Você, com certeza, quer amanhã o dia inteiro de folga.

SECRETÁRIO (tímido, gira o chapéu nas mãos): – Oh, isso seria ótimo, senhor!

SCROOGE: – Não seria nada ótimo. Ter de lhe pagar por um dia em que não trabalha!

SECRETÁRIO: – Mas é só uma vez no ano…

SCROOGE: – Bela desculpa para se meter a mão no bolso alheio no dia 25 de dezembro de todos os anos. (abotoa o sobretudo) Está bem. Fique em casa amanhã, mas no dia seguinte esteja aqui bem cedo!

SECRETÁRIO: – Decerto! Decerto, senhor Scrooge! (pondo e tirando o chapéu duas vezes) Boa-noite! Boa-noite!

(O secretário sai, e em seguida sai Scrooge. Os narradores tornam a se espalhar pelo proscênio.)

NARRADOR PRINCIPAL (anda de um lado para o outro, girando a
bengala):
– Enquanto isso…
as sombras se adensavam tanto,
que algumas pessoas corriam pelas ruas empunhando lanternas,
guiando as carruagens pela névoa espessa.
A velha torre da igreja próxima, (alegremente)
cujo sino estava sempre espiando Scrooge por uma janela gótica,
tornou-se invisível
e dava as horas nas nuvens,
com vibrações trêmulas.
como se tiritasse de frio e batesse os dentes
lá no alto de sua cabeça enregelada.
Quanto a Scrooge…
jantou melancolicamente, na taverna melancólica de sempre.
E depois…

(Aparece Scrooge, que pára diante da imaginária porta de sua casa. À medida que os narradores contam o que se passa, ele mostra espanto diante do que vê e dá passos para trás cada vez que os narradores pronunciam o nome de Marley.)

TODOS OS NARRADORES (lentamente e com ritmo):
– … quando foi de volta à casa,
já na porta da entrada,
bem no trinco se mostrava
uma face muito pálida
que de perto o encarava.
Era Marley! Era Marley!
Era Marley que lá estava!

SCROOGE (procurando se acalmar): – Ora, isso é bobagem!

TODOS OS NARRADORES (várias vezes, como um eco): – Ora, isso é bobagem! Bobagem… bobagem… bobagem… bobagem…

(Scrooge olha em volta, assustado com o eco, e se põe a revistar a casa.)

TODOS OS NARRADORES (lentamente, seguindo os movimentos de Scrooge):
– Nada havia sob a mesa…
nem debaixo do sofá.
Nada havia sob a cama…
nem por dentro do roupão. (acelerando um pouco)
Mas, no fundo da lareira,
cada um dos azulejos
fez surgir a face pálida
que decerto o encarava!
Era Marley! Era Marley!
Era Marley que lá estava!

SCROOGE (procurando se acalmar): – Ora, isso é bobagem!

(Uma sineta começa a soar, e em seguida várias sinetas soam estridentemente. Param de repente, todas juntas. Os narradores somem. Ouvem-se passos pesados e um arrastar de correntes. Scrooge arregala os olhos e recua.)

SCROOGE: – Dizem que nas casas mal-assombradas os fantasmas arrastam correntes… Mas eu não acredito. É pura bobagem.

(Surge o fantasma de Marley, vestido como costumava, mas coberto de correntes e de molhos de chaves.)

SCROOGE (espantadíssimo): – É Marley! Será que é mesmo Marley?…

(Scrooge faz gesto de quem duvida e vira as costas. O fantasma dá mais um passo com barulho de correntes. Scrooge torna a virar de frente para ele e começa a observá-lo, admiradíssimo.)

SCROOGE: – Ele é transparente… É todo transparente… Bem que diziam que Marley era um homem sem entranhas… (lutando com os sentidos) Mas ainda assim não acredito. (resolvendo-se, fala com Marley): – Que é… que é que você quer de mim?

MARLEY (voz fantasmagórica): – Muuuito…

SCROOGE: – Quem é você?

MARLEY: – Pergunte queeem eu eeera…

SCROOGE: – Quem era você, então?

MARLEY: – Em vida fui seu sóóócio Maaarley.

SCROOGE: – Ora essa!

MARLEY: – Não acrediiita em miiim?

SCROOGE: – Não!

MARLEY: – Você duviiida dos seus sentiiidos?

SCROOGE: – É, é isso mesmo. Qualquer coisa afeta os sentidos. Um mal-estar do estômago, por exemplo. Você pode ser um pedaço de carne que eu não digeri bem, ou alguma batata mal cozida, ou algum molho com mostarda… É. Acho mesmo que existe mais molho em você do que molhos de chaves em sua corrente, seja lá você quem for (aparentando caçoar, mas com medo).

MARLEY (sacudindo as correntes): – Aaaahhhnnn!!!

SCROOGE (ajoelha-se de mãos postas): – Tenha pena de mim, terrível aparição! Por que veio me perturbar?

MARLEY: – Homem de alma terrena, acredita em mim ou não?

SCROOGE: – Sim, sim. Mas por que andam as almas pela terra e por que vêm a mim?

MARLEY: – É exigido de todo homem que ele se aproxime dos outros homens seus irmãos e ande no meio deles. Se não faz isso em vida, tem de fazê-lo depois da morte. É condenado a vagar pelo mundo – ó infeliz de mim – e ver aquilo que não partilhou, e que podia ter partilhado na terra, tornando-se feliz. Aaahhhnnn… (sacode as correntes)

SCROOGE (tremendo): – Por que você carrega essa corrente?

MARLEY: – Eu uso a corrente que forjei em vida. Eu mesmo a fiz, elo por elo, jarda por jarda. Seu modelo lhe parece estranho? Ou você sabe o peso e a medida da corrente que você mesmo carrega? Você tem trabalhado beeem nela. É uma corrente pesaaada!

(Scrooge olha em volta de si mesmo, procurando sua própria corrente.)

SCROOGE (aflito): – Oh, meu velho Marley, diga alguma coisa que me sirva de consolo!

MARLEY: – Scroooooge! O consolo vem de outras regiões, por outros mensageiros e para outros homens. Pouco tempo me resta, e não posso parar, nem descansar. Em vida, minha alma nunca ultrapassou os limites do nosso antro de negócios. E ainda tenho pela frente muitas jornadas.

SCROOGE: – Você deve ter andado bem devagar com isso, Marley.

MARLEY: – Beeem devagaaar…

SCROOGE: – Há sete anos e sempre vagando…

MARLEY: – Sempre vagando, preso, acorrentado, perseguido pelo remorso. Ai de mim! Ter ignorado que qualquer espírito cristão, agindo com bondade, acha até a vida curta para espalhar o bem! Por que, no Natal, por entre a multidão feliz, eu andava de olhos baixos, sem levantá-los em busca da abençoada estrela que levou os três reis magos até a manjedoura onde Jesus nasceu? Ouça-me. Meu tempo está terminando.

SCROOGE: – Fale, mas por favor não me aflija mais!

MARLEY: – Esta noite vim aqui avisá-lo de que ainda lhe resta uma esperança de escapar de um destino igual ao meu.

SCROOGE: – Ah, você sempre foi um bom amigo para mim, Marley.

MARLEY: – Três Espíritos virão visitá-lo, Scrooge.

SCROOGE (desapontado): – Oh… Essa é a esperança de que você me falava? Eu… eu preferia que não fosse.

MARLEY: – Sem eles você não pode escapar. Quando o relógio bater 1 hora, espere pelo primeiro.

SCROOGE: – Não podem vir todos de uma vez, para liquidar o assunto?

MARLEY: – Não. Adeus! Olhe bem para mim e lembre-se do que se passou entre nós.

(O fantasma de Marley se retira. Scrooge fica parado, espantado, mas em seguida se recupera. Tenta até duvidar mais uma vez, mas o medo o faz calar a boca.)

SCROOGE: – Ora, isso é bobag… (tampa a boca com a mão)

(Scrooge, já mais humilde, prepara-se para se deitar. Tira os sapatos, põe o roupão por cima da roupa, barrete ou gorro. Depois deita-se e dorme.)

 

Cena do Capítulo 2

"O Primeiro Espírito”

Scrooge; o Espírito do Natal Passado; Scrooge-menino e sua irmã; Dick e sua amiguinha; o velho patrão de Scrooge e sua mulher; o cozinheiro e a copeira.

Scrooge continua deitado na cama. No centro da cena, há uma mesa com cadeira, onde se senta, no primeiro momento do Natal Passado, Scrooge-menino com seus três livros; no segundo momento ela não precisa ser usada, mas permanece ali, pois diante dela se sentará depois o velho patrão de Scrooge.

(Ouve-se bater 1 hora. Pode ser o toque de um sino, de leve. Nesse momento, o primeiro Espírito já deve ter entrado. Ele tem uma veste branca – com capuz para trás – toda enfeitada de flores e com um cinto dourado; da cabeça sai uma luz, pode ser um tipo de lanterna; em sua mão traz um ramo de azevinho; cabelos brancos, se possível.)

SCROOGE (acorda com o som do sino e se levanta): – É você o Espírito cuja vinda me foi anunciada?

ESPÍRITO: – Eu sou!

SCROOGE: – Quem é você?

ESPÍRITO: – Eu sou o Espírito do Natal Passado.

SCROOGE: – Passado remoto?

ESPÍRITO: – Não. O seu Passado.

SCROOGE (observando-o): – Por que não põe o capuz na cabeça para tampar essa luz?

ESPÍRITO: – Como?! Você, com suas mãos mundanas, já quer tampar a luz que eu irradio? Já não basta ser você um daqueles cujas paixões teceram este capuz?

SCROOGE (desculpando-se): – Oh, eu não tinha essa intenção. Mas, diga-me, que negócios o trazem aqui?

ESPÍRITO: – O seu bem-estar. Venha comigo! Vamos dar uma volta.

SCROOGE (esfrega os braços, enregelado, e calça os chinelos): – A esta hora e com este frio? Lembre-se de que sou um simples mortal.

ESPÍRITO: – Basta que eu toque seu coração, e você estará protegido. (toca-o)

(Scrooge resmunga para si mesmo. Os dois saem da casa, descem e dão uma volta pela frente da cena, enquanto um trecho do tema “Greensleeves” é tocado. Primeiro, os dois contemplam a plateia, como se vissem uma cidadezinha.)

SCROOGE: – Oh, céus, foi ali que eu vivi quando era menino!

ESPÍRITO: – Seus lábios estão tremendo. E que é isso em seus olhos?

SCROOGE (enxuga uma lágrima, disfarçando): – Ora, é alguma gota d’água que respingou em mim.

ESPÍRITO: – Você se lembra do caminho?

SCROOGE: – Lembrar-me? Posso andar por aí de olhos fechados.

ESPÍRITO: – É estranho que tenha esquecido por tantos anos… Vamos!

(Os dois vão seguindo e sobem na beirada mais alta à esquerda, no fundo, de onde possam apreciar a cena; no centro do palco, há uma mesa com dois livros em cima e mais um que Scrooge-menino lê, sentado na banqueta. Enquanto sobem, Scrooge solta exclamações e enxuga lágrimas com um lenço.)

SCROOGE: – Olhe a velha ponte! A igreja! A minha escola!

(Passam Dick e sua amiguinha, com cadernos e sacola, rindo, cantarolando ou conversando. Imobilizam-se quando o Espírito diz o que se segue, depois movimentam-se, continuam a passar e saem.)

ESPÍRITO: – São apenas sombras do que já passou e não nos veem. Mas, olhe, a escola não está deserta. Ficou lá um menino sozinho.

SCROOGE (espantado): – Mas… sou eu! (comovido) Pobre menino que eu fui… (batendo palmas) Oh, os livros! Os livros! Meu querido Ali-Babá… Foi num Natal, há muito tempo, que ele apareceu para o menino solitário… (o menino pega o segundo livro) Olhe o lacaio do sultão, que os gênios viraram de pernas para o ar! Lá está ele! Bem feito! Bem feito por ter casado com a princesa! (o menino pega o terceiro livro) É Robinson Crusoé! Lá vai Sexta-feira fugindo para o riacho… (rindo e chorando) Pobre menino que eu fui… (lembra-se do cantor de porta que havia enxotado, ergue o rosto e põe a mão no bolso do roupão) Ah, aquele pobre menino que eu enxotei hoje… Eu queria… Mas agora é tarde…

ESPÍRITO: – Que foi?

SCROOGE: – Nada. Esta noite, um menino veio cantar à minha porta, e eu o enxotei. Gostaria de lhe ter dado alguma coisa. É isso.

ESPÍRITO (balança a cabeça): – Ah, sei… Mas olhe para lá. Já é outro Natal.

(Scrooge-menino anda de um lado para o outro. Surge a irmã correndo.)

IRMÃ: – Meu irmãozinho querido! Eu vim buscá-lo! Você vai para casa! Para casa, imagine! E para sempre!

SCROOGE-MENINO: – É verdade? Para sempre?

IRMÃ (afobada, segurando-o pelos ombros): – Papai está muito mais camarada agora, e eu criei coragem e pedi, e ele deixou você voltar e me mandou de carruagem buscar você.

(Scrooge-menino afasta-a, segura-a pelas mãos, admirando-a.)

SCROOGE-MENINO: – Como você cresceu, irmãzinha! Está uma moça!

IRMÃ: – Nós vamos passar o Natal juntos! Vamos, vamos!

(Ela o vai puxando, e saem juntos.)

ESPÍRITO: – Uma frágil criaturinha de coração de ouro.

SCROOGE: – Sim, um coração de ouro…

ESPÍRITO: – Quando morreu já tinha filhos, não?

SCROOGE: – Um filho.

ESPÍRITO: – Claro! Seu sobrinho.

SCROOGE: – É. É isso mesmo. (abaixa a cabeça, arrependido.)

(Um senhor vai entrando e senta-se à mesa, escrevendo. Imobiliza-se.)

ESPÍRITO: – Olhe, você conhece aquela loja?

SCROOGE: – Conhecer? Mas foi lá que eu comecei a trabalhar! (apontando) É o meu velho patrão em carne e osso!

(O velho patrão larga a pena, ou põe o lápis atrás da orelha, espia as horas no relógio de bolso, esfrega as mãos, levanta-se.)

PATRÃO: – Ei, vocês aí! Scrooge! Dick!

(Aparecem os dois meninos, apressados, prontos para ouvir alguma ordem. Em seguida, as sombras se imobilizam, porque o velho Scrooge vai falar.)

SCROOGE: – É Dick, mesmo! É ele! Era tão meu amigo… Meu querido Dick…

(As sombras voltam a se movimentar.)

PATRÃO: – Chega de trabalho por hoje, rapazes. (abrindo os braços) É véspera de Natal, Dick! (batendo no ombro de Scrooge-menino) Natal, Scrooge! Vamos abrir espaço aqui num piscar de olhos. (movimento dos dois meninos de afastar mesa e cadeiras) Isso. Desimpeçam a sala. Rápido, Dick! Vamos, Scrooge!

(Entram a mulher do patrão com o bolo, a copeira e o cozinheiro com pratos, etc., a irmãzinha de Scrooge e a amiga de Dick. Cada um come um pedaço do bolo, enquanto a música começa a tocar. Depois, os quatro pares dançam. O velho Scrooge, lá no alto, marca o ritmo com um pé e batendo palmas. Quando a dança termina, todos se despedem com votos de Feliz Natal e saem; os dois aprendizes, Scrooge-menino e Dick, ainda trocam duas palavras antes de sair.)

SCROOGE-MENINO: – Como o patrão é bom, festejando o Natal junto conosco…

DICK: – Bom como não existe igual!

(Os dois saem. O velho Scrooge e o Espírito descem devagar, conversando.)

ESPÍRITO: – Custa bem pouco encher esta gente de gratidão…

SCROOGE: – Bem pouco…

ESPÍRITO: – O velho patrão deve ter gasto apenas umas três ou quatro libras de seu dinheiro mortal.

SCROOGE (falando como o Scrooge que ele um dia foi): – Oh, não! Não é bem assim, Espírito. O velho patrão tem o poder de nos fazer felizes ou infelizes, e de tornar nosso trabalho leve ou pesado, agradável ou penoso. Esse poder está numa palavra, num olhar que ele nos dê; em coisas tão insignificantes, que é impossível enumerá-las. A felicidade que ele nos dá vale uma fortuna. É… (triste)

ESPÍRITO (encarando-o): – Que foi?

SCROOGE: – Nada, não. Nada de mais. É que eu gostaria de dizer uma ou duas palavras ao meu secretário, agora. É só isso.

ESPÍRITO (balançando a cabeça): – Ah, sei…

SCROOGE: – Oh, Espírito, não aguento ver mais nada. Leve-me embora, eu lhe peço! Por que você gosta de me atormentar?

ESPÍRITO: – Eu lhe disse que estas são as sombras daquilo que já se passou. Não me responsabilize por elas!

(Os dois passam pela frente e acabam subindo para a casa de Scrooge.)

SCROOGE: – Leve-me para casa! Leve-me para casa! Não quero ver mais nada!

(Scrooge cobre o rosto com as mãos. Quando descobre o rosto, o Espírito sumira.)

SCROOGE: – Que estranho… Estou em meu próprio quarto! (Scrooge,

exausto, arrasta-se até a cama e se deita para dormir.)

 

Cena do Capítulo 3

"O Segundo Espírito”

Scrooge; o Espírito do Natal Presente; o menino que cantou na porta e o menino que compra o peru; o secretário de Scrooge, sua mulher e seus filhos Marta, Pedro e Timmy; o sobrinho de Scrooge e sua mulher; a cunhada e o namorado.

O cenário é o mesmo, só que diante da mesa há mais cadeiras, onde se sentarão as duas famílias: primeiro, a do secretário de Scrooge, depois, a do sobrinho.

(Ouve-se novamente o toque único da 1 hora, enquanto entra o Espírito do Natal Presente. Ele usa um manto verde, com arminho (algodão) em volta da beirada; pés descalços, coroa de azevinho na cabeça; numa das mãos uma bandeja com frutos de Natal, na outra um facho de luz (que pode também ser um ramo de planta molhada. Scrooge acorda, senta-se na cama, esfrega os olhos, já não tão rabugento e intratável. Olha timidamente para o Espírito, que deposita a bandeja de frutos em algum lugar e eleva seu facho ou ramo.)

ESPÍRITO (vibrante): – Scrooge!

(Scrooge levanta-se e admira o Espírito.)

ESPÍRITO: – Chegue mais perto! E olhe para mim, homem! Eu sou o Espírito do Natal Presente. Você nunca viu nada igual, não é mesmo?

SCROOGE: – Nunca!

ESPÍRITO: – Você nunca andou com meus irmãos mais velhos, quer dizer, os que nasceram nestes últimos anos?

SCROOGE: – Acho que não. Você tem muitos irmãos?

ESPÍRITO: – Sim. Mais de 1.800.

SCROOGE: – Uma família enorme para sustentar! (submisso) Espírito, leve-me aonde quiser. Ontem andei porque fui obrigado e aprendi uma boa lição. Se você tem o que me ensinar esta noite, deixe-me colher os benefícios.

ESPÍRITO: – Toque em meu manto!

(Como da outra vez, os dois seguem e dão uma volta na frente da cena. Um sino toca alegremente. O menino que cantou na porta e o menino que, mais tarde, compra o peru passam carregando pratos ou bandejas de frutas e doces, que o Espírito asperge com seu facho ou com respingos do ramo.)

SCROOGE: – Isso que você está aspergindo sobre os doces tem algum sabor?

ESPÍRITO: – Sim, tem o meu sabor. O sabor do Natal.

SCROOGE: – Isso acontece com qualquer ceia de Natal?

ESPÍRITO: – Com qualquer refeição oferecida com amor. E, quanto mais pobre a ceia, mais sabor recebe.

SCROOGE: – Por que?

ESPÍRITO: – Porque precisa mais.

(Os dois vão subindo para a beirada alta da esquerda; e a cena se abre com a família do secretário. A mulher arruma a mesa, e o filho Pedro ajuda. Imobilizam-se quando Scrooge fala.)

SCROOGE: – Olhe! É nessa casa que mora meu secretário!

(As sombras se movimentam de novo.)

MULHER (para Pedro): – Pedro, por que será que seu pai e Timmy estão demorando tanto? E Marta, que também não aparece?

MARTA (entrando): – Aqui estou eu, Mamãe!

PEDRO: – Marta, Marta! Hoje temos pato assado!

MULHER: – Ainda bem que você chegou, querida, mas por que tão tarde?

MARTA: – Tive de ajudar a entregar umas costuras. Ontem não deu tempo. Eram muitas.

(Vão chegando o secretário e Timmy com suas muletas.)

PEDRO: – Papai está chegando! Está chegando com Timmy! Há um pato assado no forno e até um pudim! Venham ver!

(Pedro sai, puxando Marta pela saia, e Timmy segue os dois.)

MULHER (para o marido): – Timmy se comportou bem na igreja?

SECRETÁRIO: – É um menino de ouro. Às vezes fica pensativo e tem as ideias mais estranhas. Na volta me disse que foi bom ele ter sido visto na igreja; porque, sendo aleijado de uma perna, todos se lembrariam daquele que fez os paralíticos andarem e os cegos verem. (enxuga uma lágrima) Timmy Vamos ficar bom. Vai, sim.

(Marta torna a entrar trazendo o pato e o pudim, e Pedro traz a jarra com limonada. Timmy segue-os cantarolando ou recitando com ritmo.)

TIMMY (batendo palmas):

"Hoje temos pato assado

e um pudim de sobremesa.

Que beleza! Que beleza!”

MULHER (interrompe-o impondo silêncio): – Chiiiu…

(Todos em volta da mesa ficam em atitude de oração e se imobilizam.)

SCROOGE: – Que beleza… Que beleza…

(As sombras voltam a se movimentar. O secretário trinca o pato.)

TIMMY: – Viva! Viva!

SECRETÁRIO (de copo na mão): – Um feliz Natal para todos nós, meus queridos! Que Deus abençoe a todos.

TODOS: – Feliz Natal!

TIMMY: – Que Deus abençoe a todos nós!

SECRETÁRIO: – À saúde do senhor Scrooge, a quem devemos esta festa!

(As sombras se imobilizam de novo. Scrooge, que poderia estar sentado, levanta-se e presta atenção. As sombras se movimentam.)

MULHER: – É preciso mesmo ser dia de Natal para se beber à saúde de um homem tão mesquinho, tão duro e sem sentimentos, como o senhor Scrooge.

SECRETÁRIO: – Meu bem! As crianças… É dia de Natal…

MULHER: – Ninguém melhor que você sabe o que ele é, meu pobre querido!

SECRETÁRIO: – Mas, meu bem, é Natal…

MULHER: – Eu bebo à saúde dele só por sua causa e por causa do Natal. Que Deus lhe dê longa vida, um alegre Natal e um feliz Ano Novo!

TIMMY: – Que Deus abençoe a todos nós!

(O secretário abraça-se com Timmy, comovido. Imobilizam-se todos. O centro da cena escurece.)

SCROOGE: – Espírito, diga-me se Timmy viverá bastante.

ESPÍRITO: – Vejo um lugar vazio e umas muletas cuidadosamente guardadas. Se o futuro no mudar estas sombras, o menino morrerá.

SCROOGE: – Oh, não! Não, meu bom Espírito! Diga que ele será poupado!

ESPÍRITO: – Se o futuro no mudar estas sombras, nenhum de meus irmãos o encontrará aqui. E que importância tem? Se ele morrer, não faz muito bem em diminuir a população?

SCROOGE: – Oh!… (abaixa a cabeça, apertando-a nas mãos)

(Enquanto Scrooge e o Espírito dão outra volta pelo proscênio e tornam a subir à esquerda, sai a família do secretário, e o centro da cena clareia já com a família do sobrinho em volta da mesa. No centro da mesa, como enfeite, há um colar de flores. Scrooge aponta com uma das mãos, puxando o Espírito com a outra. A família está imóvel, para Scrooge falar.)

SCROOGE: – Veja! É a família do meu sobrinho!

(O sobrinho, a mulher, a cunhada e seu namorado se movimentam. O sobrinho, de pé, ri com as mãos nas cadeiras ou na cintura.)

SOBRINHO: – Imaginem só se é possível uma coisa dessas!

MULHER: – Ah, eu não acredito!

CUNHADA: – Eu também não.

NAMORADO: – Nem eu.

SOBRINHO: – Mas é verdade. Ele disse! Afirmou que o Natal é uma bobagem e acreditava no que dizia!

MULHER: – É uma vergonha para ele, meu bem.

SOBRINHO: – Meu tio é um homem esquisito e bem que poderia ser mais simpático. Mas, quanto a mim, nada tenho contra ele. Com suas ofensas, só ofende a si próprio.

MULHER: – Ele deve ser muito rico. Pelo menos é o que você sempre disse.

SOBRINHO: – E de que adianta? Sua riqueza não lhe serve de nada. Ele não faz o bem com ela, nem torna sua própria vida mais confortável. E nem mesmo tem o prazer de pensar – ha, ha, ha! – que pode ajudar a nós com ela.

MULHER: – Eu não tenho paciência com ele.

CUNHADA: – Nem eu!

NAMORADO: – Nem eu!

SOBRINHO: – Pois eu tenho. Tenho pena dele. Nem que eu quisesse, não ia conseguir me zangar. Quem sofre com suas manias? Ele mesmo. Cismou que não deve gostar de nós e, por isso, não vem jantar. E qual a consequência? Perdeu um jantar!

MULHER: – Acho que ele perdeu um jantar muito bom.

CUNHADA: – Tem razão.

NAMORADO: – É mesmo!

SOBRINHO: – E perdeu companhias melhores que seus pensamentos, seu quarto empoeirado e seu velho escritório. Ele goste ou não goste, hei de convidá-lo todos os anos, dizendo: “Como vai, tio Scrooge?” E até acho que ontem ele ficou meio impressionado.

MULHER (sorri, sem acreditar): – Tio Scrooge impressionado? Não é possível!

SOBRINHO: – Pois ficou. Se ficou! (pausa entre pensativo e divertido)

CUNHADA: – Que tal brincar de cabra-cega?

NAMORADO: – Ótima ideia!

MULHER: – Eu tiro a sorte! (apontando para cada um) Unidunitê, salameminguê, um sorvete colorê, unidunitê! (cai a sorte no namorado

da cunhada)

NAMORADO: – Eeeuuu?

SOBRINHO: – É, sim senhor. Eu lhe amarro o lenço. (tampa-lhe os

olhos)

MULHER (entregando ao sorteado o colar de flores): – Tem de pendurar este colar de flores naquele que você encontrar!

(O sorteado se atrapalha, deixa cair no chão o colar, apalpa o chão até achá-lo de novo, enquanto os outros riem. O sobrinho, a mulher e a cunhada se escondem enquanto o cabra-cega conta até dez. Depois, ele se põe a vagar, tropeçando, mas ouve o risinho da cunhada e acaba por encontrá-la.)

NAMORADO: – Achei! (arranca o lenço dos olhos e põe o colar na

namorada; depois se ajoelha e lhe dá um

anelzinho de surpresa, de noivado.)

SOBRINHO: – Olhem só! Parabéns aos noivinhos!

MULHER: – Parabéns!! (todos se abraçam e tornam a se sentar à mesa)

SOBRINHO: – Agora proponho jogarmos “Sim e Não”!

CUNHADA (de mãos dadas com o namorado): – É aquele jogo de perguntas?

NAMORADO: – Uma espécie de charada?

MULHER: – É, é.

(As sombras se imobilizam um instante, para Scrooge e o Espírito falarem.)

ESPÍRITO: – Vamos! Meu tempo está terminando.

SCROOGE: – Ah, só mais um pouquinho…

(As sombras se movem de novo.)

SOBRINHO: – Então! Vão perguntando! Quero ver quem acerta!

MULHER: – Mineral?

SOBRINHO: – Não!

MULHER: – Vegetal?

SOBRINHO: – Não!

MULHER: – Animal?

SOBRINHO: Sim, animal!

CUNHADA: – Animal doméstico?

SOBRINHO: – Não!

CUNHADA: – Selvagem?

SOBRINHO (fazendo cara feroz): – Siiimmm!

NAMORADO: – Rosna? (o sobrinho faz um gesto de “mais ou menos”) Grunhe? (mesmo gesto) Fala? (mesmo gesto)

SOBRINHO: – É… Às vezes rosna, às vezes grunhe e às vezes fala.

MULHER: – Vive no mato?

SOBRINHO: – Não!

MULHER: – Vive em Londres?

SOBRINHO: – Sim.

CUNHADA: – É urso?

SOBRINHO (rindo): – Não.

CUNHADA: – É lobo?

SOBRINHO (rindo mais ainda): – Não!

NAMORADO: – É tigre?

SOBRINHO: – Nããão!!!

NAMORADO: – É touro?

SOBRINHO (rindo e gesticulando): – Não! Nada disso!

MULHER: – Já sei, já sei!

CUNHADA: – E o que é?

NAMORADO: – O que é?

MULHER: – É o tio Scrooge!!

SOBRINHO (cumprimenta-a, brincalhão, num largo sorriso): – Acertou! É isso mesmo!

CUNHADA: – É ele?

NAMORADO: – Só podia ser!

(Batem palmas, e as mulheres dão risinhos e repetem “Só podia ser”. As sombras se imobilizam. Scrooge ri muito, com as mãos nos joelhos, debruçado para a cena. Depois, sorri em silêncio. As sombras se movem de novo.)

SOBRINHO (com uma taça na mão): – Bem, um brinde ao tio Scrooge! Que Deus lhe dê um bom Natal e um feliz Ano Novo!

TODOS (com taças na mão): – Sim, ao tio Scrooge!

(Imobilizam-se. Scrooge fala baixinho, dirigindo-se às sombras.)

SCROOGE: – Obrigado! Obri…

ESPÍRITO (interrompendo-o): – Vamos! Está chegando a minha hora.

(O Espírito e Scrooge descem, dão a volta no proscênio, enquanto o centro da cena escurece e a família do sobrinho sai. Nisto, aparecem agarrando o manto do Espírito duas criaturas esfarrapadas: a Ignorância e a Miséria.)

SCROOGE: – Espírito, essas duas são suas filhas?

ESPÍRITO: – Não! São filhas do homem. São a Ignorância e a Miséria, que me pedem socorro. (as duas podem fazer alguns gestos trágicos, de

euritmia)

SCROOGE: – E elas não têm quem as ajude?

ESPÍRITO: – Talvez algum albergue tão miserável quanto elas…

SCROOGE: – E ninguém lhes dá esmolas?

ESPÍRITO: – Não! Existe a lei contra a mendicância, não está lembrado?

SCROOGE (cobrindo o rosto com as mãos): – Oh… (O Espírito some.)

SCROOGE (olha em volta): – Meu quarto, novamente?

 

Cena do Capítulo 4

"O Último Espírito”

Scrooge; o Espírito do Natal Futuro; os dois comerciantes; o velho João e as duas ladras; a moça e o rapaz; o secretário de Scrooge, a mulher, Marta e Pedro.

O centro da cena é agora uma rua ou praça. A mesa com cadeiras só aparece de novo no momento em que é usada pela família do secretário de Scrooge.

(Scrooge nem chega a se deitar. Bate novamente 1 hora, e entra o Espírito do Natal Futuro, de aspecto impressionante, todo coberto com um manto negro, cujo grande capuz esconde bem a cabeça, e só aparecem as mãos.)

SCROOGE: – Estou na presença do Espírito do Natal Futuro?

(O Espírito só estende o braço e aponta para diante, para o caminho a seguir.)

SCROOGE: – Vai mostrar-me as sombras do que ainda não aconteceu, mas vai acontecer nos dias que estão para vir. É isso?

(O Espírito faz que sim inclinando a cabeça duas vezes.)

SCROOGE (levantando-se): – Espírito do Futuro! Tenho mais medo de você que dos outros, mas sei que sua intenção é me fazer o bem; e como espero ser outro homem de agora em diante, estou pronto a segui-lo e agradeço-lhe de coração. Não vai responder?

(O Espírito só aponta para diante.)

SCROOGE: – Vamos, então! Vamos! O tempo está passando, e cada minuto é precioso para mim. Vamos!

(Scrooge toca no manto do Espírito e vai como que levado. Dão uma volta pelo proscênio. O Espírito aponta para os dois comerciantes que estão conversando, e Scrooge aproxima-se para ouvir, já que não é visto por eles.)

1º COMERCIANTE: – Não, eu não sei muita coisa a esse respeito. Só sei que ele morreu.

2º COMERCIANTE: – Morreu quando?

1º COMERCIANTE: – Na noite passada.

2º COMERCIANTE: – Mas morreu de quê? Por quê?

1º COMERCIANTE: – Só Deus sabe…

2º COMERCIANTE: – E eu que achava que ele não ia morrer nunca… Que destino será que ele deu ao seu dinheiro?

1º COMERCIANTE: – Não me disseram, mas talvez tenha deixado para a firma. Só sei que para mim é que não deixou.

(Risos dos dois.)

1º COMERCIANTE: – Acho que seu enterro vai ser bem pobre, pois não sei de ninguém que vá acompanhá-lo.

2º COMERCIANTE: – Que tal se organizássemos um grupo e fôssemos?

1º COMERCIANTE: – Se providenciarem um almoço, sou capaz de ir, mas só com essa condição.

(Os comerciantes vão rindo enquanto saem. Scrooge segura o queixo, pensativo. O Espírito aponta de novo. Num canto vê-se o velho João, esfarrapado, de cachimbo na boca e um saco de estopa vazio na mão. Vão-se chegando a ele, vindo uma de cada lado oposto, as duas ladras, uma muito espantada com a outra. Trazem trouxas cheias.)

VELHO JOÃO (gozador): – Vocês não podiam ter arranjado lugar melhor para se encontrarem! (ri, depois tranquiliza-as) Vamos, vamos. Aqui todos se conhecem!

1ª LADRA (assustada, para a outra): – Você… você também?

2ª LADRA: – Que é que há? Que é que há? Cada um tem o direito de cuidar de si. Él sempre cuidou.

1ª LADRA: – Tem razão… Él mais que ninguém.

2ª LADRA: – E então? Pra que ficar aí me olhando com os olhos esbugalhados? Ninguém vai saber que carregamos estas coisas. E nós não vamos pensar mal uma da outra, não é mesmo?

1ª LADRA: – Oh, não, não!

2ª LADRA: – Então, pronto. Que me conste, o morto não sofre com a perda destas coisas.

1ª LADRA (rindo): – Lá isso é. E, se o velho avarento tivesse tido alguém para cuidar dele, não teria morrido tão cedo, nem teria morrido sozinho.

2ª LADRA: – Nunca ouvi verdade maior. Ele recebeu o que merecia. (para o velho): – Abra minha trouxa, João!

VELHO JOÃO (vai trocando por moedas o que encontra na trouxa): – Hum… Lençóis… toalhas… duas colheres de prata…

1ª LADRA: – Agora, a minha!

VELHO JOÃO (puxando alguma coisa que demora a sair inteira de dentro da trouxa e demonstrando espanto): – Que é isto? Cortinado de cama?

1ª LADRA: – Isso mesmo. Cortinado de cama.

VELHO JOÃO (sem acreditar): – Não vá me dizer que tirou este cortinado, com argolas e tudo, com o morto lá deitado!

1ª LADRA: – E por que não?

VELHO JOÃO (aponta-a com o cachimbo e ri, balançando a cabeça): – Essa aí nasceu para fazer fortuna, não se pode negar…

2ª LADRA: – Ele metia medo na gente quando era vivo, mas nos deu lucro depois de morto.

(Os três vão-se embora rindo, cada um com sua trouxa.)

SCROOGE: – Ah, Espírito… Sei que o caso desse infeliz bem podia ser o meu. Minha vida segue o mesmo curso. Mas eu lhe imploro… se houve alguém a quem a morte desse homem causou alguma emoção, deixe-me saber!

(O Espírito aponta outra vez. Um rapaz e uma moça vêm um de cada lado e se encontram no centro da cena.)

MOÇA: – Boas notícias? Não estamos arruinados?

RAPAZ: – Ainda resta uma esperança. Fui lá pedir-lhe que nos desse mais uma semana de prazo.

MOÇA: – Ah, se ele se compadece… Se acontece um milagre desses…

RAPAZ: – Ele não pode se compadecer. Ele morreu.

MOÇA: – Morreu?! E para quem nossa dívida será transferida?

RAPAZ: – Não sei, mas até lá teremos o dinheiro. Podemos dormir tranquilos.

MOÇA: – Ah, ainda bem! Que alívio… Deus me perdoe, mas que alívio!… (Os dois saem juntos.)

SCROOGE: – Espírito, eu lhe imploro, mostre-me um sentimento de ternura ligado à morte de alguém!

(Podem os dois, então, subir para o lugar elevado à esquerda, enquanto a cena muda, mostrando a família do secretário ao redor da mesa. Todos cabisbaixos, quietos, descaídos. Nada da animação anterior. O oposto. A mulher e Marta cosem. Pedro lê.)

MARTA: – Que foi, Mãe?

MULHER: – A luz do candeeiro me arde na vista. E eu não quero que seu pai me veja de olhos vermelhos quando chegar. Já deve estar na hora.

PEDRO: – Já passa da hora. Ultimamente ele anda tão devagar…

MULHER: – E ele andava bem depressa quando trazia… quando trazia o pequeno Timmy nos ombros.

(Entra o secretário, cabisbaixo, mas carinhoso. Afaga cada um, depois pega as muletas que estão apoiadas num canto.

MARTA: – Papai, por favor, não fique triste assim.

SECRETÁRIO: – Era uma criança tão paciente… tão meiga… Se nos lembrarmos sempre disso, nunca brigaremos uns com os outros.

MARTA: – Nunca, Papai.

PEDRO: – Nunca…

(O centro da cena escurece, e a família do secretário sai. Scrooge enxuga os olhos e vai falando com o Espírito enquanto os dois descem, dando uma volta.)

SCROOGE: – Espírito, diga-me, essas eram as sombras daquilo que Vamos acontecer, ou daquilo que pode acontecer?

SCROOGE (continua a falar como que consigo mesmo): – O curso de uma vida leva forçosamente a um determinado fim, mas se muda de rumo, o fim deve ser outro. Oh, Espírito, diga que é assim!

(O Espírito nada responde.)

SCROOGE: – Sinto dentro de mim que seu tempo está terminando. Por favor, mostre-me que homem era aquele cuja morte não foi nem um pouco sentida!

(O Espírito volta-se para Scrooge, estende o braço e aponta para ele.)

SCROOGE: – Não! Não! Oh, não! Espírito, ouça-me! Não sou mais o mesmo homem, graças ao que aprendi nas últimas horas. Oh, bom Espírito, diga-me se ainda posso mudar essas sombras, mudando minha própria vida!

(O Espírito faz que sim com a cabeça duas vezes.)

SCROOGE: – Honrarei o Natal em meu coração durante o ano todo. Vou viver no Passado, no Presente e no Futuro, sem nunca esquecer as lições que os Espíritos me ensinaram.

(O Espírito some, enquanto Scrooge se descobre novamente em seu quarto.)

 

Cena do Capítulo 5

"O Fim da História”

Scrooge; o menino que compra o peru de Natal; os dois senhores caridosos; a empregadinha do sobrinho de Scrooge; o sobrinho, a mulher, a cunhada e seu namorado; o secretário de Scrooge, sua mulher, Marta, Pedro e Timmy, os cantores de rua (com o menino que cantou sozinho na porta de Scrooge). Mais tarde, todas as outras personagens.

Mesmo cenário da rua ou praça, com a casa de Scrooge à direita.

(Scrooge anda de um lado para o outro, entre agitado e comovido.)

SCROOGE: – Esta é a minha casa! Este é o meu quarto! E o cortinado da cama! Ele não foi arrancado! Está aqui! As sombras do que iria acontecer podem ser desmanchadas! Hão de ser desmanchadas! Eu sei. Os Espíritos me ajudarão, e eu viverei no Passado, no Presente e no Futuro. (põe-se de joelhos) – Oh, Marley, que o céu seja louvado por tudo isto e o Natal também! Eu o digo de joelhos, meu velho Marley, de joelhos! (rindo e se movimentando) Nem sei o que fazer. Estou leve como uma pluma, feliz como um anjo, alegre como um garoto, tonto como um bêbado. Feliz Natal! Feliz Natal para todo mundo! Ha-ha-ha! Nem sei que dia do mês é hoje. Não sei quanto tempo estive com os Espíritos… Não sei de nada. Estou tal qual um bebê. Não faz mal. Seria até bom se eu fosse um bebê. Ei! Viva! Viva!

(Ouve-se o alegre soar de sinos de Natal. Scrooge espia para fora de sua casa, como se olhasse por alguma janela, e chama um menino que atravessa a cena.)

SCROOGE: – Que lindo dia! Que dia claro! Ei, menino, que dia é hoje?

MENINO que compra o peru (espantado): – Que dia é hoje? Mas é dia de Natal!

SCROOGE (mais alegre ainda): – É dia de Natal! Não perdi nada. Os Espíritos fizeram tudo numa só noite! Eles podem fazer qualquer coisa. Claro que podem. Ei, menino!

MENINO que compra o peru (já ia saindo, pára e se volta): – O senhor me chamou?

SCROOGE: – Chamei, sim. Você conhece aquela casa que vende aves, na outra esquina?

MENINO que compra o peru: – Conheço.

SCROOGE: – Mas que menino esperto! Você sabe se já venderam o peru grande, que estava pendurado lá?

MENINO que compra o peru: – Aquele que é tão grande quanto eu?

SCROOGE: – Que graça de garoto! Esse mesmo. O maior de todos. É até maior que o pequeno Timmy.

MENINO que compra o peru: – Estava lá agora há pouco.

SCROOGE (fala enquanto entrega moedas ao menino): – Vá até lá, por favor, e compre-o para mim, que eu lhe darei 5 xelins.

(O menino já vai saindo, quando Scrooge completa o pedido.)

SCROOGE: – E leve-o à casa do meu secretário. Você o conhece?

MENINO que compra o peru (grita enquanto sai): – Conheço sim!

SCROOGE (grita depois que ele sai): – E diga a ele… (fala consigo mesmo, já que o menino não ouve) – Diga a ele que vou aumentar seu salário. Amanhã mesmo começarei a dar assistência à sua família. É preciso cuidar da saúde de Timmy!

(Scrooge se apressa, tira o barrete ou gorro, o roupão e os chinelos, calça os sapatos e sai para a rua, onde se encontra com os dois senhores caridosos.)

SCROOGE: – Oh, como vão? Espero que tenham tido sucesso ontem. Feliz Natal!

1º SENHOR CARIDOSO (espantado): – É o senhor Scrooge?

SCROOGE: – Sim, e receio que esse nome não lhes seja muito agradável. Peço que me perdoem. Poderiam os senhores ter a bondade de… (fala ao ouvido do 2º senhor caridoso)

2º SENHOR CARIDOSO (espantadíssimo): – Benza-o Deus! O senhor está falando sério, senhor Scrooge?

SCROOGE: – Sim, nada menos que isso. Podem fazer-me este favor?

2º SENHOR CARIDOSO: – Meu caro senhor! Nem sei o que dizer diante de tanta generosidade…

SCROOGE: – Não digam nada, por favor. Venham então ver-me depois, sim?

1º SENHOR CARIDOSO: – Pois não! Com toda a certeza!

(Os dois senhores saem pelo outro lado. Scrooge segue seu caminho e para na porta da casa do sobrinho, onde encontra a empregadinha.)

SCROOGE: – Por favor, boa menina, meu sobrinho, o seu patrão, está em casa?

EMPREGADINHA: – Está, sim. Está lá na sala de jantar com a patroa. Quer que o acompanhe?

SCROOGE: – Não é preciso, ele me conhece. (entra): – Ó de casa! Ó de casa!

SOBRINHO (aparecendo): – Céus! Quem será?

SCROOGE: – Sou eu! Seu tio Scrooge! Vim para jantar.

(Aparece a família do sobrinho – a mulher, a cunhada e o namorado – como que vindo todos de dentro da casa. Todos trocam exclamações de “Feliz Natal”, apertos de mão, abraços. Da plateia vêm chegando os cantores de rua, e se ouve a introdução da canção “Que Deus nos deixe alegres”.)

SCROOGE (alegre): – São os cantores! Vamos ouvi-los!

(A mulher e a cunhada do sobrinho distribuem pãezinhos aos cantores enquanto termina a introdução. Vão surgindo as outras personagens da peça. Scrooge cumprimenta efusivamente seu secretário e canta abraçado com Timmy.)

TODOS (cantando):

"Que Deus nos deixe alegres e a todos também!

Lembremos Cristo Salvador, nascido em Belém.

No meio da mais densa treva, clareou a luz.

Oh, que consolo e paz,

consolo e paz nos trouxe Jesus!

Um anjo abençoado, mandado por Deus,

chamou pelos pastores, disse que Jesus nasceu.

No meio da mais densa treva, clareou a luz.

Oh, que consolo e paz,

consolo e paz que nos trouxe Jesus!”

 

FINAL

Se quiserem cantar “Greensleeves” (“What Child is this?”) fiz a seguinte letra:

"Quem é, quem é a Criancinha nos braços de Maria?

Há uma estrela aquecendo no céu a noite fria.

É, é o Cristo Rei, que anjos guardam cantando!

Os pastorinhos o Menino estão contemplando.

A Criancinha dorme sob a estrela com seu brilho.

Os anjos cantam que foi Deus que mandou do céu seu filho.

É, é o Cristo Rei, que vemos com alegria!

É, é Jesus que já descansa juntinho a Maria!”

 

Sobre a escolha da peça

Para escolher uma peça com objetivo pedagógico, estude bem que tipo de vivência seria mais importante para fortalecer o amadurecimento de seus alunos. Será um drama ou uma comédia, por exemplo. No caso de um musical, é importante que a classe seja musical, que a maioria dos alunos toquem instrumentos e/ou cantem. Analise também o número de personagens da peça para ver se é adequado ao número de alunos.

Enviamos o texto completo em PDF de uma peça gratuitamente, para escolas Waldorf e escolas públicas, assim como as respectivas partituras musicais, se houver. Acima disso, cobramos uma colaboração de R$ 50,00 por peça. Para outras instituições condições a combinar.

A escola deve solicitar pelo email [email protected], informando o nome da instituição, endereço completo, dados para contato e nome do responsável pelo trabalho.

 

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